Resumo & Resenha de Dom Casmurro, de Machado de Assis

William
Resumos & Resenhas
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9 min readFeb 23, 2021
Machado de Assis, autor da obra Dom Casmurro

“Você acha que a Capitu traiu ou não o Bentinho?” — Essa, talvez, seja a pergunta mais feita em torno da literatura brasileira.

Eu, inclusive, já iniciei algumas conversas com esta dúvida. A resposta para essa questão paira no excelente livro escrito por Machado de Assis.

Em “Dom Casmurro”, o imortal escritor brasileiro, revisita as lembranças de um personagem, narrando seu ponto de vista sobre a traição de sua esposa, Capitu.

Mas, será que ela traiu mesmo? Bem, vamos ver como essa história toda se desenrola para descobrir juntos.

Dados Técnicos:

  • Título: Dom Casmurro
  • Editora : Moderna; 1ª edição (1 janeiro 2015)
  • Capa comum : 248 páginas
  • ISBN-10 : 8516096890

Resumo técnico

Dom Casmurro é extremamente bem organizado, com 148 (!) capítulos, extremamente coesos e resumidos.

Cada capítulo possui, em média 1 ou 2 páginas, por isso que o alto número de capítulos não torna a obra muito extensa, na verdade, é uma marca do imenso Machado de Assis, escrever história em porções.

Em partes, provavelmente, pela necessidade de enviar pequenos textos aos jornais, que depois de um tempo, tomavam a forma de um livro.

Nas diversas edições de Dom Casmurro temos acesso a livros com capa dura, capa mole, edições comentadas, traduzidas e muitas outras opções.

O que se destaca, além disso tudo, é a capacidade de escrita de Machado de Assis.

O autor usando um português impecável, tempos verbais que poucas pessoas dominam e uma capacidade incrível de construção de personagens e histórias, Dom Casmurro se torna é um excelente companheiro para ser lido e relido diversas vezes.

  • Nota: Existem diversas opções para acessar o texto integral, inclusive a obra está em domínio público, ou seja, pode ser acessada abertamente, sem custos.

Resumo da obra

Em Dom Casmurro acompanhamos as memórias de um homem, na melhor das hipóteses, deprimido e carrancudo.

Tanto, que levou o apelido de Dom Casmurro por ter sempre um semblante de quem está triste com a vida.

Não é pra menos, a partir de um certo marco temporal a vida de Bento Santiago, ou Bentinho, ou ainda, Dom Casmurro, as coisas desandam e sua organizada vida começa a desmoronar.

Bentinho, é o extremo oposto de seu par romântico, Capitu. Uma cigana de olhos oblíquos e dissimulados, como o próprio Bento a descreve.

Para facilitar a organização do resumo do livro, vou dividir este resumo conforme os principais marcos temporais da história.

Ao todo, são pelo menos 3:

  • Infância e adolescência
  • Amadurecimento
  • Velhice — ou melhor dizendo, sua rabugice.

Vamos lá.

Resumo da primeira parte: a infância e adolescência de Dom Casmurro

Na parte inicial, primeiro marco temporal da história, Machado de Assis nos apresenta elementos da história que vão compor a obra Dom Casmurro.

As famílias de Bentinho e Capitu, personagens centrais, a amizade entre ambos e a necessidade, por parte de uma promessa feita pela mãe, Dona Glória, de que o rapaz devia virar padre.

O que naturalmente desabastecia qualquer chance de namoro entre os dois.

Durante os primeiros capítulos, os demais personagens são introduzidos, o contexto da história é explanado e a vida e amadurecimento de Bentinho e Capitu são discutidos.

Bentinho cresce dentro deste cenário familiar. Sendo filho de uma família rica da época que possui grande relação e amizade com Capitu e os parentes.

Nesta etapa da história, quase sempre Bentinho é descrito como um menino tímido, quieto e que cresce a sombra da mãe e da família, sem explorar ao certo, outras relações.

Fato que provavelmente moldará sua personalidade com o decorrer dos anos.

Ao crescer, Bentinho nota que a cada dia se aproxima do dia de pagar a promessa de sua mãe.

Por isso, pouco após ser considerado maduro o suficiente, Bentinho vai ao seminário para cumprir a promessa feita por sua mãe anos antes.

Capitu e seu amigo são, então, separados por esta formalidade do destino. No entanto, Bentinho não desejava e nem sequer possuía inclinação ao sacerdócio.

Embora isso seja evidente, sua mãe mantém a promessa que obriga o filho a estudar para se tornar padre.

O fato é que no seminário ocorre um evento que vai marcar a história de todos eles.

