Entenda quem é Steve Bannon e qual sua relação com o bolsonarismo

André Valeriano
Vértice
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6 min readAug 22, 2020

Ex-estrategista de campanha de Donald Trump e ligado ao clã Bolsonaro, Bannon foi preso na última quinta-feira (20) por fraude e conspiração

Articulista ultraconservador, ex-estrategista e conselheiro de campanha de Donald Trump, Steve Bannon foi preso nesta quinta-feira (20) nos Estados Unidos acusado de desviar dinheiro de uma campanha de apoio à construção do muro entre os Estados Unidos e o México. Porém, Bannon foi liberado após pagar fiança no valor de US$ 5 milhões.

Além de ter participado da campanha vitoriosa de Trump à Presidência em 2016, Bannon se aproximou de líderes mais conservadores e de extrema-direita ao redor do mundo, incluindo o Brasil onde teve contato com Jair Bolsonaro e seus filhos, atuando como guru ideológico. O americano é também o criador do grupo The Movement (O movimento, em tradução livre), que tem representantes em todo o mundo. Porém, Bannon tem um passado repleto de controvérsias, envolvido com grupos extremistas, propagação de fake news e vazamento de dados de usuários na internet.

A relação entre Bannon e Trump

Antes de participar da campanha presidencial de Donald Trump à Casa Branca, Bannon era responsável pelo site Breibart News, um portal de extrema-direita que tinha conteúdos racistas, antissemitas, além de teorias conspiratórias como marxismo cultural e difusão de fake news sobre adversários políticos.

O site ajudou a construir o que foi chamado de alt-right (direita alternativa em tradução livre), grupo nacionalista e supremacista branco contrário aos direitos civis de negros, mulheres, gays e de outros grupos minoritários.

Conhecido de Trump desde 2010, Bannon foi convidado a participar de sua campanha como estrategista chefe e foi tido como uma de suas peças chaves para a vitória do republicano contra a adversária democrata Hillary Clinton.

Com a vitória de Trump, Bannon ganhou o cargo de estrategista chefe do governo, mas devido a conflitos entre o ideólogo com assessores do alto escalão da Casa Branca, além de ter ligações com grupos da alt-right que organizaram os atos supremacistas de Charlottesville em 2017, Bannon durou menos de um ano no cargo sendo afastado do governo Trump.

Donald Trump e Steve Bannon, em foto de janeiro de 2017 — Foto: Mandel Ngan/AFP/Arquivo

Após a prisão de Bannon, Trump deu declarações sobre o caso procurando se distanciar do ex-funcionário e estrategista de sua campanha vitoriosa de 2016.

“Eu me sinto muito mal. Eu não tenho lidado com Bannon há bastante tempo, como a maioria das pessoas nesta sala sabe”, disse Trump referindo-se à demissão de Bannon do governo em 2017.

O escândalo da Cambridge Analytica

Outro caso de envolvimento direto de Bannon com repercussões ainda hoje é o escândalo de vazamento de dados de usuários do Facebook pela empresa de marketing político Cambridge Analytica.

A Cambridge Analytica, na época dirigida por Bannon e por outros colaboradores, obtiveram informações vazadas de cerca de 50 milhões de americanos por meio de testes de personalidade na plataforma do Facebook.

Com base nessas informações, a empresa pode usá-las para traçar perfis psicológicos detalhados de eleitores americanos e assim bolar estratégias de propaganda política para a campanha de Donald Trump e direcioná-las a essas pessoas, como teses conspiratórias e falsas contra adversários de Trump, além de dar poder aos discursos antiestablishment.

A entrada do escritório da Cambridge Analytica em Londres. Foto: Getty Image

Tudo isso foi distribuído no Facebook em forma de anúncios patrocinados no feed de notícias dos usuários da rede.

O caso atingiu em cheio o Facebook já que o vazamento teria ocorrido por conta de uma política flexível da rede social com relação à entrega de informações de perfis a aplicativos de terceiros na plataforma. Por conta do episódio, o CEO da empresa, Mark Zuckerberg, foi convocado pelo congresso americano para prestar esclarecimentos sobre o vazamento de dados de americanos na rede social.

