Da reconvenção

Um Universitário
Resumos de direito
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7 min readMar 8, 2019
por Um Universitário

A reconvenção é, em uma definição clássica, a ação do réu contra o autor, proposta no mesmo feito em que está sendo demandado. Configura-se como uma espécie de contra-ataque do réu, embora não substitua a defesa, uma vez que a reconvenção não isenta o réu do ônus da impugnação ao pedido da ação principal. Trata-se de um incidente processual que amplia o objeto litigioso do processo, sendo uma demanda nova em um processo já existente. Por esse motivo, a decisão do juiz que nega a petição inicial de reconvenção (decisão interlocutória) não tem força para extinguir o processo. Também não é obrigatória, sendo uma simples faculdade oferecida ao réu que se destina a propiciar economia de tempo e recursos.

O réu-demandante será conhecido por reconvinte, enquanto o autor-demandado será tido por reconvindo. Aqui, a citação funciona da mesma maneira, podendo ser feita na pessoa do advogado da outra parte, contando, a partir desta intimação, o prazo de 15 dias para resposta (art. 343, §1º). Para casos de reconvenção, não se cogita audiência preliminar de conciliação ou mediação, motivo pelo qual o prazo não leva em conta o exposto no art. 335 do CPC.

A autonomia da reconvenção

Apesar de formulada no processo já instaurado pela ação principal, a ação reconvencional é autônoma e não fica sujeita ao destino daquela. Ambas apenas unem-se pelo liame procedimental da conexão e pelo fato de serem veiculadas no mesmo processo. Isso significa que, se o autor desistir da ação principal, ou ocorrer qualquer outro fato que motive a extinção do processo, a reconvenção poderá prosseguir, visto que ela não é um acessório. Pelo mesmo raciocínio, é importante lembrar que nada impede que ambas as demandas sejam julgadas procedentes, dependendo de cada caso concreto.

Art. 343. Na contestação, é lícito ao réu propor reconvenção para manifestar pretensão própria, conexa com a ação principal ou com o fundamento da defesa.

[…]

§2º A desistência da ação ou a ocorrência de causa extintiva que impeça o exame de seu mérito não obsta ao prosseguimento do processo quanto à reconvenção.

A continuação deste artigo, por sua vez, vai nos mostrar que o código atual permitiu, expressamente, a entrada de novos sujeitos na relação processual, ampliando o polo subjetivo do processo.

[…]

§3º A reconvenção pode ser proposta contra o autor e terceiro.

§4º A reconvenção pode ser proposta pelo réu em litisconsórcio com terceiro.

É preciso prestar atenção, todavia, ao fato de que, ao trazer novos sujeitos ao processo, estes atuarão em regime de litisconsórcio com as partes. Logo, é preciso analisar se, no caso concreto, seria possível a formação dessa relação específica.

Para exemplificar, imaginemos uma situação em que o réu proponha uma reconvenção em litisconsórcio com um terceiro. Como, em regra, não existe litisconsórcio necessário ativo, o caso normalmente dirá respeito a um litisconsórcio facultativo. Assim sendo, a permissão para a formação deste litisconsórcio equivaleria a entrada facultativa (por opção) de um terceiro legitimado na relação. Isso significaria a possibilidade de um terceiro propor uma demanda própria em momento posterior à estabilização do processo, já tendo conhecimento sobre o juiz da causa, mitigando o princípio do juiz natural.

Portanto, a reconvenção permite sim a entrada de novos sujeitos ao processo, devendo, contudo, ser feita uma análise prévia da situação específica, para que se determine a possibilidade legal de formação do litisconsórcio que está para ocorrer, caso a ampliação se concretize.

Requisitos

Além dos pressupostos processuais que são exigidos em qualquer demanda perante o Poder Judiciário, o reconvinte deve também obedecer a alguns requisitos extras. Vejamos.

a. Existência de causa pendente

Como já deve ter ficado claro, a reconvenção pressupõe a existência de uma causa, não existindo de maneira autônoma.

b. A observância do prazo de resposta

Também já mencionado, deverá ser apresentada na mesma peça que a contestação. Se não for do interesse do réu contestar, mas, ainda assim desejar uma reconvenção, deverá fazê-la dentro do mesmo prazo estipulado para a contestação.

c. Competência

O juízo da causa principal deve também ser competente para o julgamento da causa motivadora de reconvenção. Isso significa que somente será possível ao réu apresentar uma reconvenção se o juízo da causa principal apresentar competência para julgá-la. Como a reconvenção não pode ser enviada a outro juízo, sendo caso de incompetência, deverá sua petição inicial ser indeferida.

d. Compatibilidade entre os procedimentos

Assim como a competência, a reconvenção necessita que seu procedimento seja compatível com o procedimento da causa principal, uma vez que ambas serão processadas em conjunto. Essa regra é uma consequência da aplicação, por analogia, do inciso III do §1º do art. 327.

