Um pouco do que vi no 1º dia do Product Camp 2018

Raquel Prado
QuintoAndar Design
Published in
9 min readDec 13, 2018

Nos dias 5 e 6 de dezembro, aconteceu em São Paulo mais uma edição do Product Camp, o maior evento sobre Product Management na América Latina. Estive lá no primeiro dia, acompanhando, principalmente, a trilha de user experience.

Letícia Pires falando sobre a equipe de product design do QuintoAndar em um ano de super crescimento. (Foto: Organização)

No palco de UX, o dia começou totalmente girl power com palestras e uma mesa redonda com três mulheres que já conhecia e são referências para mim: Letícia Pires, design manager aqui no QuintoAndar; Fernanda Tarrasco, que também já trabalhou por aqui e hoje, está brilhando no Cubo e Adelle Araújo que tem minha enorme admiração pelo trabalho que realiza pelo {reprograma}.

Escalando gestão e autonomia em design

A Lets — é o apelido carinhoso da Letícia Pires aqui na equipe — começou dividindo sua experiência sobre como propor uma gestão descentralizada, apostando em autonomia e ownership. Mesmo em um cenário de hypergrowth da empresa.

Em 2018, o QuintoAndar cresceu 15% ao mês no volume de negócios, em média, e cerca de 7.5x em quantidade de colaboradores. No time de design, passamos de 5 para 15 (e contratando!). Para a maioria de nós, designers, ainda são raras as experiências profissionais onde tivemos tantos pares designers. Esta novidade não é só no QuintoAndar. Parece ser o momento de muitas empresas também.

Nesse último ano, foram recorrentes os temas derivados da necessidade de escalar design, como design operations, design systems, estruturação de times, discussões sobre especialistas vs. generalistas e liderança em design.

E como a equipe de design de produto do QuintoAndar tem lidado com isso?

Mais do que falar sobre ownership, é necessário promover espaços para que designers possam exercer liderança diariamente, assim como qualquer outra skill”, acredita a Lets.

Na prática, eu que estou aqui no time, vejo que atuamos em muitas dimensões de design. Temos entregas de produto e entregamos muito valor nos squads multidisciplinares, cuidamos de nosso processo, exercitamos liderança e temos iniciativas para Cultura de Design no QuintoAndar nos nossos grupos de estudos entre os designers. Mas isso é assunto para um outro artigo que em breve aparece por aqui #spoileralert

"Esse papo de falar que designer não está pronto para gestão é passado; já está acontecendo."

Quando foi a última vez que você saiu pra rua para observar o comportamento humano?

Vocês se lembram desse vídeo da BBC que mostra uma pesquisadora de design saindo às ruas com sua roupinha de exploradora observando pessoas com seus binóculos e caderno à mão, tão curiosa pelo comportamento humano que eles parecem ser quase de outra espécie?

O vídeo é meio cômico, mas a palestra da Adelle me fez pensar que ele não deveria ser tão distante assim da nossa realidade. Quando foi a última vez que eu saí pra fazer uma pesquisa totalmente exploratória na rua? Quantas vezes eu poderia ter feito isso, mas… preferi fazer uma desk research ou disparar um questionário online do conforto do escritório?

Anotações do caderninho da Adelle em um dia de observações na CPTM.

A Adelle falou mais sobre como observar pessoas transformou o jeito com que ela e sua sócia, Michelli, fazem pesquisa na TUDUX, sua consultoria de experiência do usuário. Elas sentiam falta de saber mais sobre as pessoas antes de começar um projeto, de explicar o porque uma determinada pesquisa era importante como poderiam se aprofundar ainda mais em um roteiro. E como elas resolveram isso? Indo pra lugares com alto fluxo de pessoas, observando comportamentos e fazendo anotações em um caderninho. Ela contou sobre as experiências que teve observando pessoas em viagens de trem da CPTM, por exemplo. Os aplicativos que essas pessoas usam, as sacolas com marcas que carregam, os assuntos que conversam, livros, músicas que ouvem, tudo foi insumo e repertório para entender mais sobre seu público e tomar decisões mais assertivas a partir dali.

“Observar as pessoas transformou o nosso modo de fazer pesquisa.”

Criando uma experiência física “wow”

“Melhorar a experiência do usuário”, “pensar em usabilidade e acessibilidade”, “criar uma experiência wow” são coisas que já estamos acostumados a ouvir quando o recorte é um produto digital. Mas e quando o escopo pede uma experiência física? Não só isso, a experiência física em um prédio?

