Noções gerais sobre a posse

Um Universitário
Resumos de direito
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5 min readApr 3, 2019
por Um Universitário

A origem da posse é historicamente justificada no poder físico sobre as coisas e na necessidade do homem de se apropriar dos bens. Diversas teorias procuram a partir de então justificar a necessidade de proteção à posse.

Em razão de sua maior importância prática, serão analisadas duas das teorias elaboradas na tentativa de explicara posse: a teoria subjetivista e a teoria objetivista.

1.1 Teoria subjetiva de Savigny

Segundo Elpídio Donizetti, a primeira teoria, desenvolvida por Savigny, conceituou a posse como o poder físico sobre a coisa por quem tem a vontade de ser dono e se defende contra agressões. Assim, temos:

I) O corpus — elemento objetivo que consiste na detenção física da coisa;

II) O animus — elemento subjetivo, que se encontra na intenção de exercer sobre a coisa um poder no interesse próprio e de defende-la contra a intervenção de outrem;

Em razão do elemento objetivo na teoria de Savigny, para que se caracterize a posse o possuidor teria de exercer sobre a coisa um controle físico imediato. Teria, em outras palavras, de ter a coisa ao seu alcance e à sua disposição. Destarte, quem segura uma caneta, ou quem senta em uma poltrona, ou se encontra no centro de um escritório rodeado por livros teria o corpus. Diferentemente, quem está caminhando pelas ruas e possui em sua casa uma caneta, uma poltrona ou diversos livros, não teria o corpus.

Para além do elemento objetivo, há ainda o elemento subjetivo, necessário para configurar a posse, que é a vontade de ser dono da coisa. Ou seja, deve ter o bem em seu poder com a intenção de tê-lo para si. Logo, quem compra um carro e o dirige, teria o animus.

Nas palavras de Cristiano Chaves, vale uma crítica à teoria subjetiva pela exacerbação do papel da autonomia da vontade pela incondicionada ligação da posse ao animus. Para o autor, a teoria de Savigny não leva em consideração o ser humano como um ser capaz de se manifestar em uma pluralidade de relações possessórias, nas quais, apesar de não apresentar o animus, busca proteções que também devem ser objeto de tutela, como a moradia, o trabalho e a dignidade humana.

O mérito de Savigny foi o de projetar autonomia à posse, por explicar que o uso dos bens adquire relevância jurídica fora da estrutura da propriedade privada e que a titularidade formal desse direito subjetivo não encerra todas as possibilidades de amparo jurídico.

Tanto o conceito de corpus como o de animus sofreram mutações na própria teoria subjetiva. O primeiro, inicialmente considerado simples contato físico com a coisa, posteriormente passou a consistir na mera possibilidade de exercer esse contato, tendo sempre a coisa à sua disposição. Assim, o indivíduo que entrou no cinema e deixou seu carro no cinema não deixa de ser dono do bem.

1.2 Teoria objetiva de Ihering

A teoria de Rudolf Von Ihering é por ele próprio denominada objetiva, porque não empresta à intenção, ao animus, a importância que lhe confere a teoria subjetiva. Considera-o como já incluído no corpus e dá ênfase, na posse, ao seu caráter de exteriorização da propriedade. Dessa maneira, para que a posse exista, basta o elemento objetivo, enquanto a intenção do indivíduo revelar-se-á na maneira como o proprietário age em face da coisa.

O corpus passa então a representar o estado normal externo da coisa, através da qual cumpre o destino econômico de servir ao homem. Assim, nem a presença física, nem o contato material, nem a presença ou custódia, são elementos decisivos, porquanto em cada caso teremos que indagar como se comportaria o proprietário perante a coisa.

Para Ihering, portanto, não é o poder físico e sim a exteriorização da propriedade. Indague-se, diz o aludido jurista, como o proprietário costuma proceder com as suas coisas e saber-se-á quando se deve admitir ou contestar a posse. Protege-se a posse não certamente para dar ao possuidor a elevada satisfação de ter o poder físico sobre a coisa, mas para tornar possível o uso econômico desta em relação às suas necessidades. Partindo-se disto, tudo se torna claro. O que sobreleva, portanto, no conceito objetivo de posse é a destinação econômica da coisa.

1.3 Conceito de posse

Ao conceituar a posse da mesma maneira que o seu antecessor, o Código Civil de 2002 filia-se à teoria objetiva, como se pode perceber através da leitura do art. 1196.

Art. 1196. Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade.

Assim, pela letra do legislador, o possuidor é quem, em seu próprio nome, exterioriza alguma das faculdades de propriedade, seja ele proprietário ou não.

O Código Civil de 2002 ratificou a via eleita pelo Código de 1916, pela inserção da posse no livro do direito das coisas. Seguidor das teses de Ihering, Clóvis Beviláqua entendeu que a posse é um caminho para a propriedade e deve ser inserida antes do seu estudo, como um ponto de transição.

Será possível observar adiante que, nos dias atuais, no âmbito de uma sociedade plural, as teorias de Savigny e Ihering não são mais capazes de explicar o fenômeno possessório à luz de uma teoria material dos direitos fundamentais. Mostram-se envelhecidas e dissonantes da realidade social dos direitos fundamentais. Mostram-se envelhecidas e dissonantes da realidade social presente, muito porque ambas surgiram em dado período histórico no qual o fundamental era a apropriação de bens soba lógica do ter em detrimento do ser.

Assim, pode-se aproveitar o conceito de posse de Caio Mário da Silva Pereira, que a coloca como “Uma situação de fato, em que uma pessoa, que pode ou não ser a proprietária, exerce sobre uma coisa atos e poderes ostensivos, conservando-a e defendendo-a”.

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Todo o conteúdo aqui agrupado foi retirado das doutrinas mencionadas abaixo e não há qualquer intenção deste organizador se fazer passar pelo autor de tais passagens e explicações.

1 Gonçalves, Carlos Roberto

Direito civil esquematizado®, v. 2 / Carlos Roberto Gonçalves ; coordenador Pedro Lenza. — 4. ed. — São Paulo : Saraiva, 2016. — (Coleção esquematizado®)

2 Donizetti, Elpídio

Curso Didático de direito civil / Elpídio Donizetti; Felipe Quintela — 6. Ed. Ver. E Atual. — São Paulo: Atlas, 2017.

3 Farias, Cristiano Chaves de

Reais / Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald. — 13. ed. rev.,

ampl. e atual. — São Paulo: Atlas, 2017. (Curso de direito civil; v. 5).

4 Tartuce, Flávio

Direito civil, v. 4 : Direito das Coisas / Flávio Tartuce. — 9. ed. rev., atual. e ampl. — Rio de Janeiro: Forense, 2017.

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