Obra do artista Shaun Ferguson

Nada

A sensação estar, mesmo não estando.

Ricardo Silva
Retalhos de Tudo
Published in
2 min readApr 11, 2016

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Não sei muito bem se o caminho é esse, ou se precisa de caminho, ou se há caminho. Sabe quando se vê que não se sabe nada e que saber que não se sabe talvez seja saber demais? Eu não sei. Se temos uma coisa em comum, você leitor das minhas estranhezas e eu, é que não sabemos nada — menos ainda do que pode vir nas próximas linhas. Pode até não vir nada, mas nada já seria alguma coisa, não? Espero que sim, porque é somente de nadas que tenho sobrevivido nos últimos tempos. Aquele Nada agudo, que faz eco dentro de ti. O meu não tem mais feito eco, porque ocupa todo o espaço que tem dentro de mim. Queria poder substituir esse Nada por um pouco de caos, ou um caos completo, incontrolável, insano, destruidor. Há dias que esse Nada me causa uma vontade de vomitar. Tem dias que ele me provoca o mais puro nojo de mim. Como posso ser tão vazio de mim se estou cheio de tudo que me rodeia? Pode ser uma crise inexistencial. Estou cheio de nada, não é? Preciso não precisar de nada. Mas ainda necessito desse Nada que se aloja, que alimento, que dou confortável moradia aqui, no mais interno movimento de mim. Quando que não vou precisar de nada mais? Assim como qualquer outra pergunta dessa nossa conversa, essa também não sei responder. A única resposta que tenho é não ter resposta nenhuma. Dá para viver sem resposta, não dá? Vejo tanta gente que vive bem sem saber nem porque vive. Como conseguem? Não deve ter segredo pra isso. Não existe segredo para ser idiota, só se é. Considero isso um tipo de dom. Não vejo muitas explicações convincentes do contrário. É, deve ser um dom sim. Porque, me acompanhe: ser um completo idiota do cérebro atrofiado que vive bem com as aparências que lhe foram impostas é uma proeza, uma espécie de talento que todo mundo nasce tendo. E por favor, não ache que pela generalidade há depreciação desse dom. É um dom porque não deve ser tão fácil se convencer de que esse mundo é bom e que a vida valha algo pra se viver. Aqui para nós, não vale. Pode-se até escolher algumas razões para dizer que viver tem lá suas vantagens. Mas vendo melhor, um pouco mais a fundo, se enxerga o que nos condicionamos a ignorar: que a vida é um grande nada. E pensar assim não é um bom caminho, né? Ou não seria um caminho? Existe caminho? É, realmente não sei. Ou talvez os caminhos estejam sofrendo crises de inexistência também.

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