“Melhor um robô do que uma criança real”: a lógica espúria usada para justificar bonecas sexuais infantis

Iza Forzani
Recuse A Clicar
Published in
16 min readOct 18, 2020
Robôs e bonecas sexuais infantis não oferecem uma solução para o abuso sexual infantil. Em vez disso, diminuem as tentativas significativas de lidar com uma epidemia de abuso infantil e obscurecem seus impulsionadores culturais. (Lukas Schulze / Getty Images)

O documentário The Future of Sex: Sex Robots and Us (n.t. algo como “O futuro do sexo: robôs sexuais e nós”), da BBC Three, acompanha o apresentador James Young enquanto ele entrevista fabricantes de bonecas sexuais e robôs realistas em todo o mundo. Em uma fábrica de bonecas sexuais de Tóquio em 2018, com bonecas sem cabeça em vários estágios de desenvolvimento espalhadas por toda parte, uma boneca em particular chama a atenção de Young. Ao contrário das outras bonecas modeladas em mulheres adultas, esta é pequena.

Visivelmente desconfortável e piscando para conter as lágrimas, Young pergunta: “O que é esta boneca?” Hiro Okawa, o fabricante, responde: “Temos que deixar para a imaginação do cliente a definição de idade real.” Aparentemente sentindo a angústia de Young, ele acrescenta: “Claro, eu entendo o que você está tentando dizer. Mas pode haver algum tipo gosto especial por modelos pequenos ou infantis.” Com a mão trêmula, Young enxuga os olhos. Uma vez do lado de fora, ele descreve a experiência como “horrível” — acrescentando que “tinha que sair de lá”.

Embora altamente controversas, as bonecas sexuais infantis como essas já estão no mercado e foram vendidas por meio de varejistas on-line convencionais como Amazon e Wish por vários anos. Os especialistas preveem que os robôs sexuais infantis serão os próximos, e alguns acreditam que eles já estão em produção.

Bonecas sexuais e robôs: um fenômeno cultural

A produção de bonecas e robôs sexuais realistas atraiu atenção significativa da mídia e interesse público. As bonecas sexuais e os robôs já foram objeto de documentários, filmes pornográficos, filmes de Hollywood, programas de televisão e conferências acadêmicas. Bordéis de bonecas sexuais, onde os homens podem alugar bonecas sexuais femininas por hora, já existem em vários países. De acordo com representantes da indústria do sexo, a inovação da tecnologia de robôs sexuais é uma das maiores tendências da indústria, uma “virada de jogo” e o caminho do futuro.

A natureza altamente marcada pelo gênero das bonecas sexuais e robôs raramente é reconhecida pelos defensores acadêmicos dos produtos. A grande maioria dessas bonecas e robôs são mulheres encarnadas, normalmente projetadas de acordo com os padrões pornográficos. A pesquisa indica que os proprietários de bonecas sexuais são predominantemente homens. As bonecas sexuais infantis têm o mesmo gênero e modelam os corpos de meninas pré-púberes. Ainda estou para ver uma boneca infantil de corpo masculino. Essencialmente, esses produtos são representações materiais realistas de mulheres e meninas comercializadas para uso sexual masculino.

Os proponentes acadêmicos de bonecas sexuais com corpo feminino e robôs não conseguem situar os produtos dentro do contexto cultural mais amplo em que são produzidos — um em que a desigualdade de gênero persiste, onde a violência masculina contra mulheres e crianças continua sendo um sério problema global, e onde as mulheres e meninas são estupradas, espancadas, abusadas e prostituídas por homens. Dentro de um sistema existente de dominação masculina e subordinação feminina, as bonecas sexuais com corpo feminino reforçam o status de subordinação das mulheres e a objetificação sexual de mulheres e meninas. Apesar dessa realidade, vários acadêmicos encorajam a fabricação desses produtos para uso sexual masculino, e alguns realmente anunciam bonecas sexuais infantis como um tratamento terapêutico para estupradores de crianças — uma abordagem que considero equivocada e irresponsável.

