Como o preconceito e o desenvolvimento socioeconômico de um país estão relacionados

IDH, pobreza, corrupção, felicidade, educação e até QI são alguns índices que possuem alta correlação com machismo, racismo e homofobia.

Matheus Hanssen
Ship It!
7 min readJan 26, 2023

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Alan Turing, considerado o pai da Inteligência Artificial, foi perseguido pelo fato de ser homossexual. A primeira pessoa programadora de computadores da história foi Ada Lovelace, uma mulher. O maior jogador brasileiro da história do futebol, Pelé, era negro. Richarlyson, ex-jogador que recentemente assumiu ser bissexual, mesmo sendo titular e fundamental em uma das épocas mais vencedoras da história do São Paulo, era o único jogador que não tinha seu nome gritado pela torcida por suposições de que ele não era heterossexual. Na música, podemos citar Renato Russo e Freddie Mercury.

Felizmente, todas essas pessoas puderam compartilhar seu talento, mas a diferença é que precisaram ter grande resiliência para mostrar seus trabalhos. Turing, mesmo setenta anos após sua morte, ainda tem grande influência no ramo.

Mas, e se por uma questão puramente de preconceito, Turing e tantas outras pessoas não pudessem compartilhar seu talento?

Imagine agora quantas pessoas não conseguem superar essa barreira e não podem contribuir para um mundo melhor. Imagine quantas músicas deixamos de ouvir, quantos jogadores deixamos de assistir e o quanto o mundo não se desenvolveu por esse preconceito. A ideia deste artigo, inclusive, é mostrar a correlação existente entre o desenvolvimento de um país e os índices relacionados a direitos humanos e minorias. Poderemos ter uma ideia do quão importante essas pessoas são no desenvolvimento de uma nação.

Foram capturados 32 arquivos do site Our World in Data, contendo diversos indicadores socioeconômicos para as análises.

Desigualdade de Gênero

O machismo ainda é um problema mundial. Na Copa do Mundo de futebol masculino, no Qatar, os países do Oriente Médio ficaram em evidência e o Irã foi destaque na mídia pelo fato de ainda proibir a entrada de mulheres no estádio. Também não é novidade que as mulheres recebem no Brasil, em média, um salário menor em comparação aos homens atuando no mesmo cargo e a liderança das empresas ainda é majoritariamente masculina.

Essa diferença, no entanto, é maior em lugares mais pobres, mais corruptos, com qualidade de vida mais baixa, com baixa escolaridade e até QI médio inferior.

O primeiro gráfico abaixo mostra a relação entre Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e o Índice de Desigualdade de Gênero (GII). A correlação existente entre esses dois índices, em módulo, é de 0,91, representando uma correlação muito forte. Os cinco países com os melhores índices relacionados a desigualdade de gênero (Suíça, Dinamarca, Suécia, Países Baixos e Bélgica) foram destacados em vermelho e estão entre os países com maior IDH do mundo. Noruega, Finlândia, França, Islândia e Eslovênia, países que fecham o top-10, também possuem um índice elevado - todos acima de 0,9. O Brasil, para efeito de comparação, está destacado com a cor verde.

O mesmo vale para o indicador de corrupção. A correlação entre os índices é de 0,75:

E abaixo temos a relação entre o GII e indicadores voltados à educação (média de anos de estudo), e inteligência (QI), evidenciando o mesmo comportamento:

Racismo

Mensurar a tolerância racial de um país é mais difícil quando comparamos com outros índices. No caso da desigualdade de gênero, podemos comparar o salário médio por hora entre homens e mulheres do mesmo cargo, por exemplo. Podemos dizer que um indicador que mensura o racismo é mais subjetivo, uma vez que existem diversas formas de ele existir e é possível que uma pessoa ou grupo social não tenha problemas com uma raça X, porém é intolerante a uma raça Y. Além disso, uma vez que a maioria das pessoas entrevistadas tem a consciência de que o racismo não é aceito na sociedade atual, pode ser difícil afirmar que todos estão sendo honestos. Para tentar minimizar esses problemas, o índice consiste em uma série de perguntas ou afirmações como: “Um país é mais forte quando é mais racial e etnicamente diverso”.

Sabendo disso, vamos às análises. Podemos observar que, apesar de a correlação com os indicadores socioeconômicos ser mais baixa quando comparada à desesigualdade de gênero, ainda é bem perceptível. Nesse primeiro gráfico, temos um índice, o Happiness Index, que mede o quanto as pessoas se sentem felizes no país em que vivem.

Os países com o menor índice de preconceito estão novamente destacados em vermelho: Países Baixos, Canadá, Nova Zelândia, Suécia e Dinamarca. Esse grupo também faz parte dos países em que as pessoas se sentem mais felizes no mundo. O único país que passa o valor 7 no índice de felicidade e possui um alto índice de racismo é Israel.

Em seguida, podemos analisar outros indicadores relacionados ao desenvolvimento em educação: expectativa de anos de estudo e o total gasto pelo governo em educação, em percentual do PIB, entre 2013 e 2018. Destaque para a Austrália com quase 22 anos de estudo esperados (o ponto azul mais acima no gráfico à esquerda), enquanto os nórdicos Noruega, Suécia e Dinamarca gastaram quase 8% do PIB. Todos esses países listados estão entre os países menos racistas do mundo.

LGBT+

Outra relação que pode ser feita é entre a legalidade do casamento homossexual com alguns desses indicadores já mencionados aqui, e nesse caso a discrepância é bem alta. Foram três categorias analisadas:

  • Casamento entre pessoas do mesmo sexo é legalizado
  • Casamento entre pessoas do mesmo sexo é ilegal
  • Somente alguns direitos entre casais do mesmo sexo, o que significa dizer, nesse estudo, que os países dessa categoria permitem que casais do mesmo sexo realizem uniões civis, mas não se casem. Alguns exemplos são República Tcheca, Croácia, Itália, Grécia e Hungria.

Quando analisamos a média do IDH por categoria, vemos que o número entre lugares em que o casamento é legalizado é bem mais elevado do que países onde é ilegal, representando um IDH médio de um país subdesenvolvido (0,68). Para se ter uma ideia, países como Venezuela, Iraque e Nicarágua têm um índice próximo a esse valor. Itália, França e Espanha são exemplos de IDH próximo a 0,89.

Além disso, os países onde o casamento é ilegal representam, em média, uma taxa de pobreza três vezes maior do que a média de países onde o casamento é legal. A receita mediana, convertida em dólares, também é bem maior nestes locais:

No setor de educação, o QI em países com casamento legal é 20% maior, enquanto o tempo médio de estudos é quase 50% mais elevado.

Quando impedimos e restringimos uma pessoa apenas por sua raça, cor, gênero ou orientação sexual de viver bem e mostrar seu trabalho, também estamos impedindo o desenvolvimento econômico, de uma empresa ou de um país inteiro. Seja qual for a causa e qual for o efeito, fica claro que os países com os melhores indicadores de qualidade de vida também são aqueles que mais se preocupam com o bem-estar da sociedade.

A RD se preocupa muito com esse assunto e está sempre em busca de lutar contra o preconceito, e por isso temos várias oportunidades abertas, exclusivas e afirmativas. Essas e outras vagas, você encontra aqui!

Todos os gráficos foram gerados em Python e você pode encontrar o código e todos os arquivos aqui no meu repositório do Github.

Referências

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