Manifesto dos Dados: Valores e Princípios como base para uma Estratégia de Dados

Junior Alves
Ship It!
Published in
4 min readDec 2, 2021
Post it escrito “Data Manifesto”
Arte inspirada em Prinkipo via Shutterstock

Não consigo imaginar qualquer empresa, nos dias de hoje, dizendo “dados não são importantes para nós”. Soaria até como uma desconexão a tudo que está acontecendo. Dados tornou-se um componente vital de estratégia corporativa e isso tem feito diversas empresas partirem para uma “corrida pelos Dados”, que consiste em uma disputa sobre quem está conseguindo contratar os melhores profissionais e quem esta criando os componentes de dados mais sofisticados. Tivemos algo parecido há alguns anos em relação a métodos ágeis e hoje, visualizando esse paralelo, tenho uma convicção:

Todo trabalho com dados, em qualquer empresa, deveria começar com um Manifesto dos Dados.

Lembram do começo da “corrida pelo ágil”, poucos anos atrás? Empresas que confundiam velocidade com agilidade estavam sedentas pelo tal do ágil. Tudo que elas sabiam era que as startups e as empresas de tecnologia usavam esse “método” e que ele era o futuro dos modelos de gestão. E não ser ágil passou a ser evidência de estar ultrapassado. Sem antes compreender o Manifesto Ágil e entender se estavam dispostas a compartilhar aqueles valores e princípios, organizações deram início a projetos de “Implantação de Scrum”, contrataram agilistas (para que eles fossem responsáveis por garantir a adoção do ágil) e transformaram os antigos PMOs em “escritórios de agilidade”.

O resultado em termos de antecipação de entrega de valor, aprendizado e colaboração foi zero e apenas desperdiçaram dinheiro e tempo, perdendo ótimos profissionais nesta tentativa frustrada de fazer parte de algo que sequer sabiam do que se tratava. E muitas empresas estão fazendo o mesmo com Dados, dando origem a uma nova corrida.

Da noite para o dia, o tema saiu das profundezas do BI e do DW e ganhou espaço nas pautas sobre estratégia. O “mercado” está trazendo cada vez mais cases de organizações que estão obtendo diferencial competitivo com o uso de dados. O que se lê a respeito, em geral, é uma sopa de letrinhas formada por IA e ML, algumas buzzwords como Big Data e algoritmos, somado à informação de quantas pessoas de Engenharia ou Ciência de Dados atuam nestas empresas. E mesmo sem saber ao certo o que esses termos significam ou esses profissionais fazem, os investimentos em Dados tiveram início.

Para quem atua na área, é incrível que as empresas estejam tão empolgadas com o potencial dos dados, afinal, isso confere uma condição única de demonstrar valor com essa disciplina, sem falar na inflação que isso gerou nos salários! Mas essa empolgação pode facilmente dar lugar à frustração quando:

  • Uma pessoa do time de Engenharia de Dados é questionada se os dados estão chegando no Data Lake em tempo real, sendo que nenhum processo ou tecnologia da empresa está sendo alterado para consumir os dados em tempo real;
  • Uma pessoa do time de ciência de dados é contratada para ajudar a transformar a empresa no longo prazo, e é exigido dela um retorno financeiro de curto prazo, independente se isso ajudará ou não na transformação;
  • Uma pessoa do time de Machine Learning tem o seu trabalho questionado nos primeiros dias porque o resultado da máquina está com uma assertividade classificada como ruim, onde exceções são usadas para justificar essa afirmação e é exigido uma assertividade que nunca existiu na empresa.

Ocorre, neste contexto, um desalinhamento total sobre o que é um trabalho de Dados. Não há um entendimento de como funciona um processo de aprendizado de máquina, sobre a complexidade e o valor de um dado em tempo real e tão pouco se compreende como precisa ser o fluxo de trabalho do time de Ciência de Dados. Novamente o mesmo erro do Ágil se repete:

Estamos falando mais do que deveríamos sobre técnicas e tecnologia, porém menos do que precisaríamos sobre princípios, valores e cultura.

Assim como Ágil não é sobre processos ou métodos, Dados não é sobre tecnologia ou novos cargos da moda. Ambos são sobre Entrega de Valor e irão exigir das empresas uma mudança estrutural e cultural gigante para isso.

Antes de investir em equipes e projetos, é necessário criar e compartilhar valores e princípios sobre a importância de dados, e para isso, não basta uma frase de impacto sobre dados dita pelo presidente ou o tema ser pauta das agendas de diretores. A questão é sobre o compartilhamento de valores e de princípios. Isso é o que eu chamo de Manifesto dos Dados.

A exemplo do Manifesto Ágil, ele precisa ser algo que materialize o porquê de falarmos sobre o tema. Um documento simples criado com a alta gestão da empresa e compartilhado com todas as pessoas que interagirem com o assunto ou, porque não, ser parte integrante dos valores core da empresa (na RD Station, por exemplo, Data-Driven é um dos valores da empresa).

Portanto, começar uma jornada de Dados sem garantir que as pessoas envolvidas compartilhem os mesmos princípios e valores sobre o tema, é ignorar que Dados é sobre transformação cultural e que a tecnologia é um meio para chegarmos lá. Do contrário, perderemos tempo, dinheiro e bons profissionais, que deixarão as empresas por se sentirem esgotados em atuarem de uma forma que não irá entregar valor e em uma rotina que exige responder a perguntas que sequer deveriam ser feitas.

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