25 de julho: Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha

É muito mais que uma data de celebração: é o dia em que as mulheres negras, as de povos indígenas e comunidades tradicionais refletem e fortalecem as organizações voltadas às mulheres negras e à heterogeneidade de suas lutas

Karina Lima
Revista Brado
4 min readJul 25, 2020

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Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha — Foto: Divulgação/EBC

A partir de 1992, um grupo de mulheres decidiu que era preciso uma organização para reverter dados que desumanizam a população negra. Elas concluíram que a solução para as desigualdades só poderia surgir através da união entre as mulheres negras. Assim, elas organizaram o primeiro Encontro de Mulheres Negras Latino-Americanas e Caribenhas em Santo Domingos, na República Dominicana, ao qual levaram discussões sobre os diversos problemas e as possíveis alternativas. Foi desse encontro que passou a ser celebrado o dia 25 de julho como o dia da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha e a data foi reconhecida pela ONU ainda em 1992. No Brasil, a ex-presidenta Dilma Rousseff (PT) transformou a data em comemoração nacional em 2014. Desde então, foi instituído, por lei, o dia 25 de julho como o Dia Nacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha e também o dia de Tereza de Benguela, líder quilombola que viveu onde atualmente é o estado de Mato Grosso durante o século XVIII.

Além de reconhecer as dificuldades enfrentadas pelas mulheres negras na América Latina e Caribe no século XXI — que são comprovadas em todas as pesquisas mais recentes em busca de políticas públicas inclusivas —, o dia 25 de julho traz consigo um resgate histórico energético. Não é uma data menos importante do que as prestigiadas há mais tempo. Pelo contrário, é uma data necessária para validar as batalhas por direitos — que frente à conjuntura política, podemos perder rapidamente. Dentre elas, podemos destacar algumas conquistas, tais como: saúde da população negra, a Lei Maria da Penha, as Leis n