Amarelo | “Estou me sentindo azul”, uma história sobre Lapis Lazulli, depressão e água

Junno Sena
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3 min readSep 17, 2018

“Então eu vejo as cores desaparecendo; Gentileza da luz escapando; Sombras do meu medo invadindo; Eu já vi isso antes?” Distant Shore, Lapis Lazulli.

“I’m feeling blue” (Estou me sentindo azul) nunca fez tanto sentido quanto com Lapis Lazulli. Forjada da diamante mais sentimental em uma época de decisões e atitudes conflitantes, Lapis não é apenas uma lasca de uma sociedade quebrada e distorcida, mas também a representação mais próxima da depressão no universo de Steven Universe.

Só que, diferente de tantos outros personagens, a gem não ensina uma forma de conviver com esse sentimento auto destrutivo, pelo contrário, ela mostra o quão ruim ele é. Como ele atordoa, te fazendo questionar se fica ou se vai embora. Como ele machuca, não apenas você, mas também as pessoas ao seu redor. Como ele te faz se perguntar constantemente: “Eu mereço essas pessoas ao meu redor? Mereço esse sentimento de felicidade? Mereço ser amada?”.

É dessas perguntas que surgem suas atitudes impulsivas, que a fazem ser confundida com vilã, heroína, vítima e covarde. Pelo contrário, talvez ela seja uma das personagens mais corajosas de toda a animação. Diferente de Garnet, Pérola, Ametista e até mesmo Steven, ela não foi ensinada a se cuidar e se amar. Na verdade, se uma Pérola é uma escrava pessoal de uma Diamante e uma Quartz, um de seus guardas; Lapis talvez não passe de mais um entretenimento dispensável; uma beleza congelada; um anjo, frio e belo, mas com um poder inimaginável.

Logo, algo dispensável. Pronta para ser tudo que o outro espera, mas nunca pensar por si mesma. E é essa busca incessante para se tornar o que o outro procura em Lapis que a gem se perde. Um exemplo claro disso é a sua primeira aparição. Ela é um espelho quebrado, que mostra o que o outro quer, mas nunca de forma precisa. Ela é um reflexo do que queremos ver, mas nunca o que realmente queremos dela. E se isso já não é um gatilho para problemas psicológicos sérios — essa busca constantemente por um ser idealizado — , não sei o que pode ser.

Desde que Steven a curou, ou pelo menos lhe deu a chance de se curar, ela foi constantemente lapidada, pisada e posta diante de diversos questionamentos, para enfim, perceber que a dor que sentia era apenas uma parte sua que devia ser cuidada. “Eu sei que há algo que reside; Aquele terror dentro de mim […] Talvez eu me achasse sorrindo naquele canto distante; Talvez eu não esteja sozinha”.

E aquele canto distante representa muito além do espaço vazio que Lapis gostaria de tomar para si, mas também o lugar que habitou por tanto tempo. Por anos perdida em seus pensamentos estilhaçados presos em um espelho quebrado. Depois, presa, no fundo do mar, como Ofélia. E então liberta, apenas para se descobrir afogada nas sombras do medo da possibilidade de finalmente ser feliz. Ou melhor, de perder tudo aquilo que a faz feliz.

Até que ela se perde para não precisar ver tudo que a faz feliz ir embora. Ao invés de ir em direção a água como já fez, ela foge dela, foge dessa dissolução final que tanto a perseguiu. Desse medo de “desaparecer num horizonte longínquo e associar-se à profundidade ou à infinidade, tal é o destino humano que extrai sua imagem do destino das águas” (A Água e os sonhos, p. 18).

Mas, como foi dito anteriormente, Lapis é uma das personagens mais corajosas de Steven Universe e a sua fuga vai muito além de simples auto preservação, mas do desejo de guardar tudo que ama dos perigos que um dia enfrentou. De impedir que tudo que cultivou desapareça no mar. E, ironicamente, é desse mesmo sentimento que ela tira forças para sair do seu próprio sofrimento. De entender que a capacidade de amar já é uma luta vencida diante da sua depressão. Então, finalmente, ela emerge; respirando o ar puro.

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Junno Sena
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Apenas um escritor, jornalista e designer tentando encontrar um rumo.