O fundamental em educação é a abertura

Rafael Caputo
Rafael Caputo-Portfólio
6 min readOct 29, 2015

(Este artigo foi publicado como parte de um experimento com a intenção de produzir um e-portfólio educacional utilizando o Medium. Confira o resultado final da experiência.)

O contato com esta disciplina me proporcionou muitas reflexões interessantes sobre o que é fundamental na educação.

Estimulado por tomar conhecimento da existência da Open University na inglaterra, comecei a me aproximar mais da ideia de que o fundamental em educação, à distância e em geral, é a abertura. Foi assim que, mesmo antes de redigir uma resenha sobre a Open University, comecei a desenvolver esta ideia nos comentários do fórum sobre a educação da era do conhecimento ser necessariamente mais aberta, flexível, complexa e fragmentada. Eis como as ideias se desdobraram a partir da conceituação de educação à distância:

Quanto à conceituação de educação à distância, sou obrigado a concordar com o que a totalidade dos colegas postaram neste fórum, dizendo que é uma modalidade de ensino mediada por tecnologias que permitam o distanciamento geográfico e assíncronia entre alunos e professores. Poderíamos dizer de uma maneira uma pouco mais radical que o ensino presencial seria, portanto, o equivalente exatamente oposto a este conceito de educação a distância. Entretanto, o que tem aparecido como tendência é que a educação presencial tem adotado recursos da educação à distância, o que aproxima os dois conceitos (sem no entanto igualá-los) no chamado aprendizado híbrido.

Vale ressaltar aqui que pode-se entender que há todo um espectro gradual que vai de um extremo ao outro, do completamente presencial ao completamente a distância. Nesse caso, concordo com as afirmações do professor Moran no último semestre de que fica muito complicado fixar estes conceitos pela norma tomando como critério a proporção de presencialidade e distanciamento (que atualmente, se não me engano, entende o presencial como tendo no máximo 20% de componentes à distância). Uma normatização desta diferenciação conceitual através da proporcionalidade poderia atrapalhar na prática uma enorme variedade de possibilidades de aplicação metodológica de mixagem do distanciamento com o presencial, complicando assim as possibilidades de inovação por parte das instituições educacionais. A solução talvez fosse abolir de vez esta diferenciação, já que em uma sociedade do conhecimento as fornteiras entre estas modalidades de educação ficam cada vez menos nítidas.

A este propósito faço o exercício de imaginar uma metodologia híbrida voltada para a autonomia, cuja aplicação seria bem interessante. Tendo em mente que os conteúdos em geral já estão todos expostos livremente na internet das mais variadas formas possíveis e com qualidade, que sentido poderia haver em uma escola ostentar para o mercado que aplica determinado método, se em geral estes métodos prontos que tem por aí não passam de uma seriação de apostilas que apresentam o conteúdo de tal ou tal maneira? Esses modelos me parecem obsoletos e ultrapassados. Agora, e se com base na disponibilidade de conteúdos os professores pudessem ensinar menos e orientar mais, aumentaria a possibilidade de individualização do currículo e de um melhor aproveitamento pessoal do aprendizado. Assim, poderíamos conceber uma escola em que os alunos escolhessem quando melhor realizar avaliações e avançar em seus estudos com base em uma orientação pessoal oferecida por um professor-mentor onde o presencial se daria apenas para uma reflexão sobre o próprio processo de aprendizado ou para orientação de grupos de trabalho e todo o resto da aprendizagem se daria de forma autônoma e preferencialmente a distância… Pergunto: como medir isso? como definir se este ensino é presencial ou a distância? A fixação da norma proporcional talvez poderia dificultar a implantação de uma solução como esta…

Uma outra questão que acho relevante. Em que medida o ensino a distância apenas se apropria dos elementos da presencialidade, deixando de explorar todo o potencial de autonomia que há nele. Penso isso porque em geral encontramos no mercado um ensino a distância que tem um design mais fixo, se concentrando mais na apresentação quase mecânica de conteúdos e avaliações com o intuito de cortar custos. Ora este ensino a distância, em essência, pouco se diferencia do presencial… O aluno ainda é um aluno sem voz que é conduzido pelas mãos até o conhecimento… A famosa flexibilidade do ensino à distância se reduz drasticamente a uma questão de horário simplesmente.

