O dia em que transei com Darwin

Sexo vende. Falso moralismo também.

Maya Falks
QG Feminista
4 min readMay 4, 2018

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Sim, vamos falar de sexo. Mas mais do que isso, vamos falar da maneira como a sociedade trata o sexo e do quanto é impossível compreender a relação das pessoas com ele. Não estou falando de psicanálise nem de sociologia — até porque estão longe de ser minha especialidade — estamos falando de comunicação.

Na minha casa, sexo nunca foi tabu. Minha mãe sempre conversou abertamente sobre o assunto comigo e com a minha irmã e isso foi bastante positivo na nossa adolescência, já que a curiosidade existe e o sexo está por tudo, ou seja, não tem absolutamente nenhuma maneira de manter adolescentes longe do sexo — não me refiro necessariamente ao ato, mas aos estímulos sociais.

Bom, muitas de minhas colegas não tinham a mesma sorte; os pais nunca tocavam no assunto com suas filhas por um medo quase patológico que elas… fizessem sexo. Isso fez com que essas meninas procurassem a minha mãe pra conversar. Até aí tá ótimo, afinal, a fonte de informação dessas meninas era uma mulher adulta, madura e extremamente responsável. Problema é que, com a internet e o acesso livre, a molecada que não tem uma relação tão aberta com seus pais não vai buscar informação na ciência ou com adultos responsáveis — muitos deles saciam sua curiosidade na pornografia.

“Mas Maya, deixa os moleques baterem a sua em paz”. Helloooo, não é de masturbação infanto-juvenil que estou falando, é de educação sexual. “Ah, não pode falar de gênero na escola porque vai sexualizar a criança”, ok, ensinar a criança sobre o próprio corpo e o corpo do outro sob forma de construção de conhecimento não pode porque sexualiza, mas você alguma vez esperou as crianças saírem do recinto antes de falar da vizinha gostosa ou fazer piada com a bunda da cunhada?

Ao mesmo tempo que o cidadão de bem, preocupado com a proteção da infância e da família, protesta na câmara dos vereadores da sua cidade contra o espantalho da “ideologia de gênero”, ele cola um adesivo de uma mulher — que no caso era a autoridade máxima do país na época — de pernas abertas em seu tanque de gasolina para simular uma penetração cada vez que abastecesse o carro, logo ao lado da mesma porta que seu inocente pré-adolescente que não pode ouvir a palavra “gênero” na escola abre para entrar no veículo.

Tanto quanto o sexo, o falso moralismo vende muito. Quantas vezes vemos cenas de violência promovidas por pessoas que defendem a moral e os bons costumes? Mais do que isso, quantas dessas pessoas que defendem a moralidade tem moral para tanto?

Vamos pegar a história recente do país — durante o processo de impeachment da presidenta Dilma, a grande maioria dos votantes usou a família como justificativa para seu voto. Entre eles o cidadão que dedicou o voto à esposa enquanto secretamente (ou nem tanto) fazia o mesmo à amante via whats, o cidadão que votou pela família mas foi flagrado em pleno plenário assistindo um filme pornográfico e o cidadão que votou pela moral e, casado, foi flagrado assediando uma jovem muito mais nova também via whats.

Hoje o que não faltam são políticos com três ou quatro casamentos no currículo, piadas sexuais em público, comportamentos adolescentes, comentários baixos sobre mulheres para todo mundo ouvir ganhando eleitorado como um suposto defensor da família e da moral. Pessoas que protestam contra galerias de arte enquanto vibram com cafetão chupando seio de mulher nua em público, que lutam para amordaçar professores e ao mesmo tempo defendem a redução da idade do consentimento para poder fazer sexo com garotinhas recém púberes sem serem acusados de estupro.

Não é a moralidade que vende, é a falsa. A moralidade impediria o cidadão de bem de apoiar um ex-ator pornô ou rir das piadas sexuais dos amigos. A moralidade impediria o cidadão de bem de compartilhar fotos não autorizadas de mulheres nuas com seus grupos de whats. A moralidade impediria o cidadão de bem de ter amantes e/ou achar normal que seus amigos as tenham, e impediria a grande maioria desses comportamentos ditos tipicamente masculinos. A falsa moralidade, por sua vez, dá todo um leque de liberdades — somos contra toda essa pouca-vergonha que tem por aí, mas assediar a empregada tudo bem. Somos contra educação sexual na escola, mas dizer ao filho de 7 anos que ele ainda vai “comer” todas não tem mal algum.

O conceito de evolução de Darwin esbarrou na capacidade do ser humano de regredir cada vez mais. Talvez nunca voltemos à nossa forma física primitiva, mas cerebral sem dúvida encontramos exemplares com certa facilidade por aí. Talvez se Darwin pudesse nos dizer algo hoje, seria: por favor, não procriem.

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Maya Falks
QG Feminista

Escritora, publicitária, jornalista e caçadora de nuvens.