Bonecas e robôs sexuais para atender às necessidades sexuais dos homens

Proponentes acadêmicos de bonecas e robôs sexuais os apresentam como uma solução para a aparente “privação sexual” dos homens. Há uma falta de pesquisa empírica sobre as reais consequências desses produtos, mas apaziguar o desejo sexual masculino tem precedência sobre qualquer preocupação com os direitos humanos de mulheres e meninas. De acordo com David Levy, co-fundador do instituto britânico de robótica Intelligent Toys Ltd e autor do livro de 2007 Love and Sex with Robots, eles poderiam funcionar como parceiros íntimos ou como alternativa ao pagamento de serviços sexuais. Defensores como Ezio Di Nucci argumentam que os robôs podem funcionar como uma válvula de escape para indivíduos que estão “sofrendo” devido a necessidades sexuais não satisfeitas. O professor associado da Universidade de Manitoba, Neil McArthur, destaca a situação de jovens que lutam contra a “distribuição desigual da satisfação sexual”:

Como outras formas de desigualdade, a desigualdade sexual tem um impacto generalizado na sociedade. Quando os indivíduos, especialmente os jovens do sexo masculino, são privados da perspectiva de companhia sexual, eles podem se tornar uma fonte significativa de instabilidade social … Podemos nos perguntar até que ponto a mera posse de um robô sexual pode aliviar os custos psicológicos e sociais da privação sexual.

Levy e outros defensores afirmam que não apenas as bonecas sexuais e robôs poderiam fornecer uma saída para aqueles indivíduos “privados” de sexo sob demanda, mas também poderiam fornecer uma saída para indivíduos que desejam se envolver em “práticas sexuais ilegais e anti-sociais” ou para encenar fantasias violentas e sádicas à vontade. Algumas dessas práticas sexuais ilegais envolvem crianças.

Bonecos e robôs sexuais infantis “terapêuticos”

Acadêmicos propõem que bonecas sexuais infantis possam ser usadas para tratar pedófilos. Em uma conferência de robótica em 2014, o diretor do Laboratório de Robôs Móveis da Georgia Tech, Ronald Arkin, sugeriu que robôs sexuais infantis poderiam ser usados ​​para pedófilos da mesma forma que a metadona é usada para tratar viciados em drogas, uma ideia que está ganhando força nos círculos acadêmicos. O filósofo Marc Behrendt da Université Libre de Bruxelles ganhou o prêmio inaugural David Levy de melhor artigo especial por seu artigo de 2017, no qual propôs que sexbots infantis poderiam funcionar como um “meio alternativo de terapia” para pedófilos, com seu uso autorizado por profissionais médicos e em consulta com comitês de ética.

Não faltam propostas de como as bonecas sexuais infantis ou robôs para uso pedofílico poderiam ser regulamentados. Alguns defensores admitem que não devem ser vendidos sem receita, mas podem ser disponibilizados aos pedófilos em uma série de condições, como registro com um psiquiatra (ou junto com a terapia e com supervisão médica rigorosa). Os usuários podem ser obrigados a se submeter a verificações aleatórias de computador pela polícia ou a obter uma licença especial, como uma licença de arma, para comprar as bonecas.

É difícil de acreditar que propostas de envolver as autoridades públicas em um mercado de comércio de bonecas sexuais infantis estejam sendo feitas. Ainda mais preocupante é a noção de que estão se considerando “medidas especiais” financiadas pelos contribuintes para se atender as preferências sexuais dos pedófilos; embora tais propostas provavelmente sejam bem atraentes para os mesmos.

“Melhor um robô do que uma criança real”

Defensores acadêmicos de bonecas sexuais infantis descartam as objeções feitas por opositores como que se estas fossem enraizadas em um mero desconforto ou repulsa social sobre o tema “sexo entre adulto e criança”. Eles rotulam aqueles que se opõem às bonecas sexuais infantis como socialmente puritanos, ou como tendo a mente fechada para as possibilidades de uso de bonecas sexuais infantis. Os pesquisadores da Universidade de Oslo, Ole Martin Moen e Aksel Braanen Sterri, alertam que, ao lidar com a pedofilia, “nosso objetivo não deve ser encontrar saídas para nossa repulsa e indignação”. De acordo com Craig Harper, um psicólogo e cientista da Nottingham Trent University, criminalizar a posse de bonecas sexuais de crianças é “literalmente criar um crime sem uma vítima por motivos de repulsa moral”. A natureza de gênero das bonecas, projetadas para se parecer com crianças do sexo feminino para o prazer sexual de homens adultos, é ignorada por esses acadêmicos.

Outros afirmam que o desconforto da sociedade pode atrapalhar pesquisas adicionais importantes.