Bento conhece Ezequiel de Souza Escobar, ou simplesmente Escobar, personagem que dá uma guinada na vida de todos.

A primeira grande mudança que Escobar propaga no arco narrativo é quando apresenta uma solução eficaz para o dilema de Bentinho.

Ele não queria se ordenar padre e apenas estava cumprindo a promessa que sua mãe lhe fizera.

Por isso, Escobar apresenta uma solução para Dona Glória: ela prometeu um sacerdote que não precisava ser exatamente o seu filho.

Por isso, Escobar influencia os pensamentos de Dona Glória, que após refletir e perceber que o rapaz tinha razão, manda um escravo ao seminário e permite que Bento deixe a ordem.

Enquanto isso acontecia, Capitu e Dona Glória ficavam cada vez mais próximas.

Resumo da segunda parte: o amadurecimento de Dom Casmurro

Escobar e Bentinho não possuíam nenhuma inclinação para se tornarem padres, e haviam projetados futuros diferentes.

Por isso mesmo, ambos saem da seminário e cada um toma um rumo distinto.

Bentinho, por exemplo, volta pra casa, e logo em seguida começa a estudar advocacia.

Escobar também toma seu rumo ao deixar o seminário. Aqui, ocorre um novo recorte temporal, que é quando Bentinho termina seus estudos e volta para casa, com diploma e também com uma profissão.

Após idas e vindas, ameaços e rodeios, Bentinho e Capitu finalmente se casam.

Paralelamente, Escobar conhece uma mulher, Sancha, e acabam se casando.

O tempo de seminário não foi fecundo para ordenar os padres, mas criou uma amizade que permaneceu.

Mesmo casados, Bentinho e Escobar mantiveram a relação próxima. Agora casados, era comum que um casal visitasse o outro com certa frequência.

A vida, aparentemente organizada, havia colocado tudo nos trilhos para Bentinho.

Ele não precisou se ordenar padre, casou com a pessoa que amava, tinha uma profissão e um futuro próspero.

Mas aqui é talvez o ponto que tudo começa a desandar para Bentinho, os fatos a seguir começam a mudar sua personalidade e ele se tornará conhecido pela alcunha de Dom Casmurro.

Em primeiro lugar, Escobar e Sancha tiveram uma filha. Bento e Capitu ficaram felizes pela felicidade dos amigos…

Mas, ao mesmo tempo, uma nuvem cinza pairava sobre eles, pois Capitu ainda não havia engravidado.

O que, de certo modo, gerava muita desconfiança. Sobretudo os motivos dessa demora na personalidade de Bentinho.

A nuvem se dissipa após um período, quando Capitu descobre que também estava grávida.

Resumo da terceira parte: Dom Casmurro emerge

O tempo passa, e Escobar, um exímio nadador, acaba morrendo afogado.

Certo dia, atrapalhado pela morte do amigo, Bento começa a notar uma semelhança muito grande entre Escobar — seu amigo — e seu filho — chamado Ezequiel.

O jeito de andar, os traços no rosto. Tudo, segundo Dom Casmurro, relembra Escobar.

Somado ao fator de que Capitu demorou engravidar e também sentiu muito a morte do amigo, Bentinho sentencia em sua cabeça: fui traído pela minha esposa e pelo meu melhor amigo.

Num arco totalmente denso, Bentinho decide se matar pelo desgosto que sua vida tomou.

Planeja tomar uma xícara de café envenenado, mas tem seu plano interrompido pois Ezequiel, seu filho, chega.

Ele então decide matar a criança com o veneno dissolvido em café, no entanto, isso não ocorre.

Neste momento da história. Dom Casmurro fala a Ezequiel que ele não é seu filho.

A partir deste ponto, a vida de Bento se desmorona e ele assumisse de vez o papel de Dom Casmurro.

Envia sua esposa e filho para Europa, pois de acordo com ele, ver o filho era como ver uma prova viva da traição.

Só os visita quando os vizinhos começam a perguntar de Capitu e Ezequiel, mesmo assim, fazendo viagens cada vez mais escassas e distantes.

Os laços vão sendo aos poucos quebrados. Nas cartas que troca, Capitu é amável ao marido ao ponto que ele é apenas rígido e responde como se fosse apenas uma formalidade.

Os laços familiares se distanciam tanto que um dia Ezequiel chega de surpresa para visitar seu pai.

Neste ponto, Dom Casmurro escreve que a semelhança com Escobar era imensa, similar e rever seu falecido amigo.

