Objetificar mulheres sexualmente as leva a se auto-objetificarem; e danifica seu bem estar emocional

Ninka
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5 min readJan 25, 2020

Como uma mulher se sente quando um homem assobia para ela na rua? Ou quando um colega de trabalho a olha de cima abaixo antes de olhá-la nos olhos?

Esses exemplos podem soar relativamente inocentes para alguns, mas nossa pesquisa mostrou que essas situações podem ter consequências negativas sobre o bem estar emocional das mulheres.

Nós pedimos à algumas mulheres que tomassem nota de quaisquer incidentes de objetificação sexual em um aplicativo de smartphone, e junto com as notas ranquear seus sentimentos várias vezes ao dia durante uma semana.

Quando as mulheres experienciaram objetificação sexual de terceiros, em muitos casos isso as levou a examinarem de forma crítica sua aparência física, o que negativamente impactou seu bem estar emocional e psicológico.

Um ciclo de objetificação

O processo pelo qual a objetificação sexual é psicologicamente danosa às mulheres foi primeiramente descrita pelos psicólogos Barbara Fredrickson e Tomi-Ann Roberts no meio dos anos 90.

De acordo com a visão por eles apresentada, quando as mulheres são tratadas como objetos ou despersonificadas em suas partes, ela tendem a momentaneamente enxergarem seus próprios corpos pela perspectiva da pessoa que a está objetificando — uma perspectiva de fora de si mesmas. Em turno, elas se tornam preocupadas com sua aparência física e valor sexual aos olhos de outros.

Esse processo de “auto-objetificação” leva as mulheres a experimentarem sentimentos desagradáveis como vergonha ou ansiedade. Se repetida com frequência, essa experiência pode levar a danos psicológicos marcantes à longo prazo.

Apesar das centenas de estudos sobre a psicologia da objetificação sexual, uma evidência metodológica convincente do processo descrito por Fredrickson e Roberts esteve em falta até o dia de hoje.

Acreditamos que nosso estudo, conduzido em conjunto com nossos colegas nos Estados Unidos, é o primeiro a demonstrar que quando mulheres são expostas à experiências de objetificação sexual sobre elas em seu cotidiano, elas começam a se tornar cada vez mais preocupadas com sua aparência física e tendem a colocar ao menos parte de seu valor nela.

Isso, em turno, leva ao aumento de emoções negativas como ansiedade, raiva, embaraço e vergonha.

Nossa pesquisa

Pedimos a um total de 268 mulheres com idades entre 18 e 46 anos em Melbourne e St Louis que instalassem um aplicativo em seus celulares.

Várias vezes durante o dia, o aplicativo as pedia para ranquear e descrever suas emoções, o quão preocupadas elas estavam naquele momento com sua aparência física (uma medida de auto-objetificação), e se elas tinham passado nos últimos momentos por alguma experiência contendo comportamento objetificante de terceiros — ou visto isso acontecendo com outras mulheres.

Usar os celulares para rastrear as experiências cotidianas com objetificação sexual dessas mulheres apresenta várias vantagens sobre os métodos usados em todas as pesquisas anteriores sobre o assunto.

Primeiramente, podemos ter certeza que estamos capturando exemplos de objetificação sexual “do mundo real”, ao invés de cenários artificiais que podem não representar a vida fora do ambiente de laboratório.

Segundo, ao invés de dependermos de memórias talvez não confiáveis de eventos passados ou sentimentos descritos em questionários ou diários, ao usar os telefones celulares pudemos reunir relatos sobre experiências de objetificação mais confiáveis e em “tempo real”.

Finalmente, repetidamente analisando as experiências diárias das mulheres nos permitiu observar os processos psicológicos desencadeados pelas experiências de objetificação sexual vividas.

O que descobrimos

Mais de 65% das mulheres em nosso estudo foram alvos pessoas de comportamento sexualmente objetificante pelo menos uma vez durante o período de monitoramento. Isso pode ter incluído ter sido encarada por muito tempo por um homem, assediada, ouvido assobios na rua, entre outros.

Nossas descobertas foram consistentes com a teoria de Fredrickson e Roberts: as mulheres relataram ter se sentido preocupadas com sua aparência física por volta de 40% mais quando reportaram terem sofrido de objetificação sexual recente se comparado com quando não sofreram.

Importantemente, esses picos momentâneos em auto-objetificação previram aumentos subsequentes nas emoções negativas dessas mulheres, principalmente sentimentos de vergonha ou embaraço.

Apesar de que esse aumentos foram pequenos, eles são significativos e parecem ter sido indiretamente causados por exposição à comportamentos de objetificação sexual.

Mulheres podem pensar sobre sua aparência independentemente de terem experimentado objetificação sexual. Interessantemente, nesses casos, descobrimos que quando as mulheres se auto-objetificaram, elas algumas vezes relataram se sentirem um pouco mais felizes e confiantes.

Então quando mulheres pensam sobre elas mesmas e sua aparência, elas podem sentir tanto emoções positivas quanto negativas. Mas a auto-objetificação que surge como resultado de ter sido objetificada por outra pessoa parece ter impactos exclusivamente negativos sobre as emoções das mulheres.

É importante notar que em nossos resultados, experienciar objetificação sexual não é o que por si só levou ao aumento de emoções negativas nas mulheres. Ao invés disso, os efeitos danosos da objetificação sexual nas emoções foram indiretos, e ocorreram como resultado de as mulheres passarem a objetificar elas mesmas.

Vendo outras mulheres objetificadas

Nossas participantes relataram ter testemunhado a objetificação de outras mulheres em média quatro vezes durante a uma semana do estudo.

Testemunhar a objetificação de outras mulheres foi também seguido por um significativo, apesar de menor, aumento da auto-objetificação, com efeitos negativos similares para seu bem estar emocional.

Assim como pessoas que não fumam podem ser colocados em risco pelo fumo passivo, a exposição de segunda mão à objetificação sexual pode reduzir o bem estar emocional e psicológico das mulheres, mesmo quando elas mesmas são raramente ou nunca objetificadas sexualmente elas mesmas.

No final, nosso estudo metodologicamente confirma as pesquisas anteriores mostrando além de tudo, que a objetificação sexual de mulheres permanece muito comum.

Mas importantemente, nós mostramos que experiências de objetificação cotidianas não são tão inócuas como podem parecer. Apesar de sutis, os efeitos emocionais negativos indiretos de tratamento objetificante podem se acumular com o tempo e resultar em danos psicológicos mais sérios para muitas mulheres.

Texto traduzido livremente por mim. ❤ Nina Cenni
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Ninka
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Cursando PhD em Física. Lutando contra a exploração e violência sexual evidente e inerente à pornografia, prostituição e tráfico humano nas horas vagas.