Michael Seto, diretor de Pesquisa de Reabilitação Forense do Royal Ottawa Health Care Group, disse que espera “que as pessoas possam superar suas reações emocionais à ideia de bonecas sexuais infantis ou pornografia infantil fictícia, na esperança de que possamos encontrar um opção que ajude as pessoas com pedofilia e torna as crianças mais seguras ”. James Cantor, psicólogo e neurocientista canadense, também acredita que proibir o uso de bonecas sexuais infantis e robôs, o que equivale a “bloquear as formas inofensivas de se masturbar”, pode deixar os criminosos sexuais mais desesperados e propensos a ofender. “É claro que algumas pessoas se sentirão desconfortáveis ​​com esse tipo de pesquisa”, ele continua. “Mas eles devem se sentir ainda mais desconfortáveis ​​enquanto permanecermos sem ele.”

Embora seja verdade que não existam dados empíricos sobre os resultados do uso de bonecas sexuais com crianças, é difícil imaginar como pesquisas dessa natureza poderiam ser conduzidas de maneira ética.

Alguns defensores enquadram as bonecas, modeladas nos corpos de crianças do sexo feminino, como um brinquedo sexual como qualquer outro. Em uma discussão on-line sobre bonecas sexuais infantis, Cantor twittou: “Aceito brinquedos sexuais de látex e não me importo com a aparência deles”. Em 2017, respondendo a notícias de pedófilos que enfrentariam pena de prisão pela importação de bonecas sexuais infantis, Cantor escreveu em um tweet, “Austrália protegendo a sociedade de crimes contra o látex. Crimes mentais contra o látex. ”

A organização americana Prostasia Foundation — que faz campanha contra as leis que criminalizam as bonecas sexuais infantis que afirma serem “inconstitucionais, equivocadas e imorais” — também trata as bonecas sexuais infantis como meros brinquedos sexuais, enquadrando seu uso como “o uso pessoal e privado de brinquedos sexuais.” Diferentes de outros brinquedos sexuais, no entanto, as bonecas sexuais infantis são projetadas para facilitar a experiência da fantasia corporificada dos homens de estuprar uma menina.

Os defensores das bonecas sexuais infantis apresentam bonecos e robôs infantis como uma solução para o abuso sexual infantil. David Levy disse: “Seria preferível que os pedófilos usassem robôs como saídas sexuais do que crianças humanas”. Esses defensores veem a pedofilia como uma orientação sexual que pode estar fora do controle do indivíduo. “Molestar crianças é um crime horrível, mas sentir atração sexual que não se pode evitar é eticamente neutro”, tuitou Cantor. Moen e Sterri argumentam que, se os pedófilos não têm controle sobre suas preferências sexuais, usar uma boneca sexual infantil ou um robô pode ser “uma das melhores estratégias disponíveis para eles, dada a situação infeliz em que se encontram”.

Apoiadores acadêmicos de bonecas sexuais infantis chegam a sugerir que não fornecer bonecas sexuais infantis aos pedófilos para simular o abuso infantil pode ser prejudicial. Behrendt escreve:

Se o fim justificar os meios … qualquer tipo de opção terapêutica deve ser considerada, analisada, escrutinada, pesada e até experimentada … a sociedade civil ainda pode se dar ao luxo de ver outras vítimas infelizes, involuntariamente presas à terrível teia de criminosos sexuais? Outras almas traumatizadas para o resto da vida? Outras crianças assassinadas?

Da mesma forma, Cantor pergunta: “Se pesquisássemos vítimas de abuso sexual infantil, eu me pergunto quantos diriam que DESEJARAM que seus agressores tivessem uma boneca sexual que poderia ter tomado seu lugar?”

Os defensores das bonecas sexuais infantis afirmam que bonecas infantis impedem o abuso de crianças reais. No entanto, não há garantia de que os pedófilos que têm acesso a bonecas infantis as usarão ao invés de crianças. Não há evidências para a ideia anteriormente popular de que os homens cometem violência sexual contra mulheres, crianças e outros homens devido ao desejo sexual incontrolável ou porque não têm uma válvula de escape suficiente para seus impulsos. Da mesma forma, não há evidências de que as bonecas sexuais infantis levem a uma redução no abuso de crianças.

