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A jornada feminista de uma ex-sex symbol em “Na banheira com Luiza Ambiel”

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resenhas
5 min readSep 26, 2020

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Os nomes mudam a cada edição, mas há certos perfis de peões que têm lugar cativo no reality show A Fazenda: a ex-panicat, o participante de realities profissional, o agressor de mulheres, a influenciadora digital, e a outrora celebridade que caiu no esquecimento e agora tenta recuperar a visibilidade.

Luiza Ambiel, ex-sex symbol e integrante do elenco de A Fazenda 12, faz parte desse último grupo.

MILF: Aos quarenta e oito anos de idade, Luiza tenta se reestabelecer como personalidade da mídia e referência de sensualidade.

Luiza foi uma das mulheres mais cobiçadas da década de 1990. Ela protagonizava a Banheira do Gugu e, de biquíni se agarrando recreativamente com rapazes na tela da televisão todos os domingos, habitou as fantasias eróticas de milhares de brasileiros — anônimos e famosos, homens e mulheres. No entanto, com o passar dos anos, a carreira midiática da então gostosa entrou em decadência, e suas aparições públicas recentes se limitaram a uma breve passagem pelo reality show Made in Japan, apresentado por Sabrina Sato, e a um canal no YouTube no qual recebia convidados nem-tão-ilustres na banheira do Motel Caribe, em São Paulo.

Tempos mais simples: Gugu vivo, Luiza no auge do sucesso, Alexandre Frota sem envolvimento na política e baixaria liberada na TV aberta.

Os dias de glória de Luiza são narrados no livro Na banheira com Luiza Ambiel (1999), escrito pelo jornalista João Henrique Schiller. Trata-se de uma leitura simples, mas que permite que adentremos o universo da ex-musa para entender como suas experiências passadas se refletem em seu comportamento sensível e intenso no reality show rural da RecordTV.

Obra rara: o valor do livro gira em torno de R$2,00 a R$12,00.

A infância de Luiza em Indaiatuba, no interior de São Paulo, foi muito humilde. Nessa época, a garota sequer cogitava a possiblidade de um dia ser famosa, e foi uma amiga, Angélica, quem trouxe à tona seu potencial para o estrelato: segundo ela, Luiza tinha uma beleza acima da média, e só precisava ser lapidada para despontar como artista. Em um primeiro momento, o comentário foi interpretado como ofensivo, mas a indaiatubana acabou dando o braço a torcer e concordou em visitar uma agência de modelos em Campinas. Lá, se viu numa situação extremamente constrangedora quando o fotógrafo pediu que ela ficasse apenas de calcinha para fazer os cliques, e, por conta desse episódio, a carreira de modelo foi deixada de lado. O assédio, no entanto, continuou sendo uma presença constante na vida de Luiza.

Ainda em Indaiatuba, Luiza conseguiu um emprego como auxiliar de secretária na prefeitura da cidade, mas começou a sofrer com a perseguição de um colega em cargo superior. Como a jovem rejeitou todos os avanços sexuais do tarado, ele decidiu dar o troco e a transferiu para outro departamento, o centro esportivo, onde ela tinha que ficar em um local quente, pequeno e sem ventilação, e, de vez quando, recolher fezes humanas da piscina. Desmotivada, Luiza decidiu dar outra chance à fama e se juntou a uma caravana que iria para a plateia do Domingo Legal.

A sorte da aspirante a celebridade mudou graças a essa decisão. Durante o programa do Gugu, ela participou do quadro Sonho Maluco, no qual beijou a careca de Gabu, do Raça Negra, e chamou a atenção da produção, que a convidou para participar de outras atrações nas semanas seguintes. Daí para a banheira, foi um pulo — ou melhor, mergulho.

Entretenimento da família brasileira nos anos 1990: Luiza Ambiel e Tiririca se atracando ao som dos versos “ele é corno mas é meu amigo/ele é viado mas é meu amigo/ele é baitola mas é meu amigo/ele pode ter defeitos, mas é meu amigo”.

Em pouco tempo, Luiza conquistou sucesso, dinheiro e uma legião de admiradores, entre eles Belo, Eri Johnson, e até mesmo uma modelo cuja identidade não foi revelada. Heterossexual convicta, o real interesse da musa da Banheira do Gugu eram os homens coxudos, e, por isso, ela admite que “soltou os cachorros” em cima dessa e de outras mulheres que a paqueravam. Por outro lado, houve quem resistisse aos seus encantos: em um ato de homofobia da produção do Domingo Legal, Vera Verão, personagem de Jorge Lafond, teve que entrar na banheira com a gata à contragosto.

Bifobia: Luiza Ambiel critica a bissexualidade e conta já ter tido problemas com pessoas que curtiam ambos os sexos — em um dos casos, foi acariciada de maneira inapropriada por outra mulher em uma sauna.

Infelizmente experiente em matéria de machos –– e fêmeas — escrotos, Luiza aproveitou o período na Banheira do Gugu para aprender a se defender por meio do boxe e do jiu-jitsu. As novas habilidades logo se mostraram úteis: Luiza reagiu com golpes de luta ao comportamento indecente de Marcelo de Nóbrega na disputa dominical por sabonetes, e revidou os ataques de um famoso cantor de lambada que a tocou sem consentimento em uma festa, dando início a uma pancadaria generalizada que envolveu seus amigos, os amigos do assediador e os seguranças do evento. Luiza admite que puxou à mãe na agressividade, e, para exemplificar, compartilha que, certa ocasião, o cantor Leonardo se exaltou comentando sobre o derrière avantajado da matriarca e acabou levando um tapa na cara.

Apanhar de mulher bonita: é claro que houve quem curtisse levar uma sova, como foi o caso de Ivo Holanda, que se deleitou com a violência de Luiza na competição da banheira.

O livro deixa claro que Luiza Ambiel sofreu muita discriminação por ser uma mulher que trabalhava exibindo o corpo. Apesar de ter Gugu ao seu lado — Luiza conta que ele era um grande aliado das mulheres, sempre intervindo quando a brincadeira passava dos limites — , ela precisou aprender a se proteger tanto fisicamente quanto mentalmente. Disso, talvez, tenha nascido a Luiza que estamos acompanhando em A Fazenda: uma mulher insegura, explosiva e com um forte discurso de sororidade. E, certamente, ela deve estar tendo que se controlar ao extremo, já que, devido às regras do reality, responder com porrada não é uma opção.

Mesmo sendo uma senhora já de idade, Luiza continua sofrendo ataques pelo seu trabalho no passado: no ofurô de A Fazenda, ela foi às lágrimas depois do ex-jornalista Juliano Ceglia sugerir que ela “rodasse” pelos homens.

Na banheira com Luiza Ambiel é uma leitura pouco instigante, mal redigida e sem revelações bombásticas, mas que oferece um contexto interessante para os telespectadores do reality show da emissora do bispo Edir Macedo. Luiza, aliás, destaca na obra um conselho que recebeu de Jô Soares e que deve estar sendo útil durante sua estada em Itapecerica da Serra: “não é o público que precisa da gente, mas sim é nós (sic) que precisamos dele”.

Nível de exigência da leitura: Nenhum. São oitenta e nove páginas de texto e umas vinte de fotos de um ensaio sensual de Luiza.

Obra passível de cancelamento? Sim, por conta dos comentários problemáticos de Luiza sobre a bissexualidade.

Para quem a obra é indicada? Para os telespectadores de A Fazenda 12.

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