Por que eu tenho mais respeito por mim mesma depois de parar com a pornografia

Ninka
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6 min readMay 8, 2022

“Eu respeito mais meu corpo, e eu visto o que eu estiver com vontade de vestir sem me sentir como se eu estivesse em uma exibição. Isso é mais libertador do que qualquer pornografia que eu já tenha assistido.”

As consequências do meu “término”

Já faz mais de um ano desde que cortei a pornografia completamente da minha vida, e os resultados me surpreenderam.

Eu tomei a decisão por causa dos sofridos traumas de ter estado em um relacionamento com alguém viciado em pornografia, e por causa da minha própria experiência de sobriedade sobre a questão.

Quando eu ando pelas ruas, eu agora vejo pessoas como pessoas. Uma afirmação tão simples, mas deixe-me explicar.

Eu não vejo mais partes do corpo que eu julgo sobre seu nível de atratividade sexual. Isso costumava saltar aos meus olhos, especialmente diretamente depois de ter assistido a um vídeo pornô. Eu vejo pessoas como seres humanos, sem objetificá-las; mas, a maior diferença é que eu tenho agora mais respeito por mim mesma.

Eu respeito mais meu corpo, e eu visto o que eu estiver com vontade de vestir sem me sentir como se eu estivesse em uma exibição. Isso é mais libertador do que qualquer pornografia que eu já tenha assistido.

Eu tive uma vida com uma quantidade extrema de desafios bastante brutais, mas nada me quebrou como mulher tanto quanto ser a parceira de alguém obcecado por pornografia. Nada.

As fantasias do pornô afetam os relacionamentos do mundo real

Então, como a pornografia se reflete nos relacionamentos, especialmente quando a maioria de nós se sente como se merecêssemos algo para “apimentar” a relação?

Eu vou usar o meu relacionamento como exemplo. A magia nele era real, e ela voltava mais forte quanto mais tempo eu passava sem assistir os vídeos. A minha sensibilidade aos estímulos eram aguçadas. Por que eu iria querer que isso terminasse? A autenticidade de olhar e amar o corpo do meu parceiro e sentir aquela magia única é o ponto da nossa conexão. Pessoalmente, eu quero manter isso vivo nos meus relacionamentos.

Mas a pornografia pode dessensibilizar os usuários ao reconectar os caminhos e conexões no nosso cérebro e nos dar uma nova referência do que achamos excitante ou atraente, mesmo que a nova referência seja completamente irreal. Referências do que nós desejamos, quem nós desejamos, e do nível de controle na relação. A ideia de ter total controle sobre nossa experiência sexual cruza diretamente com o o fato de estarmos nos relacionando com outras pessoas, pessoas reais.

Considerando que o uso frequente de pornografia pode tornar nossos parceiros românticos menos atraentes para nós, como já foi mostrado em tantos estudos, como é que essa pode ser uma atividade de fortalecimento da relação entre os parceiros?

Tudo isso é você quem decide. É sua escolha, mas eu espero que você não aprenda através de um trauma severo como foi comigo.

Assistir não vale a pena

Muitas pessoas se sentem como se tivessem direito à pornografia, mesmo que isso machuque a outra pessoa e contribua para gerar comportamentos agressivos. Os usuários podem se sentir no direito de pegar qualquer pessoa digital e fazer “sexo” com ela, mas de onde essa noção de direito vem e o que ela alimenta?

O que é realmente legal em um relacionamento é a autenticidade. Olhar e ver por todas as facetas como a outra pessoa brilha pra você, ao invés de compará-las com com o que viu no último “parceiro” ou “parceira” nas telas, seja isso conscientemente ou não: é isso que é um verdadeiro e harmônico relacionamento. Amar é manter a magia viva e ser dono da sua história e sua realidade, aceitarmos como somos, e não nos perdemos na fantasia da pornografia que rouba de nós nossa visão, nossa integridade, nossa autoestima e nossa sexualidade autêntica.

Me acompanhem nesse caminho, porque eu aprendi que caminhar assim é muito melhor do que qualquer pornografia.

–T.

Porque isso importa

Você sabia que usuário médio da internet passa 40% do tempo que passa acordado online? Isso é bastante tempo de internet.

Então, com isso em mente, considerando que estimadamente 91.5% dos homens e 60.2% das mulheres consumem pornografia, vamos examinar como isso pode estar afetando os consumidores.[2]

Décadas de estudo de instituições respeitadas demonstraram que a pornografia é danosa para os usuários

Quando falamos do tópico “pornografia”, uma das maiores dúvidas que temos é se ela realmente pode causar vício. A resposta direta e curta é sim — absolutamente sim. Enquanto é importante lembrarmos que a maior parte dos consumidores de pornografia — mesmo alguns que descobrem ser muito difícil largá-la — não se qualificam como “viciados” de uma forma clinicamente diagnosticável, muitos especialistas em vício concordam que o vício em pornografia é, de fato, muito real. [3,4,5,6]

Além disso, de acordo com um estudo de 2016, os pesquisadores descobriram que 46.9% dos que responderam reportaram que, com o tempo, começaram a assistir vídeos pornográficos que anteriormente os desinteressavam ou até mesmo os enojaram. [7]

Considere também que uma quantidade significativa de estudos revisados por pares encontraram uma ligação entre o consumo de pornografia e questões de saúde mental como depressão [8], ansiedade [9], solidão [10], uma menor satisfação com a vida [11], e uma pior autoestima e pior saúde mental em geral [12].

