Sobre NFTs e Fan Tokens

Felipe Ribbe
Felipe Ribbe
Published in
7 min readSep 4, 2021

NFTs e Fan Tokens são assuntos muito novos e, por conta disso, a grande maioria das pessoas não entende exatamente do que se tratam. Dentro do universo esportivo, há ainda poucas iniciativas envolvendo blockchain, o que faz com que o know how de muitos profissionais do meio seja naturalmente bem básico, muitas vezes inexistente. Porém, há uma gama enorme de oportunidades que organizações do esporte podem explorar com esta tecnologia.

Desde que começamos a explorar algumas dessas possibilidades no Atlético Mineiro, tenho recebido contatos de pessoas de outros clubes e entidades do Brasil e do mundo querendo entender melhor o que temos feito. Há também muitos torcedores com dúvidas. Por conta disso, começo hoje uma série de artigos sobre o assunto, abordando desde os elementos básicos de blockchain (e produtos oriundos da tecnologia), passando por projetos que têm feito sucesso mesmo fora do esporte até chegarmos na estratégia do Atlético e no que enxergamos para o futuro.

De maneira alguma trata-se de algo definitivo; costumamos falar aqui no Galo que, quando o assunto é a interseção do universo cripto com o esporte, não temos certezas, temos apenas opiniões. Só teremos certezas experimentando e aprendendo.

Fungível x Não Fungível

A primeira questão fundamental para falarmos de NFTs e fan tokens é explicarmos o conceito de fungibilidade. Uma nota de 100 reais é fungível, porque toda nota de 100 reais vale 100 reais, não importa se é uma nota nova, velha, amassada, um pouco rasgada… O mesmo se aplica aos fan tokens e a criptomoedas como Bitcoin, ETH e outras. Todas estas são fungíveis, ou seja, o valor de cada uma delas é sempre o mesmo. O Bitcoin na minha carteira tem o mesmo valor do Bitcoin em outra carteira.

Já os NFTs são justamente o contrário. A sigla, inclusive, vem desta definição: os non-fungible tokens ou tokens não fugíveis, em português. Tratam-se de ativos digitais ou representações digitais de ativos físicos na blockchain. Basicamente tudo pode ser ou ter uma representação na blockchain, tornando-se um ativo digital e, por conta disso, podendo ser comercializado. Os NFTs possuem características especiais, como:

. identidade única — cada NFT tem um token ID, uma numeração de registro na blockchain. Mesmo que um NFT tenha cópias (falarei sobre isso mais abaixo), cada unidade será diferente das demais mesmo que apenas no token ID.

. indivisível — um NFT não pode ser dividido em outros; o máximo que pode acontecer é a fragmentação de um NFT em outros tokens (fungíveis ou não), algo que tem começado a ser testado, especialmente como forma de permitir que um número maior de pessoas consiga ser dona de pelo menos uma parte de um NFT mais caro.

. incopiável — como escrevi acima, por cada NFT ter registro único na blockchain, os mesmos são incopiáveis (lembre-se, mesmo que existam NFTs de coleções que podem ser idênticos em termos de imagem, seus tokens IDs sempre serão únicos).

. autenticado — esta é uma característica da tecnologia blockchain como um todo; todo ativo em uma blockchain pode ser autenticado por quem o colocou lá, uma vez que se sabe a origem do mesmo.

. rastreabilidade — outra característica da tecnologia blockchain é a possibilidade de se rastrear cada ativo ali registrado; desta maneira conseguimos saber a movimentação desses ativos entre carteiras cripto.

. programabilidade — esta talvez seja um dos grandes benefícios dos NFTs, que podem ser programados com contratos inteligentes (basicamente linhas de código que determinam o comportamento do NFT caso situações pré-estabelecidas aconteçam). Desta maneira, por exemplo, um artista que lança uma obra de arte digital em formato NFT pode determinar via contrato inteligente que a cada revenda um percentual de royalties automaticamente seja transferido para sua carteira.

Por que as pessoas pagam por algo que pode ser encontrado de graça na internet?

