As obras que ilustram esse texto são do artista Edward Hopper.

pequeno ensaio sobre a bad

Como a bad, esse fenômeno virtual, interfere nas nossas vidas

Ricardo Silva
Retalhos de Tudo
Published in
5 min readApr 8, 2016

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A bad e suas representações

Dos diversos motores que impulsionam esse conturbado lugar que chamamos de Internet, a bad parece ser um dos mais potentes. Ela aparece sob diversas máscaras, com diferentes formatos e inúmeras representações. A bad virou uma entidade que resume um repleto leque de sentimentos e sensações humanas. A internet, que não perde nenhum movimento, com seu desconcertante poder de síntese se apropriou dessas sensações e montou seus arquétipos representativos, seus memes, suas frases de efeitos, seus tweets engraçados, enfim, todo o pacote representacional de que dispõe e resumiu o que é a bad nessa sensação melancólica de deslocamento psicossocial que nos relega à uma triste impressão de tudo que nos rodeia.

Ninguém foge da bad. Ela é presente e está nas mais corriqueiras atividades do dia. Vive-se num mundo cheio de bads: do trabalho, do relacionamento amoroso, das amizades, da relação com os parentes. Enfim, a bad está lá onipresente. Mas a pergunta que fica, vendo que a bad ocupa e permeia tantos lugares da vida, é: sabe-se o que é bad? Como é a bad? Como entender a bad?

A bad foge de classificações simples. Cada um a sente de forma muito específica, tem seu jeito único de vivenciar essa sensação e mesmo de conseguir apreender o que pode ser essa bad. Muito do que se entende da bad está completamente carregado dos significados que as representações feitas na internet e outras plataformas de comunicação podem suscitar. Mas vale compreender para além de resumos simplistas. É importante entender a ligação que existe entre essas representações e o quanto elas podem moldar nossas sensações reais (com ressalva para o conceito de “real” nesse contexto).

É curioso perceber o quanto há de identificação nos exemplos de bads que se encontram espalhadas pela internet. Impreterivelmente identifica-se com alguma situação. A sensação de “é isso mesmo!” é uma constante sempre que algo relacionado ao “momento de bad” passa pela timeline. Com base nisso, compreendemos que a internet e os seus mecanismos representacionais nos possibilitam externar a sensação da bad. Mas qual a crítica que se pode construir a partir disso? Essa estrutura simbólica da bad interfere positiva ou negativamente e até que ponto nas nossas vidas?

A espetacularização da bad

O conceito de bad que é percebido atualmente está profundamente interligado com o que a internet monta de arquétipo representativo dele. É como aqui também se entende a bad, é a forma como ela chega e como essa recepção gera uma série de interferências nas formas “reais” do que sente-se. Porém, a representação feitas nas plataformas de comunicação da internet monta um corpo anômalo à realidade, por meio de recursos espetacularizadores do real.

Na internet, a bad, seja como apenas um sentimento aleatório ligado à tristeza ou decepção ou como sintoma de uma disfunção psicológica — tais quais doenças como a depressão ou ansiedade — , toma proporções triviais, em dados momentos apenas como um motivo para uma “boa” piada ou mesmo para uma distensão da realidade, como um espetáculo que produz uma ficcionalização do eu, do sentir. As peças do tabuleiro estão ali, mas a visão desse cenário, graças a essa interferência, se constrói de um jeito distorcido. Essa distorção, na tentativa de compreensão dos próprios sentimentos, possibilita a chegada de conclusões precipitadas, ou de confusões generalizadas. Pode haver o questionamento de que essas sínteses emuladoras da realidade feitas pela internet a respeito da bad acabam tendo o positivo resultado de poder possibilitar a exposição daquilo que não se consegue dizer de forma simplificada. Essa perspectiva, contudo, ignora um dos mais aspectos mais relevantes do que aqui entende-se como “a dúbia representação do real”: que é essa visão de que as mazelas da vida são superficiais ou mesmo mesquinhas, ou ainda de generalizações de sensações subjetivas. Pode haver, nesse pequeno ensaio, a impressão de uma compreensão negativa do que é a bad e suas representações na internet, mas na verdade o que intenta-se é tão somente uma reflexão sobre o que esse conceito restrito a plataforma online provoca.

A bad e sua interferência nas nossas vidas

Com diferentes nomes e classificações, o que entendemos (ou buscamos entender) hoje como bad sempre esteve na nossa vida. É ela que estamos vivendo quando sentimos aquela vontade de fazer inúmeros “nadas”, ou quando nos deparamos com situações de distintas naturezas e a única sensação que nos ocorre é a melancolia (ou uma “nostalgia triste”). Ela está ali presente, constante, real. E como tudo na vida, precisamos entendê-la. E isso não incorre, necessariamente, numa tentativa de categorizá-la e torná-la um espectro psicológico (os desdobramentos comportamentais da bad já têm suas classificações científicas).

É importante entender o que nos atinge, como nos atinge e porque nos atinge. Talvez venha daí esse desejo de exprimir com termos que nos represente essa bad constante que é experiência da vida. Somos muito melhor representados pelas características não tão engrandecedoras da existência. Representante de peso dessa sensação, os versos “tristeza não tem fim, felicidade sim” sintetizam com clareza o que é a “percepção da bad”. E quem escreveu tais versos tinha conhecimento de causa sobre o que escrevia. E vale dizer que nessa trilha sonora da vida uma releitura que se encaixa perfeitamente nesse assombro da existência: “a bad não tem fim, felicidade sim”.

Então a bad é algo ruim?

É óbvia a conclusão de que a vida não se faz só de alegrias. Inclusive se pode afirmar que o viver é feito bem mais de experiências tristes do que alegres. Mas disso não se pode tirar uma definição de que a vida é tão somente triste e nada mais. Contudo, há seus inúmeros momentos de bad. E a bad, essa que acompanha cada instante da existência, precisa ser bem vivida. Se ela existe e se faz presente, não adianta insistir no contrário dela, viva a bad que lhe diz respeito. É uma etapa do processo que é viver. Uma etapa que se repete, ainda não constantemente. Mesmo na categoria de clichê, não se pode perder de vista que uma hora essa bad passa.

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