Nas Ruas

Onde pessoas comuns se tornam protagonistas

Gabriella Tiscoski
Retratos e Relatos
4 min readJun 2, 2017

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Construções, carros, barulho de motor. Uma barraquinha de pipoca na esquina, um vendedor de algodão-doce que assopra seu apito e uma criança que, sem fôlego, chora por não ter o brinquedo que viu na lojinha de camelô. Pedestres que correm de um lado para o outro sobre faixas quase apagadas. Uma casa verde de portão marrom, que carrega uma placa “costureira aqui”. No banquinho da calçada, uma moça recebe flores, sorrateiramente colhidas por entre as grades da casa verde.

Nesse caos sentimental, trombando em um transeunte e outro, andando e sentindo cada pedaço da cidade, está o fotógrafo de rua. Federico García Lorca, poeta e dramaturgo espanhol, diz que a poesia é algo que anda pela rua. Essas poesias são registradas pelos fotógrafos, que observam cada movimento, transformando um momento caótico em uma poesia singular, eternizada pela imagem. Foi nesse cenário que três amigos se encontraram e decidiram mostrar a poesia das ruas sob o olhar de cada um através do Nas Ruas.

Nas Ruas

No bairro do Vidigal, Rio de Janeiro, Igor Albuquerque encontrou a poesia ainda muito jovem. Criado somente por uma mulher, ele diz que esse é o motivo de sua sensibilidade. Nas fotografias, ele busca mostrar a esperança que cada cenário pode transmitir. Começou a fotografar aos 28 anos, dois anos depois, afirma que a fotografia mudou sua vida por completo. “A forma de olhar as pessoas, entender um pouco do problema delas, antes eu não tinha muito essa preocupação, hoje tenho muito”. Usando como exemplo as fotografias de Henri Cartier Bresson, ele afirma que “só entrou para a história quem fotografou o povo.” Para Igor, a maior poesia da fotografia de rua no Brasil está da diversidade cultural. “Aqui você tem um pouco de Madrid, de Paris, de Pequim, Nova Déli.”

“Só entrou para a história quem fotografou o povo.”

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Sebastião Salgado disse que “você não fotografa com sua máquina. Você fotografa com toda sua cultura”. Patrick Oliveira é exemplo dessa fala. Skatista frustrado, admirador das poesias do hip hop, “Tick”, como é chamado, encontrou a fotografia nas revistas de skate que colecionava. Muito tímido, entre uma pausa e outra na fala, contou que descobriu que podia transmitir seus sentimentos e ideias através da foto. Com 23 anos, dava aulas de informática e tinha uma aluna que ele define como “socialite”. Explicando sua nova paixão pela fotografia, convenceu a moça de pagar metade de seu equipamento, entrou para o Ateliê da Fotografia, na Urca, e não parou mais. Sobre a fotografia de rua, sua primeira paixão, Tick deixa que seus sentimentos falem. “Eu amava aquilo, era onde eu me identificava. Era onde tudo que eu acreditava foi construído, vivi na rua desde pequeno, antes pelo skate, depois pelo hip hop e agora pela fotografia”.
Ouça o depoimento do Patrick contando o que a fotografia mudou na vida dele

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Yago da Silva, de 23 anos, descobriu a fotografia por meio da rua. Também skatista e admirador do rap, ele conta que uma de suas influencias foi Patrick, com quem trabalha junto hoje. Para ele, cada fotografia carrega o olhar do fotógrafo, e é isso que a torna única. “Se eu e você estivermos em um lugar e nos derem um celular pra fazer uma foto, nossas fotos sairão completamente diferentes.” Carregados de expressões, a intenção de seus retratos é mostrar o que o olhar das pessoas diz. “É perceptível quando a gente vai fotografar o metrô, por exemplo, o olhar das pessoas no final do dia não é o mesmo olhar no início do dia.” Como um bom apreciador das poesias de Sérgio Vaz, conhecido como o “poeta da periferia”, Yago diz que a poesia caminha sempre pelas ruas, nós que não a enxergamos.

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