Bannon e os Bolsonaros

Em 2018, o deputado federal Eduardo Bolsonaro, filho do agora presidente Jair Bolsonaro, teve seu primeiro encontro com Steve Bannon em agosto daquele ano, logo no início da campanha presidencial. Eduardo fez questão de elogiar o ex-estrategista e publicou uma foto do encontro em suas redes sociais.

Já o guru da extrema-direita mundial fazia questão de fazer vários elogios ao então candidato a presidente Jair Bolsonaro, descrevendo-o como um “líder”, “brilhante”, além de “muito parecido com Trump”, conforme declarou em entrevista à BBC News Brasil naquele ano.

Bannon, no entanto, negou qualquer participação sua na campanha de Bolsonaro à Presidência, mas isso não impediu que houvessem outros encontros entre o ideólogo e os Bolsonaros.

Em novembro de 2018, após a vitória de Jair Bolsonaro, Eduardo se encontrou novamente com Bannon em seu jantar de aniversário nos Estados Unidos, referindo-se ao americano de “pessoa ícone no combate ao marxismo cultural”.

A relação entre Bannon e Eduardo Bolsonaro se solidificou de tal forma que, em fevereiro de 2019, o deputado federal foi escolhido para liderar o movimento de Bannon na América Latina.

Com a aproximação, em março daquele ano, Bannon se encontrou com o presidente Jair Bolsonaro em um evento na embaixada do Brasil em Washington, onde estavam presentes o ex-ministro Sérgio Moro, o chanceler Ernesto Araújo, além do ideólogo e guru do bolsonarismo Olavo de Carvalho.

Steve Bannon ao lado (esquerdo) de Jair Bolsonaro em jantar em Washington — Foto: Alan Santos/Presidência da República

Eduardo Bolsonaro, no entanto, não se pronunciou até o fechamento desta reportagem sobre a prisão de Bannon, líder do The Movement, grupo do qual o deputado federal faz parte.

Além de Eduardo Bolsonaro, o chanceler Ernesto Araújo e o assessor especial da Presidência para Assuntos Internacionais, Filipe Martins, possuem uma interlocução direta com o ex-estrategista de Trump. Tanto Ernesto Araújo quanto Felipe Martins são discípulos do ideólogo da extrema-direita brasileira Olavo de Carvalho.

Olavo inclusive, já se encontrou com Bannon em sua residência em Richmond, na Virgínia. Bannon chegou até a bancar a exibição de um documentário sobre Olavo no hotel Trump International.

Olavo de Carvalho (esquerda) e Steve Bannon (direita) segurando um livro do ideólogo brasileiro em sua residência em Richmond, Virgínia, Estados Unidos. Foto: Reprodução/Instagram.

Com pensamentos e atuações semelhantes, Olavo ajudou a popularizar no Brasil teses conspiratórias de Bannon como o “marxismo cultural” e os discursos antiestablishment. Do mesmo jeito que o ex-estrategista, o guru do bolsonarismo lançou seu próprio site de notícias no fim do ano passado, com linha governista e com largo histórico de publicações de notícias falsas, sobretudo no período da pandemia de covid-19.

Olavo, inclusive, chegou a fazer diversos elogios ao americano, chamando-o de “conservador interessantíssimo” e comemorando sua aproximação com Eduardo Bolsonaro.

Tweet de Olavo elogiando Steve Bannon. Foto: Reprodução/Twitter.
Outros tweets onde Olavo mostra admiração por Bannon. Foto: Reprodução/Twitter.

Sobre a prisão de Bannon, Olavo preferiu manter distância ao dizer que não possui não nada a ver com Bannon, ironizando quem o associava ao ideólogo americano.

Olavo ironizando quem o associava a Steve Bannon. Foto: Reprodução/Facebook

Mesmo com o caso de prisão, dificilmente Bannon deixará de ter influência ideológica no governo Bolsonaro devido a notória rede de contatos que o americano possui dentro do Planalto. O governo possui entre seus membros pessoas com contato direto ao americano, sobretudo o filho do presidente brasileiro que serve de porta-voz do ideólogo, principalmente na área de política externa, onde fica o núcleo duro da ala olavista, ligada diretamente a Bannon.

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André Valeriano
Vértice
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Jornalista, palmeirense, sonhador, defensor da liberdade e careta nas horas vagas.