Distopia ou realidade?

Amanda Santos
Reflexões Subversivas
3 min readAug 23, 2017
Imagem do filme Blade Runner

BLADE RUNNER. Direção: Ridley Scott; Estados Unidos, 1982, 117 minutos.

A primeira impressão que se tem do filme Blade Runner, produzido em 1982, nos Estados Unidos, é que será apenas mais um filme distópico. Logo no começo, é dito que robôs (Nexus 6, ou replicantes), mais fortes e ágeis que o ser humano, foram criados com o intuito de servir e eram utilizados como escravos na colonização e exploração de outros planetas. Tais robôs são ditos como sendo mais humanos que os próprios humanos — contrapondo-se a essa suposta humanidade, eles só têm a capacidade de viver por 4 anos. Os blade runner seriam policiais que deveriam identificar os Nexus 6, que haviam se rebelado e vindo para a Terra procurando obter uma longevidade maior, e executá-los.
O personagem principal é Rick Deckard, blade runner que acaba se envolvendo com Rachael, uma replicante, durante os acontecimentos mostrados — é importante ressaltar que ela não sabia que não era humana, uma vez que os criadores dos robôs lhes davam memórias de outras pessoas, o que os fazia acreditar que eles realmente haviam vivido aquilo. É interessante que, logo na primeira cena, os olhos do personagem refletem a cidade “evoluída” em que se encontra, o que desumaniza o personagem, uma vez que os olhos são considerados as janelas da alma (que alma seria essa, que reflete uma cidade caótica?).
Apesar de o ano ser 2019 e inúmeras descobertas científicas e tecnológicas terem sido feitas, o mundo está em caos e inúmeros problemas sociais, inclusive de desigualdade e exploração, ainda persistem. O fato de os Nexus 6 serem escravizados, apesar de serem considerados mais humanos que os próprios humanos, mostra bem essa desumanização da sociedade e é muito fácil projetar no filme um possível futuro da sociedade capitalista em que vivemos.
O enredo é extremamente bem trabalhado e pode ser facilmente comparado a outras obras que tratam de futuros distópicos. O livro Neuromancer, de William Gibson, mostra bem essa imagem de uma sociedade que, apesar de desenvolvida tecnologicamente, está em colapso. O filme e o livro são muito semelhantes ao mostrar os problemas gerados pela desigualdade social, ao mesmo tempo que o mundo possui coisas fantásticas e tecnologias incríveis, poucas pessoas têm acesso a elas e a marginalidade está sempre presente. Não há ordem em uma sociedade movida pelo dinheiro, apenas a ordem do capital. As pessoas, assim como o filme mostra, são desumanizadas.
Algo curioso é que os androides rebelam-se ao exigir direito a mais tempo de vida e recusarem-se a serem escravizados, enquanto os próprios humanos, que possuem um tempo considerável, gastam a maior parte desse tempo condicionados a trabalhar em prol da manutenção de um sistema que não os favorece.
A obra também pode ser relacionada com o livro Fundação, escrito por Isaac Asimov. No livro, apesar de a tecnologia não possuir tanto destaque, é bem perceptível a questão do sistema social que entra em colapso, uma vez que o personagem principal, Hari Seldon, prevê a destruição do modelo de Estado vigente por meio da psico-história (uma ciência criada por ele que é capaz de prever o futuro da humanidade). No decorrer do livro, percebe-se muito fortemente que o poder do comércio é maior que o poder do Estado, e que nenhum dos dois apresenta soluções para os problemas sociais.

O filme é um pouco longo, o que torna a história um pouco cansativa, mas é sensacional. Além de ser extremamente atual, o final gera dúvida, uma vez que um dos replicantes que fugiram não é apresentado durante o filme e, na última cena, Rick encontra um origami no formato de um unicórnio (animal recorrente em seus sonhos). Será que, afinal, Rick também seria um replicante? Não há resposta para essa pergunta, mas é inegável que a obra traz inúmeras reflexões não apenas sobre o futuro da sociedade, mas também sobre seu presente.

Escrito em 2016 para a disciplina de Comunicação e Novas Tecnologias

--

--