Sassá- Humana — Barda

Carlos Silva
Regra da Casa
Published in
7 min readJan 16, 2018

Sassá, a criança!

Eu venho de uma família antiga. É o mais velho clã que aprendeu a refinar a magia.
Claro que outros antes, aprenderam a dominá-la, mas nós…
Nós a transformamos em arte!

Subvertemos a trama arcana para o uso prático e moderno que compõe o dia-a-dia de todos os seres humanos.

Modificamos os estilos de vida, aproximamos as pessoas, facilitamos as coisas, tornamos tudo mais rápido e sim… Mudamos a vida de todo mundo.

Daqueles que podiam pagar, é claro.

A SpellCorp foi a primeira e maior fabricante de itens mágicos do mundo.

Meu clã ganhou rios e rios de dinheiro e estabeleceu-se em uma mansão flutuante no bairro mais chique e afastado da capital.

A Mansão Columbia era uma fortaleza luxuosa com quartos infinitos, jardins grandiosos, salas cheias de segredos e cofres escondidos.

Ela foi construída pelo meu avô e ele um mago meio excêntrico.

Além da casa, ele construiu uma torre para si, a torre do mago. Ele dizia que a torre era tão alta que lá no topo era sempre de noite e dava para ver outros mundos além do nosso. Ele enxergava outras realidades e universos. Ele vivia bebendo e disse que ia me levar mas era muito perigoso chegar lá em cima.

Uma vez ele disse que se transformou num picles, matou vários ratos e um dos deuses que ele viu lá em cima era uma cara gigante que dizia “SHOW ME WHAT YOU GOT”!

(referencia : https://www.youtube.com/watch?v=m1fZ7Ap6ebs)

Além do meu avô, tinha meu pai e minha mãe. Eles comandavam a SpellCorp, vivam passando nas fábricas e fazendo reuniões. Quando eu era criança eles não me levavam para as fábricas e eu ficava em casa tocando Alaúde com OverDrive.

Isso eu posso dizer que é uma patente totalmente minha que eu escondi na gaveta, eu ainda não pensei num nome pra ele, mesmo depois de todos esse anos.

Enfim, eu aprendi a tocar com um Halfling engraçado, o nome dele era Hendrix e ele passou a morar lá em casa. Ele passava metade do dia me ajudando com o alaúde e depois passava o resto do tempo fumando seu cachimbo e na sessão de ocultismo da biblioteca.

Ele e meu avô se davam muito bem, bêbados, cantando em voz alta e jogados pelos cantos.
Depois meu avô se mudou para a torre e nunca mais saiu de lá.

Hendrix também me ensinou piano e chamou um amigo dele para me ensinar a percussão. Era um meio-orc pequeno e bigodudo chamado Bonzo. Parece que eles tiveram uma banda juntos mas o vocalista da banda morreu afogado no próprio vômito.

Quando paravam em casa, meus pais gostavam de me ouvir tocar, quando eu inventei o overdrive então, eles adoraram. Quiseram comprar minha patente a todo custo, mas eu não deixei. Essa patente era só minha.

Sassá, a Jovem!

Fiquei mais velha e parei de tocar.

Passei a acompanhar meus pais nas fábricas e reuniões do conselho, não tinha mais tempo pra música nenhuma. Afinal eu seria a próxima presidente da SpellCorp.

Hendrix e Bonzo foram embora, arrumaram dois gnomos e formaram outra banda.

Nunca mais os vi.

As fábricas ficavam longe da capital, em regiões não-humanas. Algumas nas montanhas, outras nas planícies e uma ainda ficava no meio do oceano. Eram construídas em locais de poder, de onde emanava magia bruta. Os elfos canalizavam essa magia através de alguns rituais, depois alguns anões trabalhavam dia e noite na fabricação de itens mágicos.

Meus pais diziam que era da natureza anã trabalhar tanto assim e que tudo estava sob controle, pois todos recebiam ouro e benefícios. Olhando de perto, os anões não pareciam muito felizes não.

As reuniões do conselho me entediavam de uma maneira que não conseguia explicar. Ver aquelas pessoas sentadas em luxuosas salas de reunião, por horas, falando em números, me dava um sono infinito e me fazia flutuar em pensamentos intermináveis. Quase sempre me pegava pensando em qual parte do mundo Hendrix, Bonzo e os gnomos estariam tocando agora.

Numa dessas, o conselho da SpellCorp trouxe um representante dos anões. Ele era careca e não tinha barba, assim como todos os anões de fábrica. As barbas longas já causaram muitos acidentes e foram proibidas aos trabalhadores.

Enfim, este anão estava lá e disse que muitos de seus companheiros reclamavam por melhores salários e uma jornada de trabalho de menos horas. Os anões estavam cansados e a qualidade de produção estava caindo cada vez mais.

Minha mãe se mostrou legitimamente preocupada enquanto meu pai mal prestava atenção no anão. Ele e um meio-elfo ao seu lado falavam baixo entre si e eventualmente olhavam para mim.

Quando o anão terminou de falar, minha mãe se levantou e disse a ele que cuidaria do caso pessoalmente. Naquele dia, meus pais dispensaram o conselho e ficamos só nós 3 na sala mais aquele meio-elfo estranho.

O nome dele era difícil de dizer, era em élfico e eu resolvi chamá-lo de Diogo porque foi a primeira coisa que me veio na cabeça. Todos rimos.

Meu pai disse que ele seria o novo Consigliere da SpellCorp e o ajudaria nas finanças e direcionamentos gerais da companhia. Diogo vinha de uma tradicional família de altos-elfos de um reino longínquo, aprendeu a fazer os rituais mágicos de maneira mais eficiente e menos custosa.

Assim, Diogo entrou para a família.

Ele era velho mas parecia que tinhamos a mesma idade. Tinha a pele amadeirada e cabelos negros, seus olhos eram verdes-vivo e ele gostava de vestir-se em tons amarelos, o que deixava sua pele ainda mais bonita.

Ele era extremamente interessante. Conversar com ele me fazia rir, me divertia, me entretinha, me fazia querer ser uma pessoa melhor só por estar perto.

Quando percebi isso, entendi uma das milhares definições de amor.
O amor é simples, menos romântico e mais visceral. O amor só faz você querer ser melhor para o outro, ser mais que suficiente. O amor faz você se superar. O amor faz você ceder.

Eu até voltei a tocar. Fiz umas músicas românticas que ninguém nunca ouviu e escrevi algumas cartas de amor que ninguém nunca leu. Foi melhor assim no fim.

Nosso primeiro beijo foi na sala de reunião do conselho. Eu disse que tinha alguns assuntos a tratar com ele, esperei com que todos saíssem e enfim, o resto também aconteceu ali.

Sassa, a esposa!

Eu tinha 23 anos quando nos casamos.
Deixei de frequentar o conselho apesar de ser a próxima herdeira da SpellCorp. Diogo absorveu todas as responsabilidades. Diogo conteve a greve dos anões com punho de ferro apesar dos alertas de minha mãe.

Em casa, Diogo não gostava de ouvir o Alaúde OverDrive, apenas ouvia quando eu tocava piano. Abandonei o Alaúde totalmente e a ideia do OverDrive ficou jogada na sarjeta.

Um belo dia, ouvi Diogo e meu pai brigando em casa.
Eu não entendi o motivo mas depois da briga, meu pai me queria de volta ao conselho mas Diogo disse que ele estava louco e eu acreditei.

Diogo me mantinha por perto o tempo todo e isso me fazia bem. Eu achava que ele me queria a seu lado porque me amava de verdade, no fim percebi que ele tinha algum tipo de receio. Queria saber com quem eu conversava e quais eram os assuntos.

A SpellCorp crescia cada vez mais e não houveram mais greves… por um tempo.

Em uma nova reunião, fomos todos chamados. Meus pais insistiram que eu estivesse presente e eu fui, Diogo permitiu.
Assim, o conselho decidiu que Diogo seria o novo presidente da empresa alegando que minha mãe, a atual presidente, não sabia controlar gastos e nem conter os grevistas, colocando o futuro da SpellCorp em jogo. Diogo convenceu o conselho de que minha mãe era um investimento de risco, assumindo a cadeira.

O novo presidente passou a tomar a maior parte dos lucros para si. As greves aumentaram, os anões abandonaram a SpellCorp fazendo com que ela perdesse muito do que tinha.
Diogo obrigou meus pais a abandonarem a Mansão Columbia e os mandou para uma casa modesta no centro da capital.

Eu não sabia o que fazer, ele era meu marido e sempre que mencionava visitar meus pais era repreeendida.

Porém, a Mansão Columbia tinha muitos segredos e parecia que a casa nos rejeitava.

Coisas estranhas passaram a acontecer, fantasmas e criaturas apareciam nos corredores. Pragas afetaram os jardins e nos mudamos de lá. Abandonamos a Mansão e lá ela está até hoje, como um mausoléu, forrada de segredos escondidos.

Sassá, a barda!

Eu resolvi fugir.

Certa noite coloquei os empregados para dormir com uma canção.
Diogo havia passado a noite com alguma prostituta e não estava em casa.

Caí nas ruas para descobrir que a casa de meus pais estava vazia. Nem sinal deles.

Voltei, coloquei uma adaga no pescoço de Diogo e perguntei o que havia acontecido.

Ele disse que a Mão Negra veio cobrar e a dívida havia sido paga.

Ele não sabia se meus pais estavam mortos ou não.

Diogo chamou os guardas e passei alguns meses nas celas da cidade.

Quando saí só tinha lugar nas ruas e a SpellCorp era um sonho antigo.

Consegui um Alaúde e uns trocados nas ruas. A mão negra tentou me matar algumas vezes e numa dessas um meio-elfo chamado Norman salvou a minha vida e nos tornamos amigos.

Também consegui refúgio na residência de Abakuk, um velho amigo do meu avô que assim como eu, não via aquele velho retardado tinha uns bons anos.
Kalika era uma Tiefling amiga de Abakuk. Eles tinham alguma relação estranha que eu não fiz questão de tentar entender.

O que eu eu sei é que a MÃO NEGRA estava procurando por nós quatro, e agora, juntos. tinhamos uma missão…

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