Mas, Ezequiel surpreende, e conta que Capitu morreu e foi enterrada na Europa. Ao contrário do que suspeitaria, Dom Casmurro compreende a morte da esposa como algo comum, e não sente comoção pelo triste evento.

Assumindo seu papel de pai, patrocina uma viagem do filho ao outro lado do mundo para investigações científicas.

Recebe, tempos depois, uma carta avisando que o filho contraiu febre tifoide e também morreu.

Para descrever sua comoção com a morte da esposa e do filho, Dom Casmurro escreve pouco mais de 2 parágrafos, mostrando o desprezo pela família.

Principalmente ao comparar com as quase 2 páginas que Bento descreve a despedida de seu amigo Escobar.

Ao final, Bentinho perdeu seu melhor amigo, Escobar; a sua esposa, Capitu; e seu filho, também chamado Ezequiel. A esposa de Escobar, Sancha, e a sua filha viajam para o Paraná.

Todos os demais parentes apresentados no início da história, se foram a muito tempo. Dom Casmurro envelhece só.

O semblante carrancudo do homem não é um exagero, ele viu toda a sua rede de amizades e família desmoronar, e pior que isso, acreditando fielmente que foi traído por todos, de algum modo.

Resenha

Dom Casmurro é um clássico da nossa literatura.

É uma obra imortal, do imortal Machado de Assis. Deve ser, de longe, um dos livros brasileiros mais lidos e traduzidos ao redor do mundo.

Não é a toa, a história tem os diversos elementos que marcam uma grande obra-prima, como personagens envolventes, contextualização profunda, linha coesa de acontecimentos, e talvez o principal elemento, discute um assunto atemporal, que não possui uma data de vencimento.

A história de amor, ou de falta de amor, monopolizada na visão de um personagem excêntrico traz a tona diversos sentimentos que mesmo após um século ter se passado, ainda permanece atual.

Além do mais, em Dom Casmurro, Machado de Assis faz um recorte que vale a pena para todo leitor.

Ao refletir sobre a vida simples de criança e sua idealização de mundo. Ao se confrontar com problemas e dúvidas na adolescência. E, sobretudo, trazer o rancor e a angústia de um personagem ao alcançar a idade adulta.

O imortal escritor brasileiro traça aspectos que, embora centrados em um único personagem, de certo modo, são encarnados em pessoas comuns, do dia a dia.

Talvez, em algum momento ou outro, vejamos as reflexões de Dom Casmurro como sendo coisas que vivenciamos ou pensámos.

Ou ainda, nós reconhecemos nas ações impensadas e inesperadas de Capitu.

Ao contrário do que possa parecer, a história narrada é de uma tragédia imensa, e não uma prova de amor.

O luto vivenciado e a falta de empatia são marcas muito fortes do principal personagem da história.

Ao encarar essas reflexões, pensamentos e angústia, o livro se torna rapidamente uma longa história de desamor.

No entanto, este final catastrófico acontece somente na parte de encerramento da história, sendo que o restante é centrado nas formalidades de uma vida sem considerar o aspecto fúnebre de mortes, traições e isolamento social.

De certo modo, ao terminar a leitura de Dom Casmurro todos nós temos um julgamento interno, se Capitu traiu ou não.

O impacto causado pelas lembranças de Dom Casmurro deixa qualquer leitor desavisado pensativo sobre o assunto.

Talvez, a resposta possa flutuar conforme nosso momento temporal. Conheço pessoas, por exemplo, que ao lerem o livro mais de uma vez tiveram conclusões distintas.

Ao fim, ninguém poderá afirmar o que aconteceu, todos nós somos expectadores da vida de Bento e Capitu.

E Capitu, traiu ou não traiu?

Li o livro 2 vezes, e nas duas leituras obtive a mesma conclusão: Capitu não traiu o marido.

Acredito que Bentinho era um personagem extremamente tímido que distorcia os fatos devido a personalidade assimétrica de seu par romântico.

Ao mesmo tempo que para ele, por exemplo, era difícil falar de seus sentimentos a alguém e criar laços sólidos.

Tanto que na história, encontramos apenas a figura de Escobar como amigo que foi “conquistado”, todos os outros personagens eram — de algum modo — próximos a ele.

Capitu não tinha problemas em ser honesta e fazer novas amizades. Por isso mesmo, os risos e sinais que Dom Casmurro notava como sendo elementos que comprovam a traição, seriam na verdade, traços da personalidade da própria Capitu.

Não encontrei durante minhas leituras nenhum argumento sólido e consistente que apresentasse a visão de Bentinho sobre a traição.

Mas, essa é a minha perspectiva da história, e você, o que acha disso?

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