É possível reduzir o desperdício

A existência do setor agrícola é imprescindível para a manutenção da dinâmica social vigente, contudo é preciso refletir sobre os métodos hoje implementados nessa cadeia a fim de mitigar prejuízos sociais, econômicos e ambientais

Victória Pagani Samora Sousa
Revista Brado
4 min readJan 12, 2021

--

Foto: Caritas Mexicana

“A redução do desperdício de alimentos poderia não apenas reduzir a pressão sobre os recursos naturais limitados, mas também aliviar a necessidade de aumentar a produção de alimentos para dar de comer a uma crescente população mundial”, afirmou Achim Steiner, diretor do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) em informe recente.

É preciso compreender que nosso planeta possui recursos finitos e escassos, dessa forma desperdiça-los não pode ser uma opção, o que, infelizmente, ocorre em todas as etapas da produção de alimentos. Antes do alimento chegar ao consumidor final, foram utilizados muitos recursos como: água, solo, adubos, insumos, energia elétrica, combustíveis fósseis, mão de obra, entre outros; que serão jogados no lixo junto com o alimento.

Foto: Metthew T Rader/Unsplash

Quanto mais próximo do consumo um produto alimentar se perde na cadeia, maiores são as consequências ambientais, de acordo relatórios da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO). A cada etapa, o custo ambiental do início da produção de comida aumenta ao incorporar custos de processamento, transporte, armazenamento e utilização.

Dados da FAO revelam que, por ano, aproximadamente um terço dos alimentos produzidos em todo o mundo não é consumido pela população, sendo perdido em alguma etapa da cadeia de produção ou desperdiçado no elo final, em restaurantes e residências. Isso representa cerca de 1,3 bilhão de toneladas de alimentos que não são aproveitados ou, em valor monetário, uma quantia aproximada de US$ 1 trilhão. Além de custos econômicos, a organização estima que os custos ambientais sociais do desperdício de alimentos alcançam US$ 700 bilhões e US$ 900 bilhões, respectivamente. Na somatória da tríade de custos — econômicos, ambientais e sociais, a estimativa total do desperdício de alimento gira em torno de US$ 2,6 trilhões por ano, o que equivale ao PIB do Reino Unido — quinta maior economia do mundo.

“Não podemos permitir que um terço do total de alimentos que produzimos seja perdido ou desperdiçado devido a práticas inadequadas, quando 870 milhões de seres humanos estão famintos diariamente”, disse o brasileiro José Graziano da Silva, diretor-geral da FAO.

Imagem: William West/AFP

A lógica é bem simples: quanto maior o desperdício, maior a produção de alimentos; quanto maior a produção de alimentos, mais áreas agricultáveis serão necessárias; quanto mais áreas agricultáveis forem necessárias, maior o desmatamento, a desapropriação de terras, além de um maior consumo de água, de insumos, de pesticidas, de combustíveis fósseis, entre outros. Segundo a FAO, “a cada ano, os alimentos produzidos sem ser consumidos causam um gasto de água equivalente à vazão anual do Volga”, o rio mais longo da Europa, que atravessa parte da Rússia, “e são responsáveis por gerar na atmosfera 3,3 bilhões de toneladas de gases de efeito estufa”.

Será que nosso planeta aguenta isso?

Fontes: MDS, Embrapa, Emater.

Dessa forma, se faz emergencial investir em tecnologias para reduzir as perdas durante o processo de cultivo e colheita no campo, além de formas mais eficazes de transportar todo esse alimento, a fim de prolongar a sua vida útil. Assim, seria possível diminuir a pressão antrópica sobre o meio ambiente e preservar grandes áreas com vegetação original, além de suprir as necessidades de uma população em constante crescimento.

Somado a tudo isso, é imprescindível trabalhar a educação e cidadania dos brasileiros a respeito dos prejuízos acumulados pelo desperdício, para que esses tomem para si a responsabilidade dos seus atos enquanto consumidores. Com essa finalidade, faz-se preciso desconectar padrões mercadológicos de perfeição estética do conceito de alimento próprio para consumo, pois muitos alimentos são jogados fora por estarem “feios”, mesmo estando adequados ao consumo humano. Além disso, pode-se incentivar mais compras da semana do que compras do mês, pois comprar somente aquilo que será consumido ao longo da semana evita que esses alimentos apodreçam e sejam desperdiçados.

Foto: Oriol Portell/Unsplash

As grandes empresas que comercializam alimentos também possuem uma enorme parcela de responsabilidade no transporte, estocagem e redistribuição desses alimentos. Muitos exemplos de práticas antidesperdício já se mostram bem eficientes e rentáveis no cenário global, a exemplo do grupo de hipermercados de origem francesa -Carrefour- que, além de doar mais de 2,5 mil toneladas de alimentos para programas de combate à fome aqui no Brasil, desenvolve programas de oferta de frutas e legumes de qualidade, porém fora do padrão de comercialização, com descontos de até 40% ao consumidor; e o Rebaixa , que comercializa com 50% de desconto alimentos com data de validade próxima do vencimento.

Pesquisa da Associação Brasileira de Supermercados (Abras) aponta que as medidas começam a surtir efeito. Em 2017, o setor perdeu R$ 3,927 bilhões nas seções de açougue, frutas, legumes e verduras (FLV), padaria e peixaria. O montante, em 2016, foi de R$ 3,981 bilhões, R$ 54 milhões a menos. Em 2015, o desperdício representava R$ 4,8 bilhões.

E você, qual a sua parcela de responsabilidade nesse cenário?

--

--