Solidão DiVenus — Exposição “Criaturas e Sentimentos”

Cassiel Kempa
Representacao Visual School
6 min readDec 3, 2018

Como já abordado em outra produção textual destinada a esse projeto(link no final do texto), nos foi proposto uma última atividade para “fechamento” da cadeira de Representação Visual. Dessa maneira, ficou definido que a atividade seria, na verdade, uma exposição com a temática “Criaturas e Sentimentos”, onde os graduandos puderam escolher quais sentimentos seriam utilizados em seus trabalhos. Este trabalho em específico, traz luz sobre a Solidão.

Segundo o dicionário, a Solidão significa o “Estado de quem está só, retirado do mundo; isolamento: os encantos da solidão.” A subjetividade da Solidão também já foi temática de músicas como essa cantada por Alceu Valença:

“…A solidão é fera, a solidão devora.

É amiga das horas prima irmã do tempo,

E faz nossos relógios caminharem lentos,

Causando um descompasso no meu coração…”

A intenção da produção final era justamente trazer o abstrato da Solidão, onde a mesma pode ser considerada, em sua dualidade, de acordo com a vivência de cada um, além disso, fazer uma crítica ao não tratamento da Solidão como dual.

Como planejado — e citado n’outro texto — tratei alguns aspectos como prioridade como o uso das cores da paleta já pré-definida, os formatos e diagramação dos documentos e o conceito de maneira geral — que felizmente não sofreu alterações drásticas porém adicionais.

Para a produção base desta obra foi utilizada a ferramenta Adobe Illustrator como forma de trazer conceitos da gestalt como Segregação e Pregnância — ambos serão demonstrados mais a frente, ademais referências como a própria documentação de identificação brasileira. Também foi utilizado tinta vermelha e chá de Erva Cidreira na composição final dos três itens que compõem a obra final. Como forma de facilitar o entendimento, segue:

O envelope onde se guardou os documentos da Solidão sofreu intervenções com uso da tinta vermelha, a primeira delas — e central — sendo a palavra “Rejeitada”, escrita em caixa alta usando um lápis molhado na tinta — por falta de um pincel ou quaisquer outro artefato mais indicado para tal — e as duas marcas de pegada que mais parecem feitas com carimbo, onde usou-se uma sandália de couro de um amigo de classe — Daniel, muito obrigada — tal intervenção foi feita hoje, dia da entrega final, porque acrescentaria a própria ideia da obra ficar disposta no chão. A pegada reforça a ideia da rejeição, por trazer uma ideia de descuido ou mesmo, asco — se pensarmos no uso do chá para dar um aspecto mais sujo e envelhecido ao envelope. Dando brecha para questionamentos que não foram previstos: Compadecimento, Asco e Curiosidade, três outros sentimentos que juntos causam a Inquietação de se entender o porquê da obra ser tão negligenciada. Afinal, por que negligenciamos a Solidão?

Seguindo para o próximo elemento, tem-se a Certidão de Nascimento da Solidão. Tal parte do projeto foi realizada, em grande parte, digitalmente. Com referência de uma certidão de nascimento mais antiga — de Fortaleza em 1916 — justamente para passar essa ideia de algo que é antigo. Tal aspecto acabou não tendo o efeito esperado, visto que era para ter ficado mais envelhecido, todavia o uso do café — previamente testado — acabou por ser dispensado devido a dificuldade com o próprio pó, tornando o chá a opção mais segura, mesmo sendo mais fraca em efeito visual. Todos os dados foram preenchidos a mão — seguindo pelo raciocínio do mais velho. O conceito mais usado nessa Certidão é o da Pregnância, por se tratar de um documento, a leitura e entendimento precisam ser facilitadas, as informações estão ordenadas de maneira a agilizar a leitura e entendimento.

