A importância de Afonsinho para as transferências no futebol

Parrela
Revista Relvado
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3 min readMay 18, 2018

Pouco se fala sobre Afonso Celso Garcia Reis, meia-armador brasileiro, que teve uma carreira de quase 20 anos, entre 1963 e 1981. No seu currículo constam passagens por Botafogo, Vasco da Gama, Santos, Flamengo e América Mineiro.

Enquanto atleta, foi no clube da estrela solitária que alcançou a época de maior sucesso pessoal. No período, ajudou o clube a chegar ao título da Taça Brasil de 1968, o mais importante do seu currículo.

Apesar de conquistar o país dentro de campo e encantar com o futebol elegante, de toques diretos e precisos, muitos consideram que a contribuição mais importante de Afonsinho para o futebol tenha vindo do lado de fora do campo.

O Decreto 53.820/64 foi uma regularização das relações trabalhistas no futebol, para as quais não havia nada determinado a respeito do vínculo empregatício entre jogador e clube. Dentre outras coisas, o regramento criou o instituto jurídico do passe.

A partir do documento, o atleta só poderia trocar de time mediante o pagamento de uma determinada quantia à equipe que detivesse a propriedade de seu passe — mesmo após o fim do contrato vigente. Na prática, o jogador se tornava refém do clube ao qual prestava serviços.

Foi neste contexto que aconteceu algo que mudaria por completo a relação entre empregador e empregado da bola. Em 1971, o Botafogo exigiu que Afonsinho cortasse os cabelos e a barba, visual considerado subversivo.

Vale lembrar que se vivia o auge da Ditadura Militar no Brasil, a repressão era violenta e o meio-campista, além de jogador de futebol, era também membro da classe estudantil, cursando Medicina.

Zagallo, então treinador do Botafogo, chegou a afirmar que Afonsinho era ótimo jogador, mas que era preciso olhar a situação por todos os ângulos. O atleta, então, foi afastado dos treinos e chegou a ser emprestado ao modesto Olaria. Ações tidas como represálias pela rebeldia do jogador em manter o penteado.

Afonsinho entrou na Justiça contra a equipe de General Severiano e, em 1972, se tornou o único jogador brasileiro dono do próprio passe. Após a vitória nos tribunais, juntou-se a Pelé, no Santos, e ouviu do Rei que ele, Afonsinho, era o único homem livre na história do esporte.

O meio-campo de toque refinado, barba e cabelos marcantes, militou sozinho. A história de Afonsinho virou documentário, música e resultou em um direito que depois viria a ser considerado lei, com a Lei do Passe, decretada em 1976 — sem falar em seus desdobramentos (Leis Zico e Pelé).

Apesar disso, essa saga é pouco contada. Muito disso se deve à maneira negligente com a qual o brasileiro lida com a própria História, deixando de cultivar personagens importantes, com raras exceções que acabam por confirmar a regra — como Ademir da Guia, que continua dando palestras e representando o Palmeiras por onde passa.

Reinaldo é, muitas das vezes, deixado de lado pelo Atlético Mineiro. Pouco se fala a respeito da importância de Walter Casagrande (Corinthians), Tostão (Cruzeiro) e Valdomiro (Internacional) fora dos campos.

Atualmente vemos clubes fechando negócios ao final de contrato de um determinado jogador para não perdê-lo por nada ou até mesmo contratando jogadores ‘livres’ no mercado.

Muita coisa aconteceu desde a batalha jurídica de Afonsinho, mas é acertado dizer que os desdobramentos só foram possíveis porque um certo camisa 8 resolveu quebrar o paradigma de que jogador de futebol serve apenas pra jogar bola.

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Parrela
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Me perdoa mas falo de esportes o dia inteiro. Sou aquele cara que a galera esquece de responder. Estragando tudo desde 1994.