Startup Leagues — Athletes Unlimited

Felipe Ribbe
Felipe Ribbe
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5 min readAug 10, 2020

Montar uma nova liga esportiva não é tarefa fácil. Se as ligas tradicionais têm sofrido cada vez mais para manter bons números de audiência em função da grande competição que existe pela atenção das pessoas atualmente, o trabalho de quem está começando do zero é muito mais árduo. Mas, se por um lado há as dificuldades, são justamente elas que fazem com que estes empreendedores tenham que, mais do que nunca, pensar fora da caixa e apostar em novos modelos de negócio, formatos de competição inovadores, novas tecnologias em transmissões… A partir daí surgiram propostas muito interessantes de ligas, que, pela inovação que trazem, têm sido chamadas de “startup leagues”. Umas já saíram do papel e têm tido sucesso, outras ainda vão estrear, mas carregam grande expectativa. E sobre algumas delas que escreverei nos próximos artigos.

Athletes Unlimited

O esporte feminino ainda é bastante desvalorizado se comparado ao masculino, mas isso pode ser considerado como uma ótima oportunidade a ser explorada. Pelo menos é dessa forma que Jon Patricof, ex-presidente do NYCFC, e o investidor Jonathan Soros, filho do bilionário George Soros, enxergam a situação. Eles são os fundadores da Athletes Unlimited, uma organização que tem como objetivo lançar três novas ligas femininas nos próximos três anos, começando com uma de softball este mês de agosto, uma de vôlei em 2021 e outro esporte a definir no ano posterior — o site oficial fala que hóquei no gelo, lacrosse, basquete e futebol estão no radar.

Porém, o que distingue a AU é o modelo completamente diferente do adotado pelas maiores ligas de esportes coletivos do mundo. Para começar, ao invés de terem times de várias cidades que viajam para jogar entre si, a competição inteira acontece em um único local e tem curta duração. A liga de softball (uma versão feminina do baseball) terá início dia 30 de agosto e acontece por cinco semanas em Rosemont, uma cidade próxima a Chicago. A liga de vôlei começa dia 26 de fevereiro de 2021 e terá duração de seis semanas, em Nashville. Isto diminui consideravelmente os custos e evita o trabalho de “competir” com diversas outras franquias esportivas de uma mesma cidade. Além disso, em época de pandemia, é o modelo adotado com sucesso pela NBA e a MLS de centralizar tudo em um só lugar.

As inovações não param por aí. Não existem times pré-definidos; as atletas, apesar de jogarem em equipes, são ranqueadas individualmente e acumulam pontos de acordo com as vitórias de suas equipes em cada inning (no caso do softball) e nas partidas, além dos seus desempenhos individuais. Cada jogo também terá três MVPs votadas pelas próprias atletas, que acumularão mais pontos. A cada semana, as quatro atletas que mais pontuarem são eleitas capitães e podem escolher seus times para a semana seguinte (veja imagens abaixo que explicam melhor o modelo). Na liga de softball, serão 56 jogadoras no total; no vôlei, serão 40. Ao final das semanas, quem tiver mais pontos é coroada campeã.

A ideia dos fundadores é criar uma competição mais dinâmica (por conta do tiro curto) e atrativa para as atletas e para os fãs. As atletas mantêm a motivação até o último jogo, pois a cada semana podem estar em times diferentes, mais fortes ou mais fracos, e todas as jogadas valem algo, seja para a pontuação coletiva, seja para a individual. Já os fãs assistirão basicamente a um fantasy game da vida real, onde o desempenho individual conta mais que o coletivo, o que também converge com o pensamento moderno, onde os atletas muitas vezes são mais populares que os times. Há também planos de lançamento de uma assinatura paga, onde os fãs terão conteúdo exclusivo, acesso às jogadoras e direito a voto em algumas decisões da liga, inclusive nos prêmios de MVP das partidas. Essa é uma das fontes de receita esperadas, além dos patrocínios, ativações, venda de produtos e direitos de transmissão.

Por falar em transmissão, a Athletes Unlimited fechou acordo com a CBS e a ESPN para a temporada de softball. Os 30 jogos (seis por semana) serão transmitidos ao vivo, sendo sete na CBS e os outros 23 na ESPN, para EUA e Canadá. Serão usados recursos tecnológicos, como câmeras especiais, inserções gráficas em realidade aumentada, além de serem colocados microfones em atletas e árbitros para que haja acesso ao que é falado em campo. A liga também terá forte atuação na produção de conteúdos frios, como séries e podcast, que serão publicados nas redes sociais — trabalho que, aliás, já começou. Essa é uma das características das startup leagues: caprichar nos conteúdos próprios. A PLL (Premier Lacrosse League), sobre a qual escreverei em outro artigo, tem tido bastante destaque nessa linha.

Haverá ainda um trabalho com cada atleta para que elas possam melhorar suas presenças online, monetizando suas marcas, e um trabalho de estimular jovens jogadoras, que poderão participar de sessões de treinamento com as profissionais — por conta da pandemia, claro, nesta primeira edição isto acontecerá por meio de vídeos.

Por último, vale destacar os modelos de remuneração e governança adotados. As atletas têm participação ativa nas decisões tomadas pela liga, inclusive nos conteúdos criados. Se alguma ideia de conteúdo não for bem aceita, não será produzida. Em termos de remuneração, o mínimo garantido pelas cinco semanas do softball é de US$10 mil por atleta, podendo chegar a US$35 mil com os bônus de performance. Além disso, há participação nos lucros, uma vez que não há a figura dos donos de equipes. E isto não se resume às temporadas em que elas atuarem. O USA Today publicou que a participação é por 20 anos.

Por conta destes modelos de competição e remuneração inovadores, a Athletes Unlimited atraiu nomes de peso para seu Conselho, como a ícone do futebol feminino nos EUA, Abby Wambach, a tenista ex-número 1 do mundo Caroline Wozniacki, e a estrela do basquete Kevin Durant, entre outros.

Se a AU dará certo ou não, ainda será preciso aguardar. Mas sem dúvida trata-se de uma proposta bem interessante, que fala a linguagem do público mais jovem e que pode ajudar a fechar um grande gap que existe no esporte feminino atualmente. Por isso vale muito ficar de olho.

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Felipe Ribbe
Felipe Ribbe

Former Director Brazil at Socios.com and Head of Innovation at Clube Atlético Mineiro