Coletivo Retomadas Epistemológicas: Apresentação

Tulio Silva
Retomadas Epistemológicas
3 min readMay 14, 2021

Você sabe o que é o Epistemicídio? A descoberta dessa questão iniciou um movimentação pungente no seio do curso de Ciências Sociais da Universidade Federal de Minas Gerais. Segundo a filósofa Sueli Carneiro:

É uma forma de sequestro da razão em duplo sentido: pela negação da racionalidade do Outro ou pela assimilação cultural que em outros casos lhe é imposta. Sendo, pois, um processo persistente de produção da inferioridade intelectual ou da negação da possibilidade de realizar as capacidades intelectuais, o epistemicídio nas suas vinculações com as racialidades realiza, sobre seres humanos instituídos como diferentes e inferiores constitui, uma tecnologia que integra o dispositivo de racialidade/biopoder, e que tem por característica específica compartilhar características tanto do dispositivo quanto do biopoder, a saber, disciplinar/normalizar e matar ou anular. É um elo de ligação que não mais se destina ao corpo individual e coletivo, mas ao controle de mentes e corações. (CARNEIRO, 2005, p.97).

O Coletivo Retomadas Epistemológicas é uma iniciativa que surge desse incômodo de estudantes negras e negros do curso de Ciências Sociais da Universidade Federal de Minas Gerais com a ausência e a invisibilização de leituras de autoras/es negras/os e indígenas no currículo básico da formação do curso. Incômodo esse que tinha corpo, mas não tinha nome, até o contato com Sueli Carneiro. E esse contato deu luz a toda uma movimentação que chacoalhou a ordem cotidiana do curso.

Fundado em agosto de 2019, o Coletivo iniciou seus trabalhos na atuação junto a representação discente no Colegiado de Ciências Sociais demandando ativamente a inclusão dessas/es autoras/es por meio da proposição de novas ementas e de campanhas de denúncia ao epistemicídio. A demanda de inclusão, todavia, entrou no espiral de burocracia das ações do Colegiado e das Câmaras Departamentais, trazendo morosidade e questionamentos ao que era solicitado. Tal feito exigiu recalibrar a rota, apostando na formação antirracista centrada no protagonismo de escritos, saberes e personalidades negras e indígenas. Isso foi realizado na forma de espaços de formação no Centro Acadêmico de Ciências Sociais, o CACS.

Divulgação do primeiro encontro de formação antirracista. Imagem: acervo pessoal.
Encontro de formação antirracista no CACS. Foto: acervo pessoal.

O advento da pandemia de coronavírus, porém, impediu o prosseguimento das atividades presenciais. Sendo assim, o Coletivo partiu para a atuação virtual, via Instagram, promovendo debates e divulgação de trabalhos produzidos por pessoas negras, indígenas e demais povos não-brancos. A realização dos grupos de formação antirracistas prosseguiram virtualmente e as/os integrantes ofertaram um minicurso junto a MEIOS, Empresa Júnior de Ciências Sociais da UFMG, chamado “Epistemicídio: desdobramentos e alternativas”, no final de 2020. Ainda nesse ano, foi dado início ao CineRetomadas, um cineclube para debates produções audiovisuais de realizadoras/es negras/os, contando com a presença das/os mesmas/os. Por fim, já no início de 2021, o Coletivo deu vida ao seu grupo de estudos, sendo a obra “Pele Negra, Máscaras Brancas”, de Frantz Fanon, a primeira a ser discutida, ao longo de oito encontros.

E, finalmente, chegamos ao Medium! Optamos por essa plataforma para fazer a divulgação de textos autorais, resenhas e ensaios produzidos pelas/os integrantes do Coletivo. Será uma plataforma de uso paralelo a nossas postagens do Instagram, tendo aqui maior profundidade nos debates. Esperamos fomentar discussões muito profícuas nesse espaço, ensejando a aproximação cada vez maior de literaturas não-brancas e descentramento da ordem colonial dos discursos e currículos.

Referência bibliográfica

CARNEIRO, Sueli. A construção do outro como não-ser como fundamento do ser. Tese de doutorado do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade de São Paulo, 2005.

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