Ainda, dúzias de estudos repetidamente mostraram que os consumidores de pornografia mostram uma menor qualidade e uma satisfação menor com seus relacionamentos.[13,14,15] Eles tendem ater uma comunicação mais negativa com seus parceiros, se sentem menos dedicados à relação, têm mais dificuldade de ajustar rotinas em seus relacionamentos, são menos satisfeitos sexualmente, e cometem mais infidelidade. [16]

A pornografia não é um “entretenimento inofensivo”. A pornografia não é um assunto “pessoal” que não diz respeito a mais ninguém. Décadas de pesquisas e milhares e mais milhares de estudos indicam que ela pode gerar consequências negativas sérias não só a indivíduos, mas a relacionamentos e à sociedade como um todo.

Felizmente, existe um caminho de volta.


Traduzido livremente por mim ❤ Nina Cenni.
Referências:

1 ataReportal. (2020). Digital 2020 global digital overview. ( №1). Retrieved from https://www.slideshare.net/DataReportal/digital-2020-global-digital-overview-january-2020-v01-226017535

2Solano, I., Eaton, N. R., & O’Leary, K. D. (2020). Pornography Consumption, Modality and Function in a Large Internet Sample. Journal of sex research, 57(1), 92–103. https://doi.org/10.1080/00224499.2018.1532488

3Willoughby, B. J., Young-Petersen, B., & Leonhardt, N. D. (2018). Exploring Trajectories of Pornography Use Through Adolescence and Emerging Adulthood. Journal of sex research, 55(3), 297–309. https://doi.org/10.1080/00224499.2017.1368977

4Love, T., Laier, C., Brand, M., Hatch, L., & Hajela, R. (2015). Neuroscience of Internet Pornography Addiction: A Review and Update. Behavioral sciences (Basel, Switzerland), 5(3), 388–433. https://doi.org/10.3390/bs5030388

5Stark R., Klucken T. (2017) Neuroscientific Approaches to (Online) Pornography Addiction. In: Montag C., Reuter M. (eds) Internet Addiction. Studies in Neuroscience, Psychology and Behavioral Economics. Springer, Cham. https://doi.org/10.1007/978-3-319-46276-9_7

6De Sousa, A., & Lodha, P. (2017). Neurobiology of Pornography Addiction — A clinical review. Telangana Journal of Psychiatry, 3(2), 66–70. doi:10.18231/2455–8559.2017.0016

7Wéry, A., & Billieux, J. (2016). Online sexual activities: An exploratory study of problematic and non-problematic usage patterns in a sample of men. Computers in Human Behavior, 56, 257–266. doi: https://doi.org/10.1016/j.chb.2015.11.046

8Harper, C., & Hodgins, D. C. (2016). Examining Correlates of Problematic Internet Pornography Use Among University Students. Journal of behavioral addictions, 5(2), 179–191. https://doi.org/10.1556/2006.5.2016.022

9Wordecha, M., Wilk, M., Kowalewska, E., Skorko, M., Łapiński, A., & Gola, M. (2018). ‘Pornographic binges’ as a key characteristic of males seeking treatment for compulsive sexual behaviors: Qualitative and quantitative 10-week-long diary assessment. Journal of behavioral addictions, 7(2), 433–444. https://doi.org/10.1556/2006.7.2018.33

10Butler, M. H., Pereyra, S. A., Draper, T. W., Leonhardt, N. D., & Skinner, K. B. (2018). Pornography Use and Loneliness: A Bidirectional Recursive Model and Pilot Investigation. Journal of sex & marital therapy, 44(2), 127–137. https://doi.org/10.1080/0092623X.2017.1321601

11Willoughby, B. J., Young-Petersen, B., & Leonhardt, N. D. (2018). Exploring trajectories of pornography use through adolescence and emerging adulthood.55(3), 297–309. doi:10.1080/00224499.2017.1368977

12Koletić G. (2017). Longitudinal associations between the use of sexually explicit material and adolescents’ attitudes and behaviors: A narrative review of studies. Journal of adolescence, 57, 119–133. https://doi.org/10.1016/j.adolescence.2017.04.006

13Wright, P. J., Tokunaga, R. S., Kraus, A., & Klann, E. (2017). Pornography consumption and satisfaction: A meta-analysis. Human Communication Research, 43(3), 315–343. doi: https://doi.org/10.1111/hcre.12108

14Perry S. L. (2020). Pornography and Relationship Quality: Establishing the Dominant Pattern by Examining Pornography Use and 31 Measures of Relationship Quality in 30 National Surveys. Archives of sexual behavior, 49(4), 1199–1213. https://doi.org/10.1007/s10508-019-01616-7

15Perry, S. (2017). Does Viewing Pornography Reduce Marital Quality Over Time? Evidence From Longitudinal Data. Archives Of Sexual Behavior, 46(2), 549–559. Doi: 10.1007/S10508–016–0770-Y

16Maddox, A. M., Rhoades, G. K., & Markman, H. J. (2011). Viewing sexually-explicit materials alone or together: associations with relationship quality. Archives of sexual behavior, 40(2), 441–448. https://doi.org/10.1007/s10508-009-9585-4

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Ninka
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Cursando PhD em Física. Lutando contra a exploração e violência sexual evidente e inerente à pornografia, prostituição e tráfico humano nas horas vagas.