Esse desafio um tanto quanto inusitado para maioria de nós foi o desafio da Fê Tarrasco no novo prédio do Cubo, espaço do Itaú criado para conectar e fomentar o empreendedorismo.

Ela contou como foi ter como “artboard” um telão gigante de 13m de largura, instalado na recepção do Cubo, e sobre a estratégia da criação de conteúdo para ele. O telão, além de recepcionar quem entra no Cubo, também consegue ser visto por quem está na rua, já que as paredes do hall são de vidro: ou seja, além de pensar em um conteúdo que fosse relevante para quem está dentro, também existia a oportunidade de instigar quem estava do lado de fora.

Alguns dos pontos levantados pela Fernanda Tarrasco ao criar a estratégia de conteúdo para o telão que existe na recepção do novo prédio do Cubo.

Os conteúdos criados para o telão foram divididos entre abstratos, figurativos e conceituais — esse último sendo meu favorito. Foram filmadas cenas com atores que, quando exibidas no telão, parecem “pessoas gigantes” interagindo com os visitantes que acabam de se cadastrar na recepção, dando tchauzinhos, piscadinhas e sorrisos. O nome informado na recepção também é exibido no telão com uma recepção de boas vindas — e parece que as pessoas tem reagido de inúmeras maneiras ao telão!

Para conseguir “prototipar” as cenas com os atores, durante as filmagens foi utilizada uma máscara de papel para poder delimitar o espaço do telão.
Os visitantes são “recepcionados” pelo telão assim que passam pela hall de entrada.

Logo após que o telão foi inaugurado, a Fernanda fez uma pesquisa com alguns visitantes sobre a percepção do telão e logo já surgiram alguns questionamentos:

  • Como fazer com que o conteúdo não se torne monótono rapidamente?
  • Como entregar mais valor com o conteúdo do telão além da surpresa inicial?
  • Qual o próximo step em nível de customização? Mensagens mais personalizadas conforme o perfil do visitante, utilizar dados prévios caso ele seja um visitante recorrente…?
  • Como estender a experiência do prédio para além da recepção (utilizando também as TVs dos andares, por exemplo)?

Se você já passou por alguma experiência físico-digital que foi super encantadora, conta pra Fernanda! Ela quer continuar melhorando a experiência física do Cubo e você pode entrar em contato pelo e-mail fernanda@cubo.network :)

Seremos a primeira grande leva de CEOs mulheres?

A mesa redonda no final da manhã reacendeu as discussões sobre mulheres na tecnologia. Embora a mesma quantidade de meninas e meninos terminem o ensino médio e ainda mais mulheres tenham ensino superior completo do que homens, nós ainda somos minoria nas áreas de ciência, tecnologia, engenharia e matemática (ou STEM, em inglês, como o termo é mais conhecido). No Brasil, apenas 13% dos alunos de ciência da computação são mulheres, das quais 47% acaba desistindo (INEP/MEC).

Michelli Sasaki, Fernanda Tarrasco, Letícia Pires e Adelle Araújo na mesa redonda sobre mulheres na tecnologia.

É nesse cenário que o {reprograma} se coloca como uma iniciativa de impacto social que foca em ensinar programação para mulheres cis e trans que não têm recursos e/ou oportunidade para aprender a programar. Mais do a parte técnica, a Adelle contou como sobre o curso também busca empoderar e preparar psicologicamente as meninas para o ambiente “provavelmente “hostil” que irão encontrar quando de fato forem para um mercado de trabalho, até então, majoritariamente masculino.

Entretanto, a perspectiva é otimista: nunca antes a comunidade feminina esteve tão unida e focada em reverter essa situação, pelo menos na área de tecnologia. Será que já fazemos parte da primeira grande leva de mulheres que se tornarão CEOs?

Para se aprofundar no tema, a pesquisa Elephant in the Valley expõe problemas enfrentados por mulheres que trabalham com tecnologia na região do Vale do Silício, e também o clássico TED Sheryl Sandberg sobre termos tão poucas líderes mulheres que faz um belo resumo do seu livro Faça Acontecer. Outra recomendação é a comunidade Mulheres de Produto que está super ativa no Slack e no Medium!

Casa de ferreiro, espeto de pau?

O Gustavo Mendes, do Nubank, falou primeiramente sobre as diferenças de investimento em em processos, ferramentas e pessoas em diferentes estágios de vida de uma empresa (startup, emerging e enterprise).

