por que é que eu sonho?

gabriela feitosa
quitandadapretablog
2 min readJul 22, 2020

às vezes me imagino numa cachoeira com Oxum, repetindo o que balbucio antes de dormir: eu não sei pra onde é que devo ir. confio em ti. não quero machucar nem ser machucada.

antes de entrar na água e me banhar nas lágrimas de minha mãe, também é bom sentir a areia porosa e fria nesse lugar de minha imaginação. é tudo tão calmo, sereno, silencioso. a água flui em seu próprio movimento majestoso. também sou tudo isso: a água que banha, a areia que às vezes fere, as pedras que ali estão apenas aproveitando esse sopro de vida que é ser apenas sendo.

esse processo de não ser e de repente começar a se tornar algo. esse bastão que não é leve: a própria vida.

brinco de boiar nesse rio que criei na mente igual meu pai fazia quando era criança — como ele contou outro dia. a preocupação matinal de apenas atravessar as águas até chegar do outro lado. e igual sempre faço quando entro na água. sei que não estou boiando, mas sim deitada nos braços de minha mãe. e assim existo.

por que é que eu sonho? perguntei à mim mesma tempos atrás. porque eu quero existir no futuro. quero estar comigo mesma num lugar muito bonito e ainda assim quero ter dúvidas, porque existe essa tentativa eterna de responder os meus questionamentos e os questionamentos do mundo. a tentativa eterna da busca pela cura, pelo que eu era, pelo que eu me tornarei. o que é que resta pra ser ainda? é uma condição às vezes cansativa. então nesses dias apenas sobra o descanso. ou descaso.

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gabriela feitosa
quitandadapretablog

Mulher negra comunicadora. Jornalista formada pela Universidade Federal do Ceará (UFC) com passagem pelo Jornal O POVO, Yahoo Brasil e mais.