Avatar Projects: os projetos de NFT com maior hype na atualidade

Felipe Ribbe
Felipe Ribbe
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11 min readSep 9, 2021

Há alguns dias iniciei uma série de artigos sobre projetos envolvendo blockchain com o objetivo de mostrar especialmente à comunidade esportiva — profissionais do meio, jornalistas, torcedores — o que está acontecendo ao redor do mundo e o que podemos esperar para o futuro; são tantas possibilidades de geração de novos negócios, muitas delas ainda nem conhecidas, que ouso dizer que o universo cripto talvez seja a maior oportunidade de novas receitas para a indústria esportiva. Porém, como o setor ainda está engatinhando, naturalmente também devemos olhar para o que está sendo feito fora do esporte para que assim possamos nos inspirar e adaptar para nossa realidade.

No primeiro artigo da série escrevi sobre a diferença entre NFTs e Fan Tokens. Neste segundo, vou me ater aos NFTs e comentar sobre os Avatar Projects (ou Profile Picture Projects), sem dúvida os que possuem o maior hype na atualidade.

O que são os Avatar Projects?

Apesar de serem um dos grandes responsáveis pelo boom dos NFTs em 2021, os Avatar Projects são precursores entre os tokens não fungíveis. Lá no longínquo 2017 surgiram os CryptoPunks, que, justamente pela antiguidade (sim, 4 anos neste universo equivalem a séculos no mundo real), atualmente são a coleção mais valiosa da categoria. Falarei sobre eles mais abaixo.

Basicamente, os Avatar Projects são coleções de imagens com edição limitada (3 mil, 5 mil, 10 mil…), geralmente em forma de desenho — muitas vezes até toscos para falar a verdade -, que possuem traços parecidos entre si, mas que têm características que tornam cada um deles únicos, com diferentes níveis de raridade. Quando falo características, falo sobre coisas como tipo de cabelo, cor dos olhos, acessórios, fundo… O fato de serem únicos dentro de um número limitado de uma coleção dá aos seus donos algo que ninguém mais tem, quase que uma personalidade digital; por conta disso, é muito comum que estas pessoas substituam suas fotos de perfil em redes sociais por uma das imagens que possuem. Daí o nome de Avatar Project ou Profile Picture Project. Isto virou até símbolo de status no Twitter, dependendo do projeto, como mostrarei mais adiante. Estas características que atestam a raridade, logicamente, acabam elevando o preço dos avatares — por exemplo, se o meu Avatar é o único que possui olhos vermelhos entre os 10 mil de uma coleção, o valor dele no mercado será bem maior do que outros com características mais comuns; lembrando é claro que de qualquer forma cada um é diferente do outro, mesmo que seu nível de raridade seja o mais baixo possível.

Os responsáveis por estes projetos criam as imagens base e todas as possibilidades de características diferentes entre elas (existem projetos com mais de 250 traços que diferenciam as imagens entre si) e alimentam um algoritmo, que gera de forma aleatória milhares de figuras com combinações únicas, como escrevi, umas mais raras, outras mais comuns.

Um aspecto muito interessante destes projetos é o fato de que eles geralmente são lançados com data e horário pré-definidos (o famoso Drop, como é chamado o lançamento de um projeto de NFT dentro da comunidade cripto) em uma mesma plataforma. No dia do lançamento, todas as imagens são vendidas por um mesmo valor, usualmente uma fração de ETH, a criptomoeda da blockchain Ethereum, a mais comum para emissão de NFTs deste tipo. Esta fração costuma variar entre 0,03 ETH (cerca de US$100, valor em 09/09) e 0,5 ETH (cerca de US$1.700, valor em 09/09). Os donos dos projetos ganham dinheiro na venda inicial, claro, mas também cada vez que os NFTs são revendidos no mercado secundário, de acordo com os percentuais de royalties determinados previamente na emissão dos tokens. Como a tendência dos projetos mais hypados é de valorização constante, estamos falando de muita grana. O mais legal dos Drops, no entanto, é o fato de que ninguém sabe qual imagem vai pegar, pois as mesmas são mintadas na hora do lançamento quando o comprador aperta o botão para fazê-lo. Isso adiciona elementos de sorte e surpresa, que acabam atraindo ainda mais as pessoas, pois qualquer um pode receber um NFT raro, com alto potencial de valorização quase que imediata, dependendo do hype sobre o projeto.

Pausa para uma breve explicação: o termo “mintar” é um neologismo; para criar um NFT, em inglês, usamos o verbo to mint, que pode ser traduzido neste caso como cunhar. Daí adaptamos para o português como “mintar” — nos perdoe, Aurélio.

