“Pânico moral”? Não. Nós estamos resistindo a pornificação de mulheres

Não confunda feministas lutando contra a mídia corporativa com as tentativas da direita de policiar sexo.

Anna Beatriz Saraiva
QG Feminista
4 min readJan 28, 2018

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Escrito por: Gail Dines e Julia Long
Texto original:

“Sexualização” se tornou um problema muito debatido nos últimos anos, e uma característica notável é a suposição de que as feministas que se opõe a objetificação sexual estão gerando um “pânico moral”. Desde que o sociólogo Stanley Cohen introduziu o termo em 1972 ele tem sido usado como uma maneira abreviada de criticar conservadores por inventarem outro “problema” para demonizar um grupo que desafia os padrões da moral tradicional.

Então aparentemente feministas agora são conservadoras promovendo um pânico desnecessário sobre proliferação de imagens sexualizadas enquanto o controle corporativo da indústria midiática que produz essas imagens em massa são progressistas buscando por mudanças que estão sendo demonizados injustamente.

Que estranha mudança de acontecimentos.

Sugerir que feministas que se opões a pornificação da sociedade estão instigando um pânico moral é confundir um movimento politicamente progressista com as tentativas da direita de policiar o comportamento sexual.

Nós podemos, é claro, identificar uma vertente bastante conservadoras no atuais debates da Grã-Bretanha: intervenções do governo de coalizão incluem que garotas recebam lições de como praticar abstinência e ataques aos direitos ao aborto. Mas as feministas que se organizam contra a pornificação não estão discutindo essas imagens sexualizadas de mulheres pela decadência moral; mas sim por essas imagens perpetuam o mito da incondicional disponibilidade sexual das mulheres e o status de objeto, e que portanto, minam os direitos de autonomia sexual das mulheres, segurança física e igualdade social e econômica. O dano causado às mulheres não é um dano moral, é um dano político, e qualquer analise deve ser fundamentada em uma crítica ao controle corporativo do nosso imaginário visual.

A esquerda tem uma longa história de luta contra a posse capitalista da mídia. De Karl Marx à Antonio Gramsci à Noam Chomsky, pensadores de esquerda compreenderam a mídia corporativa como uma máquina de propaganda das ideias e valores capitalistas. Ao popularizar a ideologia das elite, o controle corporativo da mídia molda nossas identidades como trabalhadores e consumidores, vendendo imagens de sucesso e felicidade ligadas ao consumo de produtos que gera uma enorme riqueza para a classe da elite. Outras ideologias são, na melhor das hipóteses, marginalizadas e, na pior das hipóteses, ridiculizadas.

Ninguém no meio progressista sugeriria por um momento que a crítica à mídia corporativa é um pânico moral. Chomsky nunca, até onde sabemos, foi chamado de “empreendedor moral”, porém aquelas de nós que se organizam contra as corporações que despejam imagens sexistas somos frequentemente acusadas de estarmos instigando um pânico moral.

A indústria que constrói a imagem de feminilidade se tornou dominante na sociedade ocidental, excluindo modos alternativos de ser mulher. As roupas, os cosméticos, as dietas, academia, idas ao cabeleireiro, depilação, manicure, demandam bastante dinheiro. Mesmo nesses tempos de crise econômica, em que mulheres estão vivendo a mais severa dificuldade financeira, a indústria da beleza de está bombando.

A aversão de mulheres a si mesmas é um grande negócio, e auxilia o sistema capitalista global que, ironicamente, depende fortemente da exploração do trabalho das mulheres nos países em desenvolvimento. Como se não bastasse, muitas destas mulheres mal pagas estão gastando uma quantidade considerável de seus salários em clareadores de pele, produtos que prometem um deslocamento social fora das fábricas.

No ocidente, cirurgias estéticas estão cada vez mais comuns. Ano passado, no Reino Unido, quase 9,500 mulheres fizeram cirurgia de aumento dos seios, e o numero de cirurgias de labioplastia quase triplicou nos últimos cinco anos. Um cirurgião plástico explicou oportunamente no seu website que labioplastia “pode esculpir o lábio vaginal interno alongado ou desigual de acordo com as especificações de cada um… Com a labioplastia feita a laser, podemos realizar os desejos da mulher”.

Se isto não é uma evidencia de que vivemos em uma cultura sexualizada, o que é isto?

O custo emocional da conformidade com a hipersexualização é enorme para meninas e mulheres jovens que estão em processo de formação de suas personalidades e identidades sexuais. Nós construímos nossas identidades através de processos complexos na interação com a cultura que nos cerca, mas atualmente as imagens de hipersessualixação são dominantes. Qual a saída para uma garota se ela decidir que ser como Beyoncé, Miley Cyrus, Lady Gaga, Rihanna ou Britney Spears não é pra ela?

Um estudo sobre sexualização de garotas da Associação Americana de Psicologia concluiu que “há efeitos negativos em vários domínios, incluindo funções cognitivas, saúde física e mental, sexualidade, e atitudes e crenças”. Alguns desses efeitos incluem comportamento sexual de risco, maior propensão a transtornos alimentares, depressão, autoestima baixa e queda no desempenho acadêmico. Claro, existem garotas que irão resistir, mas haverão reais punições sociais a serem pagas por aquelas que não se conformaram a aceitar a aparência feminina.

A luta contra uma imagem cada vez mais estreita e limitante de feminilidade é inseparavelmente conectada à luta progressista por um domínio e controle democrático da mídia. Isto é uma luta política. Feministas estão extremamente preocupadas, mas nós não estamos entrando em pânico. Nós estamos nos organizando.

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