A batalha de Agassi

Fabiano Audazi
res_piro
Published in
5 min readMay 27, 2019

Uma luta que não tem fim e pode ser minha, sua e de qualquer pessoa.

Há pouco tempo terminei Open, a autobiografia do tenista americano Andre Agassi. Foi uma verdadeira imersão no esporte e na mente desse cara que conquistou como poucos.

Todos nós temos altos e baixos durante a vida. Na verdade, este vai e vem de coisas boas e ruins se intercalando é o que torna nossa jornada mais interessante. Para Agassi, esses altos e baixos foram uma verdadeira montanha russa. Um sujeito intrigante.

Surgiu como uma promessa do tênis. Jogou torneios de short jeans (algo inimaginável para o esporte). Usou peruca. Foi tachado de rebelde. Virou case de marketing. Fechou contratos milionários. Era amado pelo público, questionado pela imprensa. Rivalizou com Pete Sampras, seu oposto em tudo. Namorou celebridades. Ganhou. Chegou a nº 1 do mundo. Mudou o visual, cavanhaque e bandana. Perdeu. Perdeu novamente, dessa vez pra ele mesmo. Caiu no doping. Começou do zero. Virou piada, foi questionado. Raspou a cabeça, novo Agassi. Ganhou. Foi apontado como velho. Ganhou de novo. Chegou no auge, nº 1 novamente. Ganhou os 4 Slams. Foi reverenciado, por todos. Virou filantropo. Casou, construiu uma família.

Foi de bad boy à exemplo.

E o principal responsável por essa mudança foi o seu amadurecimento, um processo que não foi fácil para o Agassi

Durante todo o caminho, travou verdadeiras batalhas com àquele que foi seu o maior adversário dentro e fora das quadras: ele mesmo. Batalhas internas. Partidas inteiras com sua própria cabeça.

As facetas que representam o amadurecimento de Andre Agassi.

O tênis é um esporte que demanda muito controle mental. É um esporte que testa os nervos. Alguns dominam essa arte. Outros, tem sua própria cabeça como adversária antes do oponente à frente. Agassi era um deles.

Pelejava em autênticas batalhas consigo mesmo para acreditar que queria vencer. Para lutar. Para encontrar forças. Para se recompor e voltar ao próximo serviço equilibrado. Ganhou algumas, perdeu boa parte delas.

“Ja fui aclamado por milhares, vaiado por milhares, mas nada é tão ruim quanto a vaia dentro da sua cabeça durante aqueles dez minutos antes de adormecer.”

André Agassi

Agassi costumava dizer que odiava o tênis, detestava esse esporte _não é de se duvidar já que ele não escolheu o tênis, seu pai o fez. Desde os seis anos já o colocava para rebater bolas no quintal de casa. O imigrante iraniano e ex-boxeador respirava o tênis e fez a família viver intensamente este esporte. Todos os quatro filhos cresceram jogando e o caçula _involuntariamente_ foi agraciado com o talento.

Sem alternativa, Agassi abraçou o destino para o qual foi empurrado.

Mesmo odiando o tênis, queria ser perfeito em cada bola. Buscava uma perfeição que muitas vezes jogou contra ele mesmo. Bateu várias vezes na trave antes de fazer jus ao título de promessa.

Com Brad Gilbert, que passou a treiná-lo a partir de 1994, ganhou força. Aperfeiçoou o seu jogo, deixou a busca pela perfeição um pouco de lado e ganhou consistência. Física e mental.

“Perfeição? Mais ou menos cinco vezes por ano você é perfeito, quando você não tem condição de perder pra ninguém, mas não são essas cinco vezes por ano que fazem um tenista. Ou um ser humano, aliás. São as outras vezes. É tudo uma questão de cabeça. Com seu talento, se você estiver 50% ligado no jogo, mas 95% ligado na cabeça você vai ganhar. Mas se estiver 95% ligado no jogo e 50% na cabeça você vai perder, perder, perder.”

Brad Gilbert, lendário técnico de Agassi.

A vida é um pouco sobre isso não é verdade? Uma grande batalha entre o que queremos e o que fazemos. Entre o que queremos ser e o que somos agora.

É difícil vencer você mesmo.

E não se trata de uma única batalha que definirá toda a guerra . Que, se vencida te garantirá a glória e se perdida te sentenciará o fracasso.

São micro-batalhas travadas a todo momento, a cada escolha que fazemos. É tudo muito orgânico, muito dinâmico, mas uma escolha pode representar um ponto decisivo.

“Acredito que não seja por acaso que no tênis se usa a linguagem da vida: vantagem, serviço, dupla falta, break, love. Os elementos do tênis são os que fazem parte da vida diária, porque cada partida é como uma vida em miniatura. Mesmo a estrutura do tênis, a maneira como cada parte se encaixa dentro de outra, como bonecas russas, reproduzem nossa vida atualmente. Pontos viram games, que viram sets, que viram campeonatos, e tudo é tão estreitamente ligado que cada ponto pode ser aquele de uma virada decisiva. Isso me faz pensar em como os segundos podem parecer minutos, que podem parecer horas, e que cada hora pode ser nosso melhor momento. Ou pior.”

André Agassi

Agassi e sua esposa, a ex-tenista Steffi Graf.

O tênis já era um esporte que eu admirava, mas durante a leitura passei por uma verdadeira imersão. Entre um trecho e outro ia para o Youtube ver os jogos de Agassi, o que me despertava o interesse de ver outros. Quando percebia já estava há duas horas assistindo highlights de jogos e lendo reportagens que me dessem o máximo de contexto possível.

Terminei o livro sabendo boa parte da história do tênis, entendendo o jogo em outro nível. Passei a acompanhar com mais frequências as lendas do tênis contemporâneo e virei um verdadeiro fã de Roger Federer, por quem já tinha um grande respeito.

Mais divertido do que isso foi conhecer a trajetória e a mente desse cara. Por mais que ele buscasse a perfeição o que o fez mais interessante pra mim _ironicamente_ foi o fato dele não ser nada perfeito.

A batalha de Agassi é a minha também. E provavelmente a sua.

Uma luta contra nós mesmos. Uma briga invisível, que se passa dentro da nossa cabeça. Seja num jogo ou nas escolhas da vida.

Para se tornar quem você quer ser é preciso vencer quem você é hoje.

Vencer a si mesmo (mais no sentido de superar do que derrotar) também passa por acolher e aceitar quem você é hoje.

O que a vida de Andre Agassi nos revela é que essa luta é um processo de amadurecimento. Constante. Onde você se conhece cada vez mais e precisa travar menos batalhas.

--

--

Fabiano Audazi
res_piro

Estrategista apaixonado por histórias. Que vive em busca de sentido e experiências que valham a pena. Que gosta de cultura, esportes, inovação e viagem.