Esta questão do hype dos projetos também é interessante. Eles não costumam surgir do nada. Semanas ou até meses antes do Drop começa um trabalho de divulgação para que as pessoas comecem a conhecer o projeto e se inicie a construção de uma comunidade em torno do mesmo. O Twitter é muito usado para isso, mas o Discord, rede social criada a princípio para gamers, é o principal canal de comunicação. Nele são criados canais para cada projeto, onde os responsáveis publicam o roadmap, fazem anúncios e interagem com os membros, recebendo sugestões, críticas e comentários em geral. Há projetos que, mesmo antes de serem lançados, reúnem mais de 5 mil, 10 mil pessoas em seus canais no Discord, gerando uma grande expectativa.

Por conta disso, é comum que os projetos em geral limitem a quantidade de NFTs que podem ser adquiridos por usuário no lançamento. E também é comum que muitas pessoas não consigam comprar no Drop devido à alta demanda. Há ainda outro elemento a ser considerado, chamado gas fee, que é a taxa de transação da rede Ethereum; toda vez que você vai mintar um NFT é cobrada uma taxa além do valor pago pelo NFT em si, e esta varia de acordo com a demanda. Dependendo do volume do projeto, a taxa pode ser bem alta — saiba mais sobre gas fee aqui.

A grande maioria dos Avatar Projects ocorre na Opensea, o maior marketplace de NFTs do mundo. Para se ter uma noção do volume de dinheiro movimentado pela plataforma e como o mercado está em alta, somente em agosto foram US$3,4 bilhões, 10 vezes o volume do mês de julho. Claro que tudo isto não foi gerado apenas por estes projetos, mas os mesmos tiveram grande participação. Os CryptoPunks, por exemplo, movimentaram quase US$680 milhões; o Bored Ape Yacht Club quase US$300 milhões; o Mutant Ape Yacht Club, derivado do Bored Ape, em poucos dias movimentou US$190 milhões; e por aí vai. Você provavelmente está abismado com números dessa magnitude e pensando: como alguém paga tão caro por um simples JPEG? Gary Vaynerchuk, empreendedor da internet, multimilionário, por exemplo, pagou US$3,7 milhões em julho por um CryptoPunk. E disse o seguinte ao site Decrypt:

“Tenho uma confiança enorme neste ativo. Tenho certeza de que as pessoas falavam o mesmo sobre as obras de Jackson Pollock em algum momento.”

Ele tem um ponto. Como expliquei no primeiro artigo desta série, quando você compra um NFT não está simplesmente comprando uma imagem digitalizada e sim uma imagem digitalizada autenticada, original, cuja procedência pode ser provada, o que faz dela um ativo com valor de mercado. Se você aposta que este mercado de colecionáveis e artes digitais veio para ficar, um CryptoPunk, pela história, tem sim potencial de valorização.

Algumas das maiores marcas do mundo concordam. Em agosto, a Visa anunciou a compra de um CryptoPunk por cerca de US$165 mil, sua primeira incursão nos NFTs. Ainda em agosto, a Budweiser também comprou seu primeiro NFT, mas optou por uma coleção mais modesta, a Tom Sachs Rocket Factory, desenhos de foguetes, pagando cerca de US$26 mil pelo seu. A Bud, inclusive, colocou o foguete como sua foto de perfil no Twitter (imagem abaixo).

Ter um Avatar Project de renome como foto de perfil no Twitter, como escrevi acima, virou símbolo de status. A Bloomberg recentemente publicou artigo falando que “os NFTs são os novos Rolex e Lamborghini” em termos de ostentação. Chegou ao ponto de um serviço ter sido lançado para pessoas que não têm dinheiro para comprar um CryptoPunk possam alugar um (exatamente, alugar!) para usá-lo como foto de perfil por um período pré-determinado. Você também deve estar pensando: não é mais fácil e barato copiar a imagem e usar como foto de perfil? Sim, claro que é. Mas existe um problema aí, o uso indevido de algo que não é seu. Neste caso, é muito comum os verdadeiros participantes de Avatar Projects fazerem o papel de polícia no Twitter e denunciarem perfis que “roubam” e exibem imagens que não lhe pertencem, ferindo uma ética existente nestes projetos.

O senso de comunidade, aliás, é também um dos aspectos bacanas dos Avatar Projects. Os donos de avatares em um mesmo projeto são basicamente sócios, uma vez que a valorização de um dos NFTs acaba elevando o piso do projeto em geral, aumentando o valor para todos. Por conta disso, é muito comum que estas pessoas defendam os projetos que fazem parte com unhas e dentes, e o clima costuma ser bem amistoso em discussões no Twitter e no Discord, inclusive com bastante colaboração para definição dos rumos tomados. Há ainda outros benefícios que vão além de ter uma foto de perfil, como participação em grupos exclusivos de donos de NFTs no Discord, muitas vezes podendo trocar ideias com celebridades que também possuem os seus avatares (Stephen Curry e LaMelo Ball da NBA são alguns deles, por exemplo); produtos oficiais, como peças de roupa; convites para eventos no Metaverso e no mundo real; e outros NFTs de projetos derivados, que também valem dinheiro — às vezes muito dinheiro.

