Ser editor

Revista Blooks
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3 min readMay 6, 2018

Texto de Braulio Tavares
Originalmente escrito para a Revista Blooks #1

Alguém já disse que, depois do autor, a pessoa a quem a gente deve ajoelhar e agradecer por um bom livro é o tradutor. Eu concordo, mas estendo essa condição ao editor.

Ele é o cara que, numa pilha enorme de envelopes pardos, achou essa história pra mim. E não leu somente ela. Leu umas cem, e das cem tirou meia dúzia, inclusive esta. Por causa dele eu acabei de lê-la agora e a achei sensacional.

O editor a publicou sabendo que um dia um leitor anônimo, na outra banda do mundo, acabaria lendo aquilo, entusiasmado, e talvez nem pensasse no quanto seria remota a chance de ter lido aquela história se não fosse por esse editor. Ele é um descobridor. Um dia, já velho, ele vai estar numa mesa cheia de camaradagem, alguém vai erguer um brinde a ele chamando-o de “descobridor de talentos” e ele vai dizer: “Pois é, eu ainda lembro como fiquei em dúvida, ‘puxa vida, quem é Fulano de Tal, quem é Sicrano’, dirá o público. Quem vai se interessar em ler? Mas fui lá e banquei! Por que? Porque eu sabia!”

Mas nem sempre o editor sabe. Ou melhor, quase nunca. Digo isso porque do lado de quem publica a esperança é sempre a mesma: “É este aqui que vai decolar, entrar em órbita, puxar minha conta bancária lá pra cima e me dar a iniciativa do jogo.” Em cada livro que a gente publica, vemos o maior jeitão de best-seller. Pensamos nisso com tanta força que quando, num belo dia, um dos livros efetivamente vende bem, a gente chega a ver naquilo um anticlímax, uma moeda que só nos chega às mãos depois de desvalorizada.

Para criar livro alheio, precisa ter os mesmos cuidados e o mesmo carinho que se tem com o livro seu. O livro é a obra do editor. O escritor forneceu apenas o texto literário, sem dúvida o mais importante de tudo, mas por isso mesmo é preciso fazer um livro à altura.

O texto é de quem escreve. O livro é de quem publica.

Mesmo quando os livros encalham, mesmo que se tenham vendido somente uns cem exemplares, o editor pode pensar nesses leitores agradecidos e achar que valeu a pena. E não nos custa imaginar que às vezes o único propósito de haver uma primeira edição dos poemas que um tal de Aaron Klopstein publicou em Dresden em 1951 é que o derradeiro exemplar desse livro seja encontrado em um sebo de Nova York, em 2008, para que ele, desde então, venda em poucos anos mais de dois milhões de exemplares em cinco países. Tudo o que certos livros precisam é não desaparecer. Se não desaparecerem, sua história irá acontecer, mesmo que seja com décadas de atraso. O editor é justamente o cara que providencia esses milagres.

Braulio Tavares é escritor, poeta, tradutor e compositor. Estudou Cinema e é pesquisador de literatura fantástica. Possui uma coluna diária no Jornal da Paraíba.

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