A Carteira de Identidade da Solidão, assim como a certidão de nascimento, foi produzida digitalmente, apenas a digital e a plastificação foram “manuais”. A carteira segue uma predominância do amarelo escuro — cor também vista na Certidão de Nascimento, e traz a ideia de Segregação de dois elementos: a foto da Solidão e seu polegar, este que foi feito com tinta de piloto para quadro branco, no meu próprio polegar esquerdo. Para plastificar, usei uma capa de cd — aquelas mais baratinhas que geralmente tem um cd pirateado — e um ferro de solda para derreter o plástico para que o mesmo grudasse n’outro lado, encontrei dificuldades em fazer de maneira a ficar o mais próximo de uma identidade plastificada todavia a falta de prática com a solda unida aos materiais disponíveis tornou uma melhor aproximação à realidade, inviável.

Ainda sobre a carteira de identidade, a parte de trás está diagramada de acordo com o RG atualmente usado no sul do Brasil. É válido ressaltar alguns aspectos que se repetem tanto no RG quanto da Certidão de Nascimento, como o nome, a filiação, a data de nascimento e a naturalidade:

O Nome: o nome foi pensado para representar a Solidão de maneira mais mitológica, trazendo acompanhado o seu sobrenome, DiVenus, que referencia a deusa romana do amor, Vênus. A Solidão passa a assumir uma posição mais ligada ao amor, onde se interpreta como Amor próprio, Amor não correspondido ou o Amor como uno, sendo os três casos olhares diferentes sobre a Solidão e a relação que se estabelece com o Amor.

A Filiação: Nos campos referentes ao parentesco — tanto na Identidade quanto na Certidão de Nascimento — lê-se “Não consta”, isso é devido a origem da Solidão, que não necessariamente vem do externo, mas sim dela mesma. Não precisando de um fator externo para existir, tratando-a então como parte necessária por si só.

Data de Nascimento: A data de nascimento da Solidão é representada por um conjunto de número zero porque é como o início, ela já estava lá ou mesmo a ausência de importância de uma data, afinal, ela já existe quase que fisiologicamente.

Naturalidade: Muito ligada a Filiação, a naturalidade trata a Solidão como fruto do próprio anseio, tendo como “ponto geográfico” o coração.

Ainda dando um “zoom” nas informações expostas, temos a própria Solidão. Uma figura feminina pelo artigo definido de “a Solidão”, atraindo atenção ainda para a mesma, temos os chifres de vaca que referenciam o arcano onde a deusa egípcia Nut é representada. O arcano traz uma ideia de relação interpessoal, de você com você mesmo, ponto marcante de quem é solitário. Também temos o terceiro olho que, neste caso, está sangrando. Tal elemento representa a visão aprimorada do mundo e do coração alheio — por ser originada no coração, e por conta disso, ver os sentimentos externos e acabar sofrendo e se tornando mais reclusa. Solidão ainda trás uma pintura facial de uma listra dourada que atravessa seu rosto, acontece que o dourado é uma cor também ligada ao conhecimento por algumas crenças e vertentes dos estudos espirituais na Ufologia, reafirmando que a mesma é dotada de conhecimento do mundo que a rodeia.

Na exposição, a obra estava prevista para ficar simplesmente jogada no chão e quem se interessasse, parasse para ler. Todavia, contando com a criatividade e coerência das professoras da cadeira de Representação Visual — Haidee Lima e Luciana De Mari — a obra teve seu lugar ao chão, e pôde ser melhor apreciada por todas as pessoas que passaram pela exposição. Tal obra foi a única que ficou diretamente no chão, dando a impressão de rejeição — que já estava escrito no envelope.

Link para o primeiro texto:

Referências:

https://www.dicio.com.br/solidao/

http://blog.revendakwg.com.br/destaque/teoria-e-principais-leis-da-gestalt-um-estudo-da-forma/

http://cantinhodosdeuses.blogspot.com/2011/11/deusa-nut.html

https://dezmilnomes.wordpress.com/2010/10/17/deusa-egipcia-nut/

https://alquimiadaalma.com.br/as-chamas-cosmicas/

--

--