E o Oscar da falta de noção vai para Mário Frias

Francine A. Galbier
Vértice
Published in
2 min readAug 20, 2020
Ilustração: Eric Balbinus

Mário Frias não cansa de ser protagonista em cenas vexaminosas: é seu ofício.

Ele está agora aflito e preocupadíssimo. Não com programas, editais ou formulação de políticas públicas para fomentar a cidadania através da cultura, não! Isso é secundário para Frias. Seu papel como Secretário da Cultura vai além dessas questões. Existe algo que o atormenta bem mais do que o abandono cultural que paira sobre o Brasil: o Oscar 2021.

Na semana passada teve a pachorra de propor uma alteração no termo de cooperação com a Academia Brasileira de Cinema (ABC). Queria que o Governo Federal (!) tivesse metade dos votos da comissão que elege o filme que representará o Brasil na disputa da indústria cinematográfica norte-americana.

É isso que você entendeu. Frias quer o Estado interferindo até mesmo na escolha do filme que será candidato a uma vaga na categoria de Melhor Filme Internacional da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas dos Estados Unidos. Acontece que a ABC possui autonomia na escolha e assim continuará sendo.

A primeira tentativa de interferência de Frias foi recusada, mas ele não desiste. Jorge Pellegrino, presidente da ABC, informou publicamente na segunda-feira (17) que Frias segue tentando influenciar na escolha da película brasileira candidata ao Oscar 2021.

Frias ligou para Pellegrino. Disse "que não poderia se repetir o que ocorreu neste ano", em referência ao documentário Democracia em Vertigem, de Petra Costa, um original da Netflix. E também disse que o filme escolhido neste ano "deveria estar alinhado com os objetivos do Governo Federal". É a ignorância elevada a potência fracionária cúbica!

Em primeiro lugar, Democracia em Vertigem sequer foi indicação da ABC e sim da própria Netflix, que o produziu. O candidato da ABC no último Oscar foi A Vida Invisível, de Karim Ainouz. É claro que Frias não saberia, ele não se importa com o que está acontecendo no cinema nacional. Ele quer lutar na cruzada ideológica contra as artes.

Em segundo lugar, essa história de que o filme que representará o Brasil no Oscar "deveria estar alinhado com os objetivos do Governo Federal" é surrealismo, mas não deve passar batido porque se trata de mais um degrau na escalada do controle autoritário que o bolsonarismo pretende exercer sobre a arte, cultura, educação e por aí vai.

Veja bem: foi preciso que chegasse uma carta de Hollywood chancelando que a ABC, e somente a ABC, será responsável por indicar filmes brasileiros a vagas em categorias do Oscar e que o governo brasileiro, portanto, não tem que se meter no assunto. Aplausos.

Talvez se Frias tivesse se debruçado sobre os ensinamentos de Stanislavski poderia, quem sabe, ter aflorado na atuação. Mas sendo medíocre nesta arte, restou a ele apenas o papel que lhe cabe: um militante bolsonarista digno somente da mais alta e cortante vaia.

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