Capítulo 6 | Cara gente branca, nossa liberdade é bem mais limitada do que pensa

Junno Sena
re_corte
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3 min readMay 7, 2018

“A sociedade não recompensa negros introspectivos. Nos meus 18 meses nesta Terra, vi que a masculinidade negra não tolhida pode ser tóxica como um tumor”. É ela que poda a criatividade de nossos jovens; que dita o que devem fazer ou não; que cria um manual de normas e padrões do que é ser um homem negro. E se o papel de Reggie na primeira temporada foi desconstruir o que é ser frágil em uma sociedade que dita que você deve ser forte; nesta segunda temporada, foi papel de Troy mostrar que se pode ser negro e também, humano.

Algo que Troy nunca se mostrou ser. Muito mais similar a uma casca preenchida com os ideais dos pais, que mergulhava em sexo e em amizades tóxicas para esconder a dor de seu peito; ele não tinha desejos ou ideais. Mesmo que seu dinheiro e status mostrassem diferente, ele era como qualquer outro. Moldado e pressionado com expectativas e narrativas que nunca seriam suas.

Que perseguia os moldes do que é ser um “negro respeitável”, não para poder se infiltrar na sociedade branca em que vivia e assim, ganhar seu espaço, mas por que às vezes, é mais seguro cair no silêncio do que dizer o que sente e ser julgado por isso. E esses sentimentos que se consumiam em seu peito não eram apenas sobre seu pai, mas sobre Coco, seus amigos e os diversos grupos que dependiam de sua opinião.

Mas nada era sobre ele. Pois Troy não era nada além de uma construção fantasiosa de aluno modelo. Troy não passava de uma fábula contada a brancos para que se sentissem seguros com a presença de um negro. Troy era um exemplo do que ninguém e nem mesmo ele poderia se tornar. E assim como aquela porta de vidro, sua identidade — ou melhor, máscara — se despedaçou.

E consequentemente, se tornou um monstro aos olhos dos outros. Um animal. Um selvagem que não consegue resolver os seus problemas com diálogo. Assim, o espectador entra em uma jornada para entender quem é este rapaz. Homem, hétero, negro. Estes diversos rótulos que incluem quem ele é e o que ele quer passar. Mas no fim do dia, os significados por trás dessas identidades apenas o limita.

Homem. Ser o protetor e provedor de uma mulher e consequentemente, da família em que devem construir. Hétero. Sentir-se atraído sexualmente pelo sexo oposto. Negro. Condição genética que o transforma em um perigo aos olhos de um branco. Troy de fato faz parte de cada um desses círculos, mas, em determinado momento, se encontrou tão alienado em corresponder ou não esses termos e expectativas, que não sabia mais quem via no espelho.

Se pode se dizer assim, ele fez o mesmo trajeto de Lionel na primeira temporada. E se pode ir mais além, talvez até mesmo por influência do amigo. Entender que ele poderia ser um rapaz divertido por si mesmo, com piadas que diziam respeito a si mesmo foi o primeiro passo para poder entrar e fazer parte de verdade do mundo apontado pelo pai. Um que quer te prender diariamente. Podar. Destruir. Conter.

Essa constante lembrança do lugar social que preenche é o que faz com que ele continue vivendo cada um de seus dias. Antes, Troy apenas estava presente na série, agora, ele tem motivos reais para se manter nela. Talvez desta vez, quem sabe, Joelle até o marque como “Woke” naquele aplicativo.

Parece que chegamos ao fim, não apenas de uma grande temporada de Dear White People, mas da nossa maratona de análises. Gostou? Então deixa seu clap, like, compartilha, manda até para o grupo da família!

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Junno Sena
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Apenas um escritor, jornalista e designer tentando encontrar um rumo.