O abismo entre a empatia e a hostilidade

Rodrigo Rebello
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4 min readOct 3, 2020

Entre dodecaedros a construções de caráter

Dodecaedro Rômbico Estrelado, por Oficina Matemática

Para ser hostil com alguém não é preciso dar um tiro nessa pessoa. É só não ajudá-la que dá na mesma.

Dentre as nossas vivências em meio à sociedade a gente aprende — quando se quer — , a criar critérios e valores. Pelo meu caminho, os aprendizados estão em maioria ligados aos exemplos de como não agir. E isso me ajuda a construir os meus valores. Em outras palavras, ter critérios significa agir com discernimento. E eu não estou dizendo que sou melhor ou pior que alguém, muito menos que eu sou sábio, mas significa dizer que estou moldando minhas ações de acordo com meus critérios para ser uma pessoa melhor para mim mesmo e para os outros ao meu redor e não vou desistir.

Através de reflexões e vivências, se pode contribuir para que os demais também tenham esse discernimento sobretudo com relação às posturas de pessoas que se colocam no patamar de donas do saber.

Por exemplo, imagine uma sala de aula com alguns alunos onde todos tem aproximadamente a mesma idade e nível de conhecimento. Estão todos aprendendo, buscando o seu desenvolvimento para que lá na frente possam se aplicar num concurso, vaga de emprego ou universidade. Estão experimentando a vida como esta se mostra. Um professor sobre o qual os alunos e seus superiores se identificam muito, por ter uma postura que deambula entre o firme e o angelical, sorridente e ao mesmo tempo sério — e aqui falamos apenas sobre a aparência — , torna-se aos olhos desses alunos alguém empático. Este professor se identifica mais com alguns alunos do que com outros. Logo, esse professor se aproxima desses alunos com os quais ele se identifica fazendo uma escolha, como através de por um empréstimo de um livro raro e não mais publicado, dividindo uma dica importante sobre o que cairá na prova, numa indicação de filme ou num incentivo moral. Da mesma forma que ele age de um jeito obediente ao diretor da escola, fazendo aquilo que é necessário para ser mantido neste cargo de professor. Enquanto que, para os outros alunos, a sua própria falta de proximidade faz com que estes não tenham as mesmas oportunidades e, por isso, não tem a orientação necessária para passar na prova. Sobre isso, podemos considerar que a falta de atenção gera hostilidade.

Portanto, quando os alunos conversam entre si e falam sobre esse professor, as opiniões naturalmente serão variadas. Ora, alguns alunos foram beneficiados, não precisarão passar noites a fio estudando para trilhar sua passagem para a próxima fase do curso. Já os outros, esses terão dificuldades que nem sempre serão vistas como boas, podendo ser chamados de baderneiros, não se esforçaram o suficiente ou não colaboram e por isso não são tratados da mesma maneira.

A ausência se faz presente sobretudo de acordo com a vontade desse professor em escolher com quem agir com empatia, segundo ele, profunda e verdadeira, e ser hostil com outros que, também segundo ele, não colaboram ou são difíceis de acessar. Em resumo, esse professor pode ser empático para uns mesmo que necessite ser hostil com outros.

De acordo com a filosofia essa conduta pode ser chamada de falta de caráter.

Num mundo material, poderia se pensar que por causa da queda no número de vendas de seguros de vida aumenta-se a meta dos corretores porque o importante são os negócios. Ou ainda, trocando em miúdos, para querer ser empático com a plateia pode-se qualquer coisa inclusive ser hostil com aquele que está na coxia. Assim que o homem contemporâneo é. Nestes exemplos, ser empático não se caracteriza simplesmente por saber, ter um conhecimento elevado, meditar no alto do Himalaia, ter pós-graduações mil ou bons cargos. É o simples ato de manter aproximidade com todos os alunos, conhecer seus perfis mas sem julgá-los e buscar, através da análise de seus próprios critérios sobre como seria estar no lugar destes alunos.

A empatia começa sempre de dentro para fora. E é prática diária, agir de acordo com sua construção de caráter, com dignidade. Mesmo que isso seja, a primeira vista, uma desobediência que não estava escrita no livro Modus Operandi.

“Acho que esse aluno age dessa maneira porque é assim ou assado” pode levar a uma queda a partir da escadaria imaginária que foi criada, porque ela não leva em consideração a versão do outro. Por isso, a importância de tentar se sentir como o outro se sente e isso só se dará quando houver um pouco de abertura.

Ao longo da vida, o homem se pergunta: “nossa, porque é que essa ou aquela pessoa está na minha vida?” e muitas vezes não se percebe que é para se passar uma lição.

Por fim, mesmo que você seja aluno ou professor tenha caráter ilibado. Cito duas frases para fechar:

“Honrai as verdades com a prática” — Helena P. Blavatsky

Seja o ser humano que o seu cachorro pensa que você é ao abanar o rabo assim que te vê chegar.

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