Em fase de startup é comum que o investimento maior seja feito em pessoas e menos em ferramentas e processos (vários processos internos ainda são gerenciados em planilhas, por exemplo). Da mesma maneira, quando uma empresa é muito grande acaba investindo mais em processos e ferramentas, tornando as coisas mais burocráticas e cansativas. E tudo isso, claro, vai gerando “efeitos colaterais”; geralmente quem sofre com essas decisões e acaba sendo despriorizados são os produtos internos.

Gráfico que mostra a relação de investimento em pessoas, ferramentas e processos conforme o nível de maturidade de uma empresa.

Quando um usuário recorre ao suporte muito provavelmente é porque ele já teve uma experiência ruim no produto ou passou por momentos de dúvida. E é por isso que esse momento é tão importante: é como se fosse uma última chance de transformar aquela experiência em algo bom, em um final feliz, em problema resolvido. É nessa hora que o produto interno brilha: ele viabiliza o melhor atendimento possível por parte dos analistas.

“Investir em produtos internos é focar nas pessoa que você contratou também. É deixar a vida e o trabalho delas incrivelmente simples, para que elas foquem no que elas sabem fazer de melhor: relacionamento, atendimento, empatia e priorização.”

Para saber mais sobre isso, confira o post do Thiago Moesch sobre os bastidores do novo sistema de customer support do Nubank.

Trazendo mais valor ao momento de onboarding

Sabe aqueles apps que, logo no primeiro acesso, te levam para um tour guiado explicando mil coisas e funcionalidades diferentes, tudo ao mesmo tempo? O Bruno Canato falou sobre esses momentos, os onboardings, e como eles são decisivos na experiência do usuário (além de serem também a primeira oportunidade de mostrar o real valor do seu produto/serviço). Assim como interfaces, onboardings que tentam passar muita informação ao mesmo tempo acabam passando nenhuma, já que “a riqueza de informação também cria pobreza de atenção”.

“Valor é uma percepção tênue que você pode estragar se for com muita força”.

Relação entre a quantidade de informação e nível de atenção, parte da palestra do Bruno Canato.

Além disso, um a cada quatro aplicativos baixados são abandonados depois do primeiro uso, reforçando o quão importante é prover uma boa primeira experiência e dar aos usuários uma razão para continuar usando o seu produto.

Para isso, ele deu três dicas:

#1 Foco no objeto: as pessoas chegam até o seu produto querendo resolver algo (oi Jobs to be Done). Elas já estavam fazendo algo antes de chegar ali e pretendem resolver aquilo o mais rápido possível, então não entre no caminho com um onboarding extenso ou um vídeo de tutorial.

#2 Revelação gradual, ou progressive disclosure: procure diluir a quantidade de informação exibindo só o que é necessário e quando for necessário, contextualmente. No caso de onboardings ou tutoriais, por exemplo, eles podem ser divididos por features e não exibidos todos de uma vez no primeiro acesso. Proporcione ambientes onde o seu usuário consiga aprender sozinho, mas aos poucos, aprendendo a usar o sistema antes de se expor à funcionalidades mais complexas.

#3 Prova de eficácia: mostre o quanto antes que determinado esforço teve resultados. Para tangibilizar isso ele contou sobre a experiência que teve com uma fonoaudióloga: ao comparar visualmente resultados antes e depois de alguns exercícios vocais, o valor dos exercícios e da própria profissional ficaram explícitos logo na primeira consulta — o que foi fator decisivo em sua decisão de continuar o tratamento.

Para finalizar, ele disponibilizou um canvas de onboarding que pode ser bem útil na hora de planejar a experiência do nosso próximo onboarding.

O Product Camp é, principalmente, um evento de product management (e que além de UX também tinha uma trilha focada em growth!), ou seja: foi uma ótima oportunidade para aprender mais sobre áreas que não são da minha formação original. Entretanto, não resisti ao temas e acabei mais uma vez focando minha atenção nas palestras de design — e lembrei do Anderson Gomes no último UX Team Summit falando sobre parar de viver na “bolha” dos eventos de design e começar a explorar outros temas. Fica aí o auto puxão de orelha e a nota mental para meus próximos eventos :)

Você também foi no evento? Quais palestras assistiu e como fez para dividir a atenção entre os dois palcos? Conta pra mim nos comentários :)

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Raquel Prado
QuintoAndar Design

Product Design Lead @ QuintoAndar. São Paulo, Brazil.