Esta talvez seja a pergunta mais feita pelas pessoas quando têm contato pela primeira vez com os NFTs. A maioria de nós encontra dificuldades para enxergar valor em coisas intangíveis. Além disso, estamos acostumados a baixar arquivos variados de forma gratuita na internet, por isso é natural uma reação de incredulidade com a possibilidade de se pagar (muitas vezes pagar bem alto) por algo que não se pode tocar. Em nossas ações no Atlético, por exemplo, os comentários nas postagens de promoção das nossas iniciativas com NFTs geralmente são nessa linha: “já tirei um print screen, não preciso pagar”; “acabei de baixar o arquivo, obrigado, não gastei um centavo”; e por aí vai. Normal! Cabe a nós fazermos um trabalho grande de educação. Afinal, há alguns anos (quase) todos nós baixávamos músicas ou filmes de forma pirata e hoje pagamos por serviços de streaming com muito prazer.

Mas voltando à grande pergunta, a resposta é bem simples: porque ao comprar um NFT, as pessoas estão comprando algo original, autenticado e único, e que por isso tem valor de mercado. Gosto sempre de fazer duas analogias para ajudar na explicação:

1) Por que compramos uma camisa original de um time e não uma pirata? Porque queremos algo que sabemos ser original, sabemos a procedência, a qualidade e para onde vai nosso dinheiro. A lógica é a mesma com os NFTs.

2) A Mona Lisa — se você entrar no Google e digitar Mona Lisa, milhões de imagens vão aparecer. Você pode baixa-las de graça, pode imprimi-las, pode fazer um quadro e colocar em sua parede, mas somente a obra original, de Leonardo Da Vinci, que se encontra no Museu do Louvre, em Paris, tem verdadeiro valor. A lógica também é a mesma com os NFTs.

O que são os fan tokens?

Para começar, vale uma definição muito importante: fan tokens não são criptomoedas. Criptomoedas têm apenas duas funções, pagamentos e reserva de valor. Fan tokens são o que chamamos de utility tokens, ou seja, tokens que têm uma utilidade, uma função clara, neste caso dar aos fãs dos times e marcas esportivas que os possui poder de voto em enquetes especiais. Que tipo de enquete? Aqui no Atlético as duas primeiras foram escolher um novo modelo de braçadeira de capitão que será usada em partidas oficiais e depois sorteada autografada entre donos do $GALO (imagem acima), e escolher que música toca no Mineirão quando o time entra em campo para aquecer.

Sim, os fan tokens também valorizam e desvalorizam, fazendo com que seu preço flutue de acordo com a demanda do mercado, porém esta não é sua principal função. É fundamental explicar isto bem ao torcedor, especialmente ao não acostumado ao universo cripto, afinal tem muita gente que compra os fan tokens com fins de especulação, apostando em lucro no caso de venda posterior. Porém, o mercado cripto é muito volátil, os fan tokens costumam ser ainda mais que muitas criptomoedas; além disso, trata-se de um mercado que funciona 24/7, diferente da Bolsa de Valores, por exemplo, que funciona apenas de segunda a sexta em horário comercial. Ou seja, há um risco de se perder dinheiro.

Por isso, repito, fan tokens não foram criados para se fazer dinheiro e sim como uma nova maneira de se engajar com torcedores, não só do seu clube, como de outros clubes e marcas esportivas também. Esta, aliás, é uma característica muito bacana do mercado cripto; os clubes não vendem produtos apenas para seus torcedores. Se estamos falando de um NFT colecionável, por exemplo, não serão somente atleticanos que terão interesse em compra-lo — lembre-se dos álbuns de figurinha, onde o objetivo era completa-lo totalmente, não somente o seu time de coração. Se estamos falando de um token atrelado a um ativo, trata-se de produto financeiro, que será adquirido muito mais por investidores do que por torcedores.

Costumo falar que a competição entre os clubes deve se ater ao campo; fora, devemos colaborar e o universo cripto é justamente isso, é colaboração. Por isso a troca de ideias, experiências, aprendizados e iniciativas em conjunto são tão importantes. Afinal, quanto mais clubes envolvidos, mais pessoas vão se interessar pelo assunto, fazendo com que o mercado como um todo cresça e todos os envolvidos se beneficiem.

No próximo artigo falarei sobre um dos assuntos mais bombados do momento, os chamados Avatar Projects ou Profile Picture Projects, que têm movimentado bilhões de dólares fora do Brasil. Ainda não há projetos como estes relacionados ao esporte, mas esta é justamente uma grande oportunidade que pode ser explorada.

--

--

Felipe Ribbe
Felipe Ribbe

Former Director Brazil at Socios.com and Head of Innovation at Clube Atlético Mineiro