Com amor, Julie.

Vênus Rodrigues
OIMOI
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2 min readFeb 6, 2021

Kim,

Eu odeio escrever cartas. Você sabe, e sempre julgou, que qualquer coisa digitada é meu maior inimigo. Qual o sentido de escrever se posso me expressar com pinturas? Ou simplesmente mandar um áudio? Mas, em sua homenagem e respeito a sua mãe, decidi escrever isso.

Vou confessar que acho meio ridículo criar uma cápsula do tempo para alguém que já morreu. Me parece um tanto mórbido ler para uma lápide o que as pessoas estavam sentindo 10 anos atrás. Mas quem sou eu para julgar? Se essa é a forma da sua família manter sua lembrança viva.

Desde que você “virou uma estrelinha” (palavras da sua sobrinha), eu tenho tentando seguir em frente da minha própria forma. Não parei de seguir nossa rotina de sempre e nem empacotei tudo que era seu e tranquei em um quarto. Até porque é impossível remover todas suas lembranças de uma casa que você mesma decorou. Então, meu plano foi continuar como se isso não doesse, até realmente não doer mais.

Toda manhã eu ainda corro até nossa padaria preferida e compro o café, agora só para uma pessoa. Acredite ou não, a atendente me olha com pena toda vez que chego. Eu almoço na varanda para fuxicar a vida dos vizinhos, alimento nossos gatos com sabores diferentes cada dia da semana na mesma ordem que você, coloco um episódio de CSI para passar antes de dormir, mesmo que eu não precise, e escuto sua playlist preferida. Até vou no parque nos fins de semana tomar sorvete (eca). É uma boa rotina. É minha zona de conforto.

Hoje completam 3 anos da sua morte, Kim. 3 anos que perdi a pessoa que mais amei em toda minha vida. 3 anos que descobri que você era uma filha da puta. Eu sinto sua falta. Sempre.

Feliz aniversário de morte, amor. Apesar de tudo, não me arrependo de nada. Espero já estar no inferno com você quando essa carta for lida por alguém.

Com amor, de sua namorada e assassina, Julie.

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