Ainda está começando a aparecer soluções realmente flexíveis e que não apenas simulam uma flexibilidade. Quando digo flexibilidade penso em personalização e fragmentação. Por exemplo, neste curso à distância que estamos fazendo ainda temos uma grade fixa de disciplinas a serem cursadas em uma ordem fixa e em um tempo pré-determinado. Isto é uma mera repetição de hábitos do ensino presencial que poderiam ser transcendidos facilmente pelo ensino a distância… Por que eu não poderia fazer uma disciplina por vez se assim fosse do meu agrado? e na ordem que eu achasse melhor? Nunca vi nada assim, estou começando a ver isso em alguns moocs tipo o coursera que oferece especializações com esta característica. Isso abriu minha cabeça pra esse assunto da fragmentação! Imagina uma instituição que ofereça cursos por demanda… o aluno poderia pagar por uma disciplina, ou por uma avaliação final simplesmente… do modo que lhe convier e no tempo que for necessário… Imagine se dentro de um sistema educacional estes créditos fossem intercambiáveis entre uma instituição e outra… Eu poderia cursar uma parte em cada instituição da maneira que me fosse mais interessante e tirar a certificação por uma outra ainda, tudo com base em créditos intercambiáveis, com currículos líquidos e uma fragmentação de todo o processo, altamente relevante e personalizado… Isso é perfeitamente possível e tenho a impressão que um modelo assim seria altamente competitivo no mercado, tendendo para um aumento na qualidade, já que o aluno não tem a obrigação de se amarrar inteiramente a uma única instituição de ensino… mas será que nossas instituições e normas estão prontas para algo assim?

Diante desta questão, a professora Susane Garrido me convidou a imaginar qual seria o diferencial competitivo de uma instituição de ensino sem um currículo obrigatório:

Acho que cheguei em uma possível resposta a sua pergunta. O diferencial competitivo de uma instituição poderia ser a quantidade de oportunidade de aprendizado significativo que ela ajuda você a desenvolver ao longo do seu processo de aprendizagem e não exatamente o currículo que ela acha que pode ser interessante pro seu processo de aprendizagem antes mesmo de conhecê-la. Nesse sentido, se formos entender o currículo como diferencial de mercado, então estamos supondo que o currículo que ela cria tem em si a oportunidade ideal para a aprendizagem de um aluno sobre o qual ela não sabe nada na hora de montar este currículo. Seria como vender um sapato 39 pra uma pessoa que só vamos descobrir quanto calça depois do sapato vendido. Quando a escola descobrir que ela vende a descoberta de um processo e não o processo em si, aí sim ela estará falando a mesma língua da educação…

Por essas que venho me tornando o que gosto de chamar de edupunk (não fui eu que criei este termo, vi no livro: DIY U — Edupunks, Edupreneurs, and the Coming Transformation of Higher Education de Anya Kamenetz)… Com isso tudo quero dizer que só faz sentido uma educação que faça sentido… Tenho a impressão que a escola na medida em que se concentra em um discurso cujos termos são sempre avaliação, currículo, carga-horária, disciplina, obrigatório, etc. acaba deixando de dar sentido pra educação, ou melhor, acaba dando um sentido pra educação que ela não deveria ter que é currículo, carga-horária, avaliação, disciplina, obrigatório, etc… A necessidade da educação se tornar disruptiva neste momento é muito grande e o que é disruptivo, por definição, tem que trabalhar com outra lógica e trabalhar com outra lógica é necessariamente usar outra linguagem.

Após estas reflexões me dediquei a fazer duas resenhas, uma sobre o material a respeito da Open University e outra sobre as metodologias ativas, as quais podem ser lidas abaixo:

(O mesmo documento pode ser melhor visualizado acessando este link: Resenha 1 — The Open University)

(O mesmo documento pode ser melhor visualizado acessando este link: Resenha 2 — Metodologias Ativas: A Sala de Aula Invertida)

Referência:

KAMENETZ, Anya. DIY U: Edupunks, Edupreneurs, and the Coming T ransformation of Higher Education. Chelsea Green Publishing Company: White River Junction, 2010.

Todas as referências, links, vídeos e artigos que consegui coletar no material do curso e nos fóruns sobre os fundamentos da tecnologia educacional e educação à distância encontram-se organizadas em um caderno de notas no Evernote, o qual pode ser acessado através deste link:Caderno de Notas “Fundamentos da Tecnologia Educacional e Educação à Distância”

 by the author.

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Rafael Caputo
Rafael Caputo-Portfólio

Filósofo edupunk, interessado na disseminação de aprendizagens autônomas com o auxílio da tecnologia.