Ímola

“Caminho das Borboletas: Meus 405 dias ao lado de Ayrton Senna” é uma obra essencial para entender a cultura pop brasileira

brille
resenhas
6 min readOct 2, 2021

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Como vocês sabem, eu sou extremamente jovem. Por isso, é difícil para mim ter dimensão do fenômeno que Ayrton Senna representou no início dos anos 1990. Para mim, esse nome remete apenas às papetes comercializadas na minha infância.

Papete do Senninha.

Quando decidi ler Caminho das Borboletas: Meus 405 dias ao lado de Ayrton Senna (1994), meu interesse não era o piloto. Na verdade, o que chamou a minha atenção foi o fato do livro ter sido escrito por Adriane Galisteu, atual apresentadora de A Fazenda. Como grande admiradora de sua performance no reality show rural, queria descobrir mais sobre a trajetória da rainha de Itapecerica da Serra. O contato com a história de Ayrton, ex-namorado da estrela, veio como consequência: por meio das palavras afetuosas de Dri, pude entender como ele conquistou tantos brasileiros.

Graphic design is my passion.

Caminho das Borboletas começa descrevendo a reação de Adriane Galisteu diante da tragédia ocorrida no Grande Prêmio de San Marino em 1º de maio de 1994. Da tela da televisão, ela viu o carro de Senna colidir contra uma barreira de concreto e, em sua ingenuidade de jovem apaixonada, comemorou que o namorado voltaria de Ímola mais cedo. Ela imaginava que, a qualquer momento, ele sairia do carro andando normalmente. Foi só quando ela viu seus pés sem movimento que entendeu que o pior tinha acontecido. Galisteu, esclarece, é “expert na linguagem dos pés”.

Nesta semana, Andressa Urach anunciou seu retorno à prostituição. O nom de guerre Ímola faz referência à cidade italiana onde Senna morreu, traçando um paralelo entre as curvas perigosas do circuito de Fórmula 1 e as curvas de hidrogel da ex-vice Miss Bumbum.

Mas, apesar de ser impossível ignorar o acidente que tirou a vida do maior nome da história da Fórmula 1, Caminho das Borboletas é mais do que um relato dramático de uma recém-viúva. Dri descreve com leveza todo o percurso do romance arrebatador com Ayrton Senna até o fatídico dia. Além disso, ela também faz confidências sobre sua própria infância, seus familiares, seus amigos, sua carreira e seus sentimentos. A obra acaba incorporando ares de fanfic adolescente — com a exceção de que já sabemos de antemão que o final dessa história de amor não será nada feliz.

“Dri” e “Béco”: um amor como de fanfic.

Gali conta que, aos 9 anos de idade, se descobriu bonita. Após horas se admirando diante do espelho, ela anunciou para a mãe que queria aparecer na televisão. Seu sonho era ser famosa. E ela conseguiu: ainda criança, protagonizou um comercial do McDonald’s, e, na adolescência, fez parte do girl group Meia Soquete. Mais tarde, se tornou modelo da Elite, uma das principais agências do mundo.

Desde jovem, Dri já esbanjava estilo e elegância.

O caminho de Galisteu se cruzou com o de Senna no Grande Prêmio Brasil. Por mil dólares em quatro dias de evento, a jovem de então 19 anos concordou em atuar como recepcionista da Shell. Ao contrário das outras modelos que estavam em êxtase com a possibilidade de conhecer Ayrton Senna e as demais estrelas da Fórmula 1, Dri encarou aquilo como apenas um trabalho normal e bem-pago. Afinal, ela pouco se importava com o piloto e nunca foi de ter ídolos. Mas, como em um bom romance teen, é claro que o brasileiro da McLaren se interessou pela loira. Primeiro, foram os olhares que Dri preferiu acreditar que não eram para ela. Depois, na festa em comemoração à vitória de Senna, justamente o homem mais cobiçado da noite insistiu para que Dri não fosse embora e tomasse um drink em sua companhia. Dri, no entanto, recusou dizendo que não bebia álcool. Como explica mais adiante na obra, Adriane Galisteu consumia apenas Coca-Cola:

Naquela época, eu era do tipo connaisseur. Degustava Coca-Cola como se fosse um vinho raro e precioso, ao natural, às vezes sem gelo, para não comprometer o paladar. Coca-Cola, coca clássica — nada de diet, essas coisas. No almoço, um litro; à noite, outro; e mais uma latinha aqui, no lanche, outro antes de deitar… Ele conseguiu curar essa minha obsessão. Um dia, me perguntou, meio enciumado: “É disso que você mais gosta na vida, não é?” Eu lhe confessei que tinha outra coisa da qual eu gostava mais. E desde então passei a chamá-lo de Big Coke.

Nossa mocinha se fez de difícil no começo. Mas, depois de algumas conversas que incluíram o jocoso papo sobre signos, Galisteu cedeu aos avanços do boy que, assim como ela, era ariano. Juntos, eles curtiram um fim de semana prolongado na mansão de Ayrton Senna em Angra dos Reis. Aquele foi o início de uma relação intensa ambientada nos principais jet sets nacionais e internacionais.

Senna odiava viajar, mas, pela amada, enfrentava os aeroportos e aviões. Alguns dos lugares que conheceram em casal foram Tóquio, Londres e Budapeste. Visitar a Hungria, aliás, era um grande sonho de Galisteu, já que sua avó era húngara. A dificuldade desses momentos a dois era o assédio da mídia: mesmo em Bora-Bora, pequena ilha da Polinésia Francesa cujo acesso é bastante limitado, repórteres já aguardavam a chegada de Senna para bombardeá-lo de perguntas. Em uma noite romântica no cinema em São Paulo, um jornalista abordou o piloto na saída para questioná-lo se ele era o pai da filha de Marcella Prado, sua ex-namorada. A resposta de Ayrton foi: “Pergunte ao seu pai!” Para reforçar o recado, ele destruiu a câmera fotográfica do jornalista.

Através dos episódios narrados, Dri consegue transmitir as qualidades e os defeitos de Ayrton Senna. Mas, ao mesmo tempo em que humaniza uma lenda, ela também se mostra vulnerável. Antes do falecimento trágico do namorado, ela teve que superar a morte do pai e da avó (dois anos depois da publicação do livro, seu irmão também morreu). E, quando perdeu o grande amor, ela foi obrigada a lidar com o extremo desrespeito da imprensa e da própria família Senna – essa segunda situação, entretanto, é pouco aprofundada na obra, talvez para não se rebaixar ao nível do clã. Igualmente, ela não explora o conflito com Xuxa, se limitando a algumas poucas alfinetadas direcionadas à Rainha dos Baixinhos e ex-namorada do campeão mundial.

Caminho das Borboletas é uma leitura agradável e informativa, especialmente porque nos faz entender como Adriane Galisteu consegue permanecer inabalável diante do pandemônio de A Fazenda 13. Essa mulher já sofreu muito. Depois de tantos altos e baixos, agora ela está vivendo plenamente seu sonho de ser famosa, e não serão subcelebridades que vão impedi-la de ser feliz.

Nível de exigência da leitura: Nenhum. É curto e parece uma fanfic.

Obra passível de cancelamento? A obra já foi cancelada pela família de Ayrton Senna, que acusou Adriane Galisteu de estar tentando fazer dinheiro às custas do falecido namorado.

Para quem a obra é indicada? Para os telespectadores de A Fazenda 13 e demais admiradores de Dri.

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