e. Conexão

A reconvenção deve tratar de uma demanda conexa à ação principal ou algum dos fundamentos da defesa. Aqui, é importante reparar que não estamos nos referindo à ‘conexão’ que permite a modificação de competência, mas, à conexão com o sentido de ‘afinidade de questões’. É preciso que o pedido da reconvenção esteja, de alguma forma, relacionado ao pedido da pretensão principal.

f. Interesse processual

Para que o pedido de reconvenção seja possível, é preciso que o efeito prático almejado não possa ser alcançado através da contestação.

g. Cabimento

A reconvenção só será cabível diante do procedimento comum, havendo ainda alguns casos em que será expressamente vedada, como acontece nos Juizados Especiais Cíveis.

h. Despesas processuais

Por último, as despesas processuais possuem uma particularidade, a qual seja caber à lei estadual definir se há ou não pagamento de custas processuais em razão da reconvenção. Na Justiça Federal, todavia, não se sujeita a reconvenção ao pagamento de custas. A unanimidade é que se dispensa a caução às custas.

Procedimento

Uma inovação interessante que se consagrou no nosso código atual foi a instauração da reconvenção dentro da própria contestação e não mais em petição autônoma, como determinava o código anterior. De qualquer forma, a presente alteração procedimental não impõe consequências à autonomia da reconvenção, que continua sendo ação autônoma da causa principal.

Essa autonomia, aliás, oferece ao réu a possibilidade de abrir mão da causa principal e não contestar a ação, dando seguimento apenas à reconvenção. A questão é que, como a reconvenção não substitui a contestação, será o réu considerado revel. Além disso, ainda existe a possibilidade de a reconvenção ser indeferida liminarmente nos mesmos moldes da petição inicial, conforme o art.330.

Em caso de propositura da reconvenção de maneira incidente (com o processo em curso), o autor da ação principal não será citado, mas, intimado, embora essa intimação produza os efeitos legais da citação, descritos no art. 240.

Art. 240. A citação válida, ainda quando ordenada por juízo incompetente, induz litispendência, torna litigiosa a coisa e constitui em mora o devedor […]

Após a resposta, a marcha processual segue normalmente, agora sendo integrada pela reconvenção, sendo, contudo, ambos os julgados (das duas ações) apresentados em uma única sentença, com o um dispositivo específico para a reconvenção. A inobservância dessa regra, por sua vez, conduz à nulidade da sentença. Aqui, a sucumbência equivale à que ocorre na ação, o que significa que se o pedido for rejeitado, deverá o reconvinte (autor da reconvenção e réu da ação principal) arcar com os honorários do reconvindo.

Por último, como consequência lógica da autonomia da reconvenção, a desistência da ação principal ou ocorrência de alguma causa que motive a sua extinção não implicam consequências àquela, continuando o processo em andamento, até o julgamento do pedido reconvencional.

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Todo o conteúdo aqui agrupado foi retirado das doutrinas mencionadas abaixo e não há qualquer intenção deste organizador se fazer passar pelo autor de tais passagens e explicações.

1 Theodoro Júnior, Humberto.

Curso de Direito Processual Civil — Teoria geral do direito processual civil, processo de conhecimento e procedimento comum — vol. I / Humberto Theodoro Júnior. 56. ed. rev., atual. e ampl. — Rio de Janeiro: Forense, 2018

2 Donizetti, Elpídio

Curso didático de direito processual civil / Elpídio Donizetti. — 20. ed. rev., atual. e ampl. — São Paulo: Atlas, 2017.

3 Gonçalves, Marcus Vinicius Rios

Direito processual civil esquematizado® / Marcus Vinicius Rios Gonçalves. — 8. ed. — São Paulo : Saraiva, 2017. (Coleção esquematizado® / coordenador Pedro Lenza).

4 Bueno, Cassio Scarpinella

Manual de direito processual civil : inteiramente estruturado à luz do novo CPC, de acordo com a Lei n. 13.256, de 4–2–2016 / Cassio Scarpinella Bueno. 2. ed. rev., atual. e ampl. — São Paulo : Saraiva, 2016.

5 Wambier, Luiz Rodrigues

Curso Avançado de processo civil [livro eletrônico] : teoria geral do processo, volume 1 / Luiz Rodrigues Wambier, Eduardo Talamini, — 5. Ed. — São Paulo ; Editora Revista dos Tribunais, 2015.

6 Didier Jr., Fredie

Curso de direito processual civil: introdução ao direito processual civil, parte geral e processo de conhecimento / Fredie Didier Jr. — 19. Ed. — Salvador; Ed. Jus Podium, 2017.

7 Neves, Daniel Amorim Assumpção

Manual de direito processual civil — Volume único / Daniel Amorim Assumpção Neves — 9. Ed. — Salvador. Ed. Jus Podium, 2017.

8 Santos, Ernane Fidélis dos

Manual de direito processual civil, volume 1 : processo de conhecimento / Ernane Fidélis dos Santos. — 16. ed. — São Paulo : Saraiva, 2017.

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