Os principais Avatar Projects

CryptoPunks

Os CryptoPunks são o projeto mais antigo, mais famoso e mais valioso dentre os Avatar Projects; lançado em meados de 2017 pela Larva Labs, tratam-se de 10 mil imagens pixeladas representando pessoas, zumbis, macacos, aliens… Cada um com características que os diferem uns dos outros e traços de raridade. Os aliens são os mais raros e, por conta disso, os mais caros. Inclusive o CryptoPunk vendido pelo maior preço até hoje foi justamente um alien, o #7523, por US$11,8 milhões — imagem acima. Tamanha quantia se deu por um motivo: é o único da coleção com uma máscara, o que em tempos de COVID fez seu valor explodir, afinal o mesmo foi criado há 4 anos, muito antes da pandemia.

Para se ter uma ideia da magnitude deste projeto, desde junho de 2017 foram mais de US$1,2 bilhão movimentados por ele, a grande parte em 2021. Porém, uma curiosidade é que 9 mil dos 10 mil CryptoPunks foram distribuídos de graça em 2017; os mil restantes ficaram em posse da Larva Labs. Se você soubesse o quanto iria valorizar com certeza voltaria no tempo para pegar um gratuitamente se pudesse. Certamente valeria a pena. O piso da coleção (ou seja, o avatar mais barato) hoje, dia 09/09, está em pouco mais de US$300 mil.

Você pode ver o quanto o projeto é mainstream a partir de alguns donos de avatares. Além da supracitada Visa, Jay-Z, Steve Aoki e Odell Beckham Jr são algumas das celebridades envolvidas. Até a Christie’s, uma das maiores casas de leilão do mundo, entrou na onda e leiloou uma coleção de 9 CryptoPunks em maio passado por US$16,9 milhões.

Bored Ape Yacht Club

O Bored Ape Yacht Club é bem mais novo, lançado em abril deste ano, mas em poucos meses movimentou quase US$500 milhões, se tornando um dos mais populares Avatar Projects. Com desenhos muito mais bem feitos, tratam-se de 10 mil imagens de macacos com diferentes características que os tornam únicos, algumas raras, como pele cor de arco-íris ou dourada, olhos com lasers…

Porém, há uma grande diferença para os CryptoPunks: diferente do anterior, que basicamente são apenas as imagens, a equipe do BAYC criou um roadmap de lançamentos e benefícios que deram maior valor à coleção — e, devido ao sucesso, se tornaram um novo padrão para os projetos que vieram a seguir. Há festas exclusivas no metaverso, merchandising e a permissão da exploração comercial da imagem por parte dos donos de cada avatar.

Há algo ainda mais interessante: desde o início do projeto, os criadores desenvolveram coleções adjacentes, dando de forma gratuita aos proprietários outros NFTs que também se tornaram muito valiosos — basicamente deram muito dinheiro de graça! Em junho, por exemplo, foi criado o Bored Ape Kennel Club, uma coleção de cachorros para fazer companhia a cada macaco. Cada avatar do BAYC pôde mintar um NFT do BAKC; o BAKC desde então movimentou mais de US$80 milhões.

Em agosto a equipe do BAYC foi além e lançou o Mutant Ape Yacht Club, uma coleção de versões mutantes de cada Bored Ape. Todo dono de avatar ganhou de graça o que os criadores chamaram de “soro”; combinando este “soro” com seu macaco faz surgir uma versão mutante dele, um novo NFT. Tais mutantes viraram uma verdadeira febre e, desde que foram lançados, em 28 de agosto, já movimentaram mais de US$240 milhões. Incrível!

O hype sobre os Bored Apes e seus derivados é tanto que a Sotheby’s, outra das maiores casas de leilão do mundo, leiloou uma coleção de 101 BAYC por US$24,4 milhões — GIF acima. Muitos atletas entraram na jogada, com os já citados Curry e LaMelo Ball, além de Josh Hart, Von Miller e Marlon Humphrey, por exemplo. O piso de um BAYC hoje está em US$138 mil.

E o esporte?

Apesar de vários atletas terem enxergado valor nos Avatar Projects, ainda não temos projetos como estes com envolvimento direto de uma entidade esportiva, seja um clube, uma liga, uma confederação — pelo menos não que eu tenha conhecimento. E aí está uma grande oportunidade. Imaginem, por exemplo, uma grande coleção de mascotes de diferentes clubes, cada um com um número determinado (mil, 2 mil, 10 mil…), com características que os tornem únicos, benefícios no mundo físico e virtual para os donos, possibilidade de se combinar mascotes para gerar outros… São tantas possibilidades! Porém, não vejo um projeto como esse sendo tocado por apenas um clube; o verdadeiro valor viria justamente de termos vários envolvidos, a tal colaboração do universo cripto que sempre ressaltarei por aqui. Mais clubes, mais pessoas, mais dinheiro movimentado. Vale a reflexão.

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Felipe Ribbe
Felipe Ribbe

Former Director Brazil at Socios.com and Head of Innovation at Clube Atlético Mineiro