As coisas que nos fazem ser quem somos

Revista Blooks
Revista Blooks
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5 min readMay 11, 2018
(Foto: Weber Fonseca)

Cresci entre Livros e filmes

Vêm-me à mente A narrativa trivial, de Flávio Rene Kothe, que revela o repetitivo que há em muitas linguagens que se dizem inovadoras, Um defeito de cor, de Ana Maria Gonçalves, que reaviva a consciência da perseverança dos ancestrais africanos, e Olhares de Cláudia Wonder, da própria, que me confirmou a delícia de ser a mulher que sou.

Ainda no espaço desta que vos escreve, indico os filmes Vista minha pele, que explica como o racismo é ridículo, Soldier´s Girl, ou Um Amor na Trincheira (OI?), que retrata a força e a fragilidade de amar e ser amada, em um mundo de ódio, e Pro dia nascer feliz, ao qual sempre recorro para lembrar por que escolhi ser professora.

Jaqueline Gomes de Jesus

é carioca, nascida em Brasília. Professora doutora de Psicologia do IFRJ, possui pós-doutorado pelo CPDOC/FGV. Autora de publicações científicas sobre trabalho, identidade e movimentos sociais, destaca os livros Transfeminismo: Teorias e Práticas (Metanoia, 2014) e Ainda que tardia: escravidão e liberdade no Brasil contemporâneo (Gramma, 2016). É colunista das revistas AzMina e Global Sustentável. Recebeu a Medalha Chiquinha Gonzaga.

(Foto: Dani Costa Russo)

Don’t hide yourself in regret

Eu já lia e escrevia quando o álbum Born This Way, da Lady Gaga, foi lançado. Escrevia, mas escondia minhas palavras em gavetas e HDs de computador. Ensaiava minhas palavras para mim mesma. Foi um processo duro, esse de tomar braveza e aceitar que o que eu escrevia poderia ser compartilhado e lido por outras pessoas, mas esse álbum inteiro foi uma grande descoberta do poder das palavras. Da faixa-título (cantando “gay, lésbica, transgênero, negro, branco, bege, oriente”) a Americano — quando Gaga diz “eu não falo o seu americano” — entendi que palavras precisam ser ditas porque há muito mais por trás delas. Cada palavra escrita precisa ser gritada. Por questão de identificação, de catarse e de coragem.

Até hoje a Lady Gaga é uma grande inspiração para minha visão sobre a literatura e esse álbum virou tatuagem na minha panturrilha.

Jarid Arraes

é escritora, cordelista e poeta. Autora dos livros As Lendas de Dandara e Heroínas Negras Brasileiras, também tem mais de 60 títulos publicados em literatura de cordel. É criadora e mediadora do Clube da Escrita Para Mulheres, em São Paulo.

(Foto: Acervo pessoal)

Leia mulheres

O que mais motiva os estudantes universitários atualmente são discussões sobre gênero e raça, e o convívio com as turmas de graduação me estimula a ler mulheres. Três em especial têm feito minha cabeça: a nigeriana Chimamanda Adichie, a bielorrussa Svetlana Alexievich e a italiana Elena Ferrante. Em seus romances e obras de não ficção, elas têm um olhar riquíssimo sobre a história contemporânea de seus países, abordando guerras, revoluções e identidades em mutação em meio às migrações globais. Sempre com muita sensibilidade para as perspectivas que entusiasmam meus alunos de Relações Internacionais e que, espero, me ajudam a ampliar horizontes.

Maurício Santoro

é cientista político, professor do Departamento de Relações Internacionais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, e apaixonado visceral por todo tipo de literatura, inclusive pela boa.

(Foto: Mariana Quintão)

Bezerra da Silva

A educação que recebemos é um reflexo da cultura praticada na nossa sociedade. Sobre a educação musical que tive, dois opostos no encontro. Minha mãe evangélica me aproximou da música gospel, enquanto meu pai, mais entregue aos prazeres da vida, me apresentou a chamada “música profana”. A minha bíblia de irreverência, crítica social e política e amor pelo legado negro começou com a discografia de Bezerra da Silva, um presente na vida que o meu Gonga apresentou.

O cara era a voz do morro, falava a linguagem certa, se fazia entender e conquistou dos bandidos do morro aos bandidos de terno e gravata. Apesar de morar na favela e existir todo um extermínio da população negra pela polícia, Bezerra conseguiu ser amado pelos canas, que ficavam torcendo para ouvir sobre suas corporações nos sambas. Bezerra era muito sagaz, pernambucano, se tornou o malandro mais malandro do Rio de Janeiro. Músicas como Malandragem dá um tempo, Candidato Caô Caô, A semente, Erva proibida, as músicas sobre a legalização tornaram-lhe ícone do movimento antiproibicionista. Certamente é uma das maiores referências das minhas músicas. Outro mestre é Gonzaguinha, mas essa será outra conversa!

Doralyce Gonzaga

é cantora e compositora pernambucana, radicada no Rio de Janeiro. Antes de se mudar para o Rio, cresceu dividida entre Olinda e a zona da mata sul do estado de Pernambuco, em Palmares. A cantora traz as influências rítmicas advindas do sítio histórico de Olinda, representando a força feminina no maracatu, coco, manguebeat, rock, ijexá, caboclinho e maculelê. Em 2012, lançou seu primeiro EP intitulado Hoje. Em 2014, entrou para o grupo artístico Percussivo Conxitas, criou a banda Dorah e A Maré Alta e iniciou sua carreira no teatro. Em 2017, lançou na internet o single Miss beleza universal, em que ataca e critica os padrões femininos de beleza, e hoje atua num espetáculo chamado Isso dá um samba, do Gene Insanno Companhia de Teatro, cujo texto é baseado na vida dos três malandros: Bezerra da Silva, Dicró e Moreira da Silva.

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