Uma alegria cada vez mais distante

Felipe Portes
Revista Relvado
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4 min readMay 11, 2018

De cabeça, Donato abre o placar no Riazor. O relógio marca três minutos do duelo entre Deportivo La Coruña e Espanyol, pela última rodada da Liga Espanhola, em 1999–00. Aos 34, ainda na primeira etapa, o holandês Roy Makaay define o confronto a favor dos mandantes. A torcida na Corunha festeja seu primeiro e único título da Liga.

Dificilmente se ganha um campeonato nacional somando apenas 69 pontos. Mas o Deportivo La Coruña conseguiu essa façanha em 2000. Campeão espanhol cinco anos depois de bater na trave (foi vice em 1993/94 e 1994/95), o time galego se redimiu na hora H.

Em 1994, com Bebeto de protagonista, o Dépor ficou a um gol de comemorar a conquista. Mas o brasileiro se recusou a bater um pênalti decisivo e viu Miroslav Djukic chutar nas mãos do goleiro as chances. Um empate em 0 a 0 permitiu que o Barcelona assumisse a liderança na última rodada.

A ordem do futebol espanhol se alterou bruscamente ao longo daquela década. Em 2000, a força local se provou na Liga dos Campeões, que tinha três representantes nas semifinais. A decisão, entre Real Madrid e Valencia, incendiou a cidade. O Barcelona, que caiu para os valencianos, brigou também pela hegemonia nacional.

Curiosamente, o Real Madrid faturou a Europa e ficou longe na Liga, terminando apenas em quinto lugar. Um retrato da bizarrice que foi vista na disputa. Para se ter uma ideia, o Dépor foi campeão perdendo 11 partidas. O Barça, vice, perdeu 12.

A diferença final entre Dépor e Barça foi de cinco pontos. A margem foi definida na última jornada, quando os catalães apenas empataram com o Celta em casa, desperdiçando a chance de colar no líder. Porém, nem a vitória adiantaria para o time azul e grená.

Treinado por Javier Irureta, o Dépor foi o clube que mais tempo segurou a liderança naquela temporada. Da 12ª rodada em diante, não saiu do primeiro posto. O time foi incomodado, decerto, mas houve grande merecimento e regularidade na arrancada para o título.

Era uma época de muitos ídolos no Riazor. No ano do campeonato, o Deportivo tinha Donato, Djalminha, Mauro Silva, Makaay, Fran, Victor Sánchez, Diego Tristán, Flávio Conceição, Noureddine Naybet, Slaviša Jokanovic. E o entrosamento falou mais alto na arrancada.

No ano seguinte, veio outra glória inesquecível: no centenário do Real Madrid, o Super Dépor fez 2 a 1 e faturou a Copa do Rei dentro do Santiago Bernabéu, a famosa casa dos merengues.

Na sequência, o time cresceu com a chegada de Juan Carlos Valerón e fez bonito na Champions em 2004, chegando até a semifinal. Uma vitória contra o Milan, de virada, foi o ponto alto da campanha.

Contudo, o tempo não foi gentil com o Dépor. As ótimas campanhas na Europa e o perfil competitivo em La Liga ficaram no passado. Aos poucos, as participações pioraram consideravelmente. O terceiro lugar em 2003–04 foi o canto do cisne corunhês.

Depois disso, a briga sempre foi na parte de baixo da tabela, longe de qualquer vaga europeia, seja para a Champions ou para a Copa Uefa/Liga Europa. A perda de força afetou as receitas e a montagem do elenco. Fatores preponderantes na queda de patamar. Abaixo, uma relação com as campanhas de elite da agremiação desde o título em 2000. É de dar dó:

Dados: OGol

Endividado e em declínio, o clube da Galícia bateu no fundo do poço na virada da década de 2010. Em 2011, veio o primeiro descenso. Em 2013, logo após o retorno, ocorreu nova queda. A última campanha, em 2017–18, determinou com antecedência o terceiro rebaixamento na história do Deportivo.

Depois de muito flertar com a segunda divisão, a equipe, atualmente treinada por Clarence Seedorf, foi punida por sua irregularidade. A torcida já vinha respondendo negativamente, com apenas 64% de ocupação no Riazor, dado da temporada 2016–17.

Sem esperanças e constantemente trocando seus treinadores, o Deportivo pode até mirar uma nova promoção em 2019, mas nada indica que o panorama será muito diferente da luta por sobrevivência, tendência desde 2011. Terminar uma Liga acima da 15ª posição tem sido um sonho alto.

Quem viu o esquadrão digno de grandes façanhas e dono de três taças sofre o dobro com o cenário no Riazor. Nem faz tanto tempo assim que o clube foi o melhor da Espanha. A julgar pela terra arrasada, esses 18 anos parecem estar bem mais distantes do que o calendário pode supor.

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Felipe Portes
Revista Relvado

Desenhista. Estudante de Letras-PT. Adepto da autoironia. Também estou em instagram.com/draw.portes