Não há escassez de saídas sexuais disponíveis para os homens fora dos relacionamentos íntimos tradicionais. Os homens podem buscar encontros sexuais por meio de aplicativos de namoro ou namoro; eles podem acessar um suprimento infinito de pornografia, ver modelos de webcam ou se envolver em sexo virtual. Em muitas partes do mundo existe uma próspera indústria do sexo legal, onde os homens podem ter acesso a uma variedade de mulheres para o sexo, e agora existem bordéis de bonecas sexuais. No entanto, ter acesso a essas saídas não impediu os homens de estuprar. Pelo contrário, a violência sexual continua prevalecendo em todo o mundo.

O argumento de que as bonecas sexuais infantis podem funcionar como uma válvula de escape sexual, evitando que indivíduos que estuprariam crianças o façam, também falha em considerar o contexto cultural mais amplo em que esses produtos são fabricados — um sistema de dominação masculina institucionalizada, objetifivação sexual rotineira de mulheres e uma cultura que erotiza as meninas.

As mensagens culturais apresentam cada vez mais as meninas como sexualmente disponíveis e atraentes. O gênero pornográfico “adolescente” aparece de forma consistente na lista de termos de pesquisa mais populares do agregador de pornografia online Pornhub. A pornografia “Barely Legal” (n.t. “quase legal”)apresentando adolescentes com tranças, peito liso e suspensórios pode ser comprada em quiosques e postos de gasolina. Calcinhas fio-dental, sutiãs acolchoados e tops de biquíni e roupas íntimas com slogans sexualmente sugestivos são comercializados para meninas pré-adolescentes. O material publicitário retrata meninas de forma sexualizada e como se fossem adultas. Colegiais são fetichizadas e fantasias de colegiais sensuais são vendidas em varejistas convencionais. O Instagram hospeda rotineiramente conteúdo sexualizado de meninas menores de idade e as respostas a esses conteúdos feitas por “predadores”*. As principais livrarias e mercados online foram expostos vendendo e-books eróticos que apresentavam incesto e abuso infantil. O “mercado adulto” vende masturbadores para projetados para simular as vaginas de meninas adolescentes — como o Teenage Dream ou Lolita Vibrating Vagina — usando como estratégia de venda a inocência e juventude das mesmas.

Nem todos os criminosos sexuais infantis são pedófilos

As afirmações dos defensores das bonecas sexuais infantis de que as bonecas poderiam prevenir o abuso sexual infantil — porque os pedófilos usarão bonecas em vez de crianças — são especulativas. Para justificar o desenvolvimento de bonecos sexuais infantis e robôs, os apoiadores teriam que estabelecer que o abuso sexual infantil é perpetrado por “pedófilos” assim diagnosticados e que os pedófilos usarão bonecos em vez de crianças.

Mas não são apenas os pedófilos que cometem crimes de violência sexual contra crianças. Nem todos os criminosos sexuais infantis são pedófilos, e nem todos os pedófilos ofendem sexualmente crianças. De acordo com o Instituto Australiano de Criminologia, embora alguns perpetradores de abuso sexual infantil sejam atraídos por crianças, eles também podem ter interesse em adultos ou em abusar de adultos. Os criminosos sexuais infantis também podem agir por oportunidade, em vez de atração sexual por crianças. A pesquisa de Richard Wortley e Stephen Smallbone descobriu que fatores situacionais e ambientais desempenham um papel importante nos crimes sexuais contra crianças, e outras pesquisas destacam o papel da oportunidade no abuso sexual infantil — incluindo ambientes institucionais e religiosos, exploração infantil online e turismo sexual infantil.

Se o abuso sexual infantil também éperpetrado por indivíduos que não são principalmente sexualmente atraídos por crianças — homens que não têm uma preferência sexual preexistente por crianças — então as alegações de que as bonecas sexuais infantis poderiam proteger as crianças do abuso são questionáveis. Qual a eficácia das bonecas sexuais infantis para uso pedófilo na prevenção do abuso infantil, se muitos criminosos não são realmente pedófilos?

Mesmo que pudesse ser determinado que o abuso sexual infantil foi perpetrado exclusivamente por pedófilos com preferência sexual por crianças, a fim de justificar a fabricação de bonecas sexuais infantis ou robôs, seria necessário estabelecer ainda que fornecê-los para pedófilos evitaria sua ofensa contra crianças. De acordo com Marie-Helen Maras e Lauren Shapiro, da City University of New York, as bonecas sexuais infantis terapêuticas para uso pedófilo são “sem sentido e irracionais”. As bonecas sexuais infantis normalizam o abuso e a dominação infantil em vez de inibi-los e vão contra os objetivos da terapia cognitivo-comportamental, que desafiam pensamentos e comportamentos indesejáveis.

