Existem convergência e participação na TV brasileira?

Karine Silva
Bem-Te-Vi
Published in
5 min readApr 19, 2018

Você já ouviu falar em convergência midiática na televisão? Tendência em formas de consumir e produzir TV, ela diz de uma transformação sobretudo cultural, que mudou as relações não só entre os meios de comunicação, mas também entre os antigamente definidos “produtores” e “consumidores” de televisão.

Hoje, podemos ver TV sem estar realmente com o aparelho televisivo ligado. É possível ter acesso aos programas em outras plataformas de comunicação, especialmente na internet.

Os usos da internet e das redes sociais, inclusive, permitiram a interação do público com as emissoras em modos, escalas e velocidade nunca vistas antes. As conversas, que antes se restringiam às salas de casas ou grupos de amigos, passaram a incluir milhões de pessoas em diferentes partes do mundo.

Antes de explicarmos melhor sobre essas novas formas de ver e produzir TV, uma breve conceituação:

Convergência midiática. Conceito desenvolvido pelo norte-americano Henry Jenkins, que diz sobre “o fluxo de conteúdos em diferentes plataformas de mídia, a cooperação entre múltiplos mercados midiáticos e o comportamento migratório dos públicos dos meios de comunicação” (JENKINS, 2009), especialmente para a internet. Define mudanças tecnológicas, mercadológicas e sobretudo, culturais.

Cultura participativa. Na comunicação, diz da interação entre espectadores e produtores de mídia a partir de ideias e difusão de propostas. É a produção de conteúdo de todos para todos e com todos, não mais de um para todos. Embora não seja algo novo, uma vez que telespectadores já interagiam, e inclusive interferiam na programação, por meio de cartas e telefonemas, a participação atingiu novos patamares com os usos dados à internet, especialmente pelas redes sociais.

Quando falamos em mudanças culturais, nos referimos às modificações nas interações cotidianas — entre pessoas, meios, lugares. Aqui, o nosso foco é nas mudanças nas relações entre quem tradicionalmente produz televisão e a audiência. O que antes era considerado a produção de “um” para muitos, agora tende ter maior atenção às demandas dos públicos.

Assim sendo, é possível falar sobre convergência midiática e cultura participativa na televisão do Brasil?

A televisão não é uma coisa só

Antes de entrar no assunto convergência e participação na TV brasileira, é importante lembrar: falar sobre televisão não é falar apenas de um meio de comunicação, mas sobre narrativas centrais (organizadas em diferentes gêneros) no que dizem respeito ao conhecimento da história, da política, dos relatos de nação e de uma memória recente do nosso país. É ainda, ver figurações das relações cotidianas, de formas de sociabilidade, de concepções de mundo e de estilos de vida.

Falar sobre televisão, portanto, é falar sobre cultura. Por isso, mais importante do que comparar a configuração da nossa TV com a de outros países, como os Estados Unidos, é entender a relação dessa com o nosso contexto.

Especialmente na América Latina, onde temos mais de 40 milhões de analfabetos (grande porcentagem concentrada no Brasil), a televisão é ainda um dos principais meios de comunicação. Por outro lado, cerca de metade da população da região tem acesso à internet.

Em meio a esses fatores — e a outras diversas questões históricas, políticas e culturais — podemos afirmar que a interação entre audiência e emissoras se dá em diferentes níveis, de acordo com regiões, faixa etária, poder aquisitivo, interesses e outros fatores sociais. Isso torna impossível realizarmos um diagnóstico único sobre se há ou não convergência e cultura participativa na nossa TV.

Por outro lado, a própria configuração da grade televisiva torna impossível uma afirmação geral. A programação televisiva é separada por gêneros: telenovelas, telejornais, reality shows, séries, minisséries, entre muitos outros. Cada gênero segue suas próprias estratégias de comunicação e procedimentos para a produção. Não podemos falar, portanto, da televisão como uma coisa só.

É preciso pensar por casos

Embora não possamos falar da TV como uma coisa única, podemos enxergar práticas que apontam para avanços da convergência e da participação na televisão brasileira. Alguns grupos de pesquisa sobre TV têm se dedicado a estudar essa temática.

Se pensarmos nos canais da TV brasileira, se destaca a Rede Globo que, entre outros esforços voltados para criar novas formas de ver TV, tem desde 2015 o Globo Play, canal de streaming onde é possível acessar conteúdos transmitidos na TV e outros exclusivos para a internet.

Não quer dizer, porém, que a Globo ou a Globo Play inauguraram a relação entre TV e internet. Em 2012, por exemplo, fãs de Avenida Brasil criaram perfis fakes dos personagens da novela no Twitter, e aderiram às suas personalidades e comportamentos para interagir na rede. A novela é ainda marco quando falamos em produção de memes (que ressignificam conteúdos e imagens) na internet.

De Avenida Brasil para cá, não foram poucos os esforços: diversas novelas e programas têm repercutido na internet. Há esforços — nem sempre bem sucedidos — das próprias emissoras para que isso aconteça. A Rede Globo hoje toma frente na criação de perfis de seus personagens fictícios no Twitter. As telenovelas têm mudado rapidamente de rumo devido a demandas da internet.

O remake de O Rebu (2014), por sua vez, contou com conteúdos exclusivos e interativos para a internet- como jogos, quizzes, cenas exclusivas e vídeos feitos pelos atores para promover o engajamento do público. Os personagens também ganharam perfis fictícios, que postavam inclusive durante a exibição da novela.

Hoje, a nossa intenção foi apenas trazer uma breve reflexão sobre a existência ou não da convergência e da cultura participativa na TV brasileira. Nos próximos textos selecionados pela Bem-te-Vi, traremos algumas análises de caso para pensar melhor o assunto. Se você se interessou pelo tema, ative as notificações e acompanhe as novidades!

--

--