5 inovações para transformar nossas eleições municipais

Questtonó
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5 min readAug 23, 2016

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Em meio a uma lama de corrupção mais profunda que o volume morto que bebemos diariamente, existem algumas iniciativas muito recentes que indicam, no mínimo, a existência de alternativas. Agora cabe a nós engrossar este caldo, agir imediatamente e ter esperanças de um futuro melhor. Afinal de contas, quem responde a lama com apatia é, no mínimo, mais um tijolo dessa argamassa.

Para facilitar a pesquisa de quem está realmente interessado em mudanças, elenco aqui resumidamente algumas dessas inovações:

1. Fim do financiamento empresarial de campanha

Em meio ao congresso mais conservador das últimas décadas, talvez esta tenha sido a mais surpreendente lei aprovada — é até difícil saber o que levou nossos digníssimos a tomarem tal decisão. Pode ter sido o fato de que a coisa estava feia demais para esconder, pode ter sido a percepção de que as eleições estavam tão caras que se tornaram insustentáveis, ou quem sabe… consciência? Vai saber… O que importa mesmo é que agora a gente tem que ficar de olho, pois já existem certos ensaios lá na câmara de deputados tentando mudar tal lei.

A grande expectativa é que ela reduza significativamente o famoso rabo preso, que é provavelmente o principal mecanismo de corrupção do Brasil (vide a delação do Marcelo Odebrecht). Além disso, a redução significativa dos investimentos em campanhas pode tornar nossas eleições um pouco mais justas, dando mais chances para partidos menores e políticos mais pobres. Nos resta agora ficar de olho para denunciar possíveis estratégias que surgirão para tentar manter a estrutura corrompida.

2. Voto Legal: Software livre para doações eleitorais

Quando fui chamado para participar de um reunião de cocriação desta maravilhosa iniciativa de financiamento coletivo de campanhas fiquei impressionado. Trata-se de uma plataforma onde os candidatos poderão apresentar suas ideias e receber doações de pessoas físicas. O que torna tudo isso ainda mais fantástico é o fato de que, para se inscrever no site, o candidato precisa cumprir diversos requisitos associados à sua honestidade, como ter a Ficha Limpa, por exemplo. Além disso, as transações financeiras serão feitas sem intermediários ou taxas de serviço, utilizando bases de dados descentralizadas em uma rede Blockchain aberta (se você não sabe o que é Blockchain, vale a pena a pesquisa, porque essa tecnologia pode acabar com a necessidade de intermediários financeiros nesses tipos de transação de valores). Por fim, é ainda uma ótima plataforma para acompanhar os passos do seu candidato.

Esta iniciativa contribui para a transparência do processo eleitoral e ainda empodera o eleitor, que deixa de ser um votante passivo para interferir diretamente no processo eleitoral. Agora resta saber se o cidadão brasileiro está disposto a ajudar a candidatura dos políticos nos quais eles confiam. Você está? Eu estou! E não apenas no meu candidato, pois isso aqui não é olimpíadas — tem muita gente boa sem costas quentes que precisa de ajuda para poder então nos ajudar.

3. Bancada ativista

Um grupo de ativistas com grande representatividade em causas sociais, econômicas, políticas e ambientais, resolveu juntar esforços para lançar suas candidaturas a vereador de São Paulo. Esta união tem como princípio aumentar a força de suas campanhas, e assim tentar colocar o máximo de ativistas possíveis na Câmara dos Vereadores. Imagina quão significativo seria a presença de vários ativistas na câmara? Ter um número significativo de votantes que podem ser capazes de defender suas causas e tornar real o desejo de avançar de forma significativa?

Na bancada ativista existem representantes de movimentos diversos, como o Marcio Black, do movimento negro, Sâmia Bomfim, do movimento feminista e Todd Tomorrow, do movimento LGBT. Além da grata surpresa de podermos ver ativistas tomarem coragem de entrar na política tradicional para mexer no vespeiro, o que torna esta iniciativa ainda mais interessante é seu caráter suprapartidário. Como já falei antes, política não é olimpíadas. Partidos diferentes podem e devem dialogar pautas comuns e até se incentivar mutuamente, não num contexto de conchavo, mas de militância a favor do que precisa ser feito.

4. Candidatura cívica independente

Entre as coisas lamacentas e desgastadas do nosso cenário político atual, talvez a que mais gere desconfiança no cidadão são os partidos. São tantos escândalos e comportamentos descabidos realizados pelos maiores deles, que o conceito de “partido” em si está completamente desgastada. No entanto, descredibilizar a ideia de partido como um todo é um preconceito tremendo. Quando as propostas são sérias eles podem contribuir profundamente, dando força para a política de certas causas. Ao contrário de lutar para sua extinção, é relevante levantarmos a discussão sobre sua obrigatoriedade. Sabemos que um político precisa estar em sintonia com as ideias de seu partido e muitas vezes alinhar seus votos a ele. Esse ato gera um incômodo grande no momento em que o político que você elegeu, e que deveria te representar, não está votando de acordo com a sua vontade e sim de acordo com as “ordens” do seu partido.

Dentro desta questão problemática, a REDE criou uma alternativa em seu estatuto para candidaturas cívicas independentes. Trata-se de uma possibilidade da candidatura sem a necessidade do cumprimento de pautas de um partido, caso o candidato seja eleito. Embora a ideia de um candidato independente que precisa se filiar a um partido ainda ser bastante contraditória, esse movimento é uma iniciativa interessante que está trazendo à tona uma discussão capaz de enfraquecer e até quebrar o monopólio dos partidos dentro da política.

5. Política Hacker

“Modificar um software de um programa para que ele possa atender as minhas necessidade é algo extremamente empoderador. Então eu descobri que a política é a ferramenta que a gente tem para transformar nossa realidade. Se você aprende a escrever neste código você pode modificá-lo.” Esta frase é do Pedro Markum, um candidato a vereador de São Paulo que se auto intitula hacker da política e que trabalha com isso há mais de 10 anos. Pedro, hacker que é, está usando todas as inovações acima descritas em sua candidatura.

A política hacker não é propriamente uma inovação desta eleição municipal mas é nela que os primeiros ativistas deste tipo de prática resolveram se candidatar. O grande propulsor dessa ação política no Brasil talvez seja a rede de ativistas chamada Transparência Hacker, que trabalha de forma totalmente horizontal e colaborativa na busca de todos os tipos de dados relacionados à prática política no país. Ao trabalhar estes dados, eles procuram torná-los acessíveis à toda população, assim como também buscam extrair informações importantes sobre como a prática da política se dá no país e de que maneira é possível transformá-la. Entre outros feitos inimagináveis desta rede, está a criação de um Labhacker DENTRO da Câmara dos Deputados. Tem que ser muito hacker para fazer este congresso retrógrado aceitar a existência deste laboratório dentro da câmara, mas…

Os Hackers da política são, sobretudo, jovens apaixonados por decifrar esta malha complexa que é o funcionamento da política no país para, através deste conhecimento, conseguir transformar seus códigos. Considero de extrema importância eleger candidatos com este perfil para trabalhar a transparência destes ambientes, assim como para lutar por mudanças nos regimentos internos, e quem sabe conseguir “desengessar” nossa política.

Só com esse resumo já podemos ver que existem várias movimentações interessantes com o intuito de transformar nosso sistema eleitoral e político. Resta saber se nossa sociedade, traumatizada e desinformada, estará disposta a olhar a política fora das lentes televisivas e ir mais a fundo nas discussões. De fato, a política brasileira não é para amadores. Espero que você que chegou até aqui se sinta encorajado a arregaçar as mangas.

Barão Di Sarno
Creative Director

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