Bonecas sexuais infantis como serviço público?

Shin Takagi é dona da Trottla, uma fabricante japonesa de bonecas sexuais infantis que produz bonecas que lembram meninas de apenas cinco anos. Ele também é um pedófilo. Takagi acredita que suas bonecas prestam um serviço público para homens como ele. Ele afirma estar ajudando os pedófilos a encenar suas fantasias sexuais de maneira legal e ética, declarando: “Não vale a pena viver se você tem que viver com o desejo reprimido.”

As galerias de fotos online apresentam centenas de imagens de bonecas Trottla projetadas para se parecer com garotas pré-púberes. As bonecas são fotografados com tranças e ursinhos de pelúcia e simultaneamente retratadas como sexualmente convidativas. Bonecas pré-adolescentes realistas são apresentadas como prontas e disponíveis para o sexo, em vários estados de nudez. Algumas estão nuas, ao lado de meias até os joelhos. Outras estão fantasiados para seduzir, em lingerie pura ou com meias arrastão e chicotes. Uma galeria de fotos inclui uma série de imagens de bonecas nuas deitadas de barriga para cima nas camas, seus olhos sem vida olhando para longe, com figuras em forma de coração de chantilly e morangos escondendo seus genitais.

Algumas imagens sugerem voyeurismo, como as fotos com saias levantadas. Fotografias de bonecas no banho, tiradas à distância, sugerem que estão sendo observadas sem seu conhecimento. As imagens mais assustadoras são aquelas que parecem replicar cenários óbvios de abuso infantil. Uma fotografia mostra uma boneca pequena que parece ser uma menina de talvez seis ou sete anos, deitada de bruços em uma cama, com a cueca puxada para baixo.

As bonecas sexuais infantis de Takagi vêm com uma variedade de expressões faciais. Algumas bonecas parecem estar sorrindo, outras parecem estar chorando ou com dor. Ele explicou: “É preciso fazer uma variedade de expressões para atender a uma variedade de necessidades do cliente”. Takagi teria recebido cartas de agradecimento de clientes satisfeitos, incluindo médicos, professores e celebridades, que afirmam que ter acesso a esses bonecos os impede de atacar crianças.

Bonecas sexuais infantis e links para abuso sexual infantil

Embora os defensores das bonecas sexuais infantis argumentem que as bonecas evitarão os crimes sexuais contra crianças, o resultado mais provável é o oposto. As bonecas sexuais infantis prejudicam as crianças ao legitimar e normalizar seu uso sexual. Em vez de satisfazer o apetite sexual dos usuários por crianças, eles poderiam encorajar e até fortalecer esses desejos. As bonecas sexuais infantis podem ter um “efeito de reforço” na ideação pedofílica, afirma Peter Fagan, da Escola de Medicina John Hopkins, e o uso de tais bonecas pode causar impulsos pedófilos a serem executados com mais urgência.

Legisladores e agências públicas acreditam que pode haver uma ligação entre bonecas sexuais infantis e ofensas sexuais contra crianças. Foi estabelecida uma relação entre a visualização de material de exploração infantil e o estupro de crianças. Também pode haver uma ligação entre a posse de uma boneca sexual infantil e a posse de material de abuso infantil. Em 2018, uma batida policial em Melbourne viu bonecas sexuais infantis apreendidas junto com material “horrível” de exploração infantil, incluindo vídeos de crianças e bebês sendo torturados. No Reino Unido, vinte dos vinte e seis infratores recentes pegos com bonecas sexuais de crianças foram encontrados em posse de material de abuso infantil. Também no Reino Unido, um aumento nas apreensões de bonecas sexuais infantis levou a polícia a identificar suspeitos de pedofilia anteriormente desconhecidos, resultando em sete homens sendo acusados ​​e mais seis enfrentando acusações relacionadas a imagens de exploração infantil. De acordo com os Crown Prosecution Services, os casos de bonecas sexuais de crianças podem ser uma indicação de outros crimes contra crianças.

Um relatório do Instituto Australiano de Criminologia divulgado no ano passado argumentou que as bonecas sexuais infantis representam um risco de escalada de crimes sexuais contra crianças. Os autores Rick Brown e Jane Shelling afirmaram que as bonecas sexuais infantis podem “promover um continuum de comportamento que resulta em estupros de crianças, fazendo a ponte entre a fantasia e a realidade”. Padrões de escalada já foram documentados em consumidores de material de exploração infantil, e os pesquisadores acreditam que os consumidores de material de abuso infantil podem progredir para o uso de bonecos infantis.

Em um espectro de exploração infantil, desde assistir a vídeos de exploração infantil até o efetivo estupro de crianças, a prática de atos sexuais em uma boneca infantil pode ser entendida como uma progressão natural da visão de material de abuso infantil e um passo mais perto de abusar sexualmente de uma criança. Como reconhece Litska Strikwerda, conferencista da Open University, usar um robô sexual infantil pode ser uma experiência muito mais próxima de abusar sexualmente de uma criança. Maras e Shapiro argumentam que as recentes prisões no Reino Unido por importação de bonecas sexuais infantis indicam que os criminosos passam da visualização de material de exploração infantil para o envolvimento em atos físicos com bonecas sexuais infantis:

Nestes casos, a pornografia infantil “aguçou o apetite dos perpetradores” à medida que os seus “pensamentos” (fantasias sobre atos sexuais com crianças) se tornaram “comportamentos” (através da compra e importação da boneca sexual infantil para praticar atos sexuais com ela).

As bonecas sexuais infantis podem aumentar a probabilidade de abuso infantil, reduzindo quaisquer barreiras à prática de crimes sexuais contra crianças. Os usuários podem ficar insensíveis aos danos do abuso sexual infantil, já que as bonecas não dão feedback emocional. As bonecas sexuais infantis também podem ser usadas por criminosos sexuais no ato de agredir sexualmente uma criança. Os criminosos sexuais infantis podem usar bonecas infantis como uma ferramenta para preparar crianças para o abuso sexual, assim como os predadores usam a pornografia para preparar crianças. Brown e Shelling observam que as bonecas sexuais têm sido usadas para preparar crianças para abuso sexual, e as bonecas sexuais infantis podem ser ainda mais eficazes para cuidar das crianças do que as bonecas sexuais adultas.

Legitimar práticas de abuso infantil não é a resposta

O relatório do Instituto Australiano de Criminologia sobre bonecas sexuais infantis conclui que não há evidências de que as bonecas evitem o abuso sexual infantil. Ele também descobriu que “a interação com bonecas sexuais infantis pode aumentar a probabilidade de abuso sexual infantil, dessensibilizando o usuário da boneca aos danos físicos, emocionais e psicológicos causados ​​pelo abuso sexual infantil … normalizando o comportamento na mente do abusador”.

Não posso deixar de concluir que os argumentos acadêmicos em apoio às bonecas sexuais infantis são infundados, pouco convincentes e estão abertos a serem sequestrados por interesses velados. Eles priorizam as preferências sexuais dos homens sobre os direitos das meninas. Os defensores acadêmicos deixam de considerar a dinâmica de gênero envolvida na produção de bonecas infantis de corpo feminino para uso sexual de homens adultos, ou de situar seu desenvolvimento dentro de um contexto cultural de desigualdade de gênero.

Se as bonecas sexuais infantis funcionarem como os defensores afirmam, elas manterão os impulsos sexuais dos pedófilos por crianças. Em vez de encorajar a contenção ou investir energia na busca por relacionamentos ou práticas sexuais mais saudáveis, as bonecas sexuais infantis permitem a experiência de uma fantasia realista de abusar sexualmente de uma criança.

Robôs e bonecas sexuais infantis não oferecem uma solução para o abuso sexual infantil. Em vez disso, diminuem as tentativas significativas de abordar uma epidemia de abuso infantil e obscurecem os impulsionadores culturais que contribuem para isso, como o poder masculino e a sexualização das meninas. Se o objetivo é acabar com a exploração sexual infantil, a resposta nunca será encontrada na legitimação dessas práticas.

Caitlin Roper é ativista, escritora e candidata ao doutorado na universidade RMIT. Uma versão anterior desta peça apareceu na Arena Magazine.

Matéria original: https://www.abc.net.au/religion/spurious-logic-used-to-justify-child-sex-dolls/11856284

#RecuseaClicar

*Predadores nos EUA são aqueles que assediam e abusam de crianças e adolescentes.

Tradução livre, com uma pitadinha de Iza.

--

--

Iza Forzani
Recuse A Clicar

Uma pessoa que se importa muito com tudo e amante dos animais.