O Esdrúxulo Mundo do Absurdo

Aristóteles é conhecido como aquele que definiu as características principais que até hoje influenciam como pensamos no Oeste sobre teatro e drama: Primeiramente, propôs uma construção de enredo, enfatizando o efeito que um bom desenvolvimento deste pode ter num público. Segundamente, fala sobre trazer à tona a empatia do público por esse enredo, principalmente para fins morais e de educação intelectual. Em terceiro, aborda uma narrativa que deve ser incorporada, interpretada num espaço e num tempo, demonstrada pelos atores. Desde Oresteia ou Agamenon, de Ésquilo, até Tempest, de Shakespeare, percebem-se essas características, que determinam uma narrativa tradicional.

O teatro do absurdo joga tudo isso no lixo.

Surgindo na Europa após a Segunda Grande Guerra, aproximadamente na metade do século XX, quando se abatia sob a população um grande senso de devastação, incerteza e temor, conceitos como um senso de propósito, ou até mesmo Deus eram questionados. Sob essa descrença surgem diversos autores que buscavam mostrar justamente a frivolidade aparente da condição humana, suas rotinas, padrões e costumes. Nomes como Samuel Beckett na Irlanda, Eugène Ionesco na França, Arthur Adamov da Rússia, ou Fernando Arrabal, espanhol, posteriormente tiveram seus trabalhos agrupados nessa categoria, apesar de seus protestos. Em razão os autores afirmavam que suas obras divergiam grandemente, e que diversos eram os motivos que as separavam. E enquanto suas peças têm cenários e premissas extremamente diversas, todas apresentam o comportamento humano por uma lente de padrões inusitados. Em contraste, podemos voltar a Shakespeare, que em Hamlet tem na hybris do homônimo protagonista a hesitação. Já em Esperando Godot, por exemplo, não se percebe distinções de valor moral entre os protagonistas, aqui o objetivo é sublinhar a indistinção entre valores da condição humana.

Assim, o Teatro do absurdo subverte o próprio fundamento de uma história. Com enredos muitas vezes circulares, como A Cantora Careca, onde os Martin, visitantes, recomeçam a peça como os protagonistas, ou com enredos extremamente expansivos e até personagens que terminam exatamente onde começaram. Ao contrário de uma narrativa como Romeu e Julieta, com progressão linear, de modo a enfatizar a natureza cíclica do sofrimento da existência; jogos de palavras e diálogo que nunca faz sentido em contexto, e muitas vezes sequer dentro da própria oração são também empregados; repetições são usadas a mesmo efeito, e a audiência é largada de lado, não existindo qualquer moral ou lógica interna a se seguir, novamente contrastando com a lição moral de peças como Rei Lear. O que resulta daí é uma tragédia no sentido de um inescapável sofrimento, porém de acordo com Martin Esslin, que cunhou o termo:

“O teatro do absurdo se esforça por expressar o sentido do sem sentido da condição humana, e a inadequação da abordagem racional, através do abandono dos instrumentos racionais e do pensamento discursivo e o realiza através de ‘uma poesia que emerge das imagens concretas e objetificadas do próprio palco.” — ESSLIN, 1961

Não obstante, existe uma certa liberação presente nesse gênero. Ao se desligar de convenções de roteiro cria-se um senso de humor, e para aqueles que conseguem se libertar das amarras da construção de um senso de normalidade e virtude, a quebra com o clássico pode trazer boas gargalhadas mesmo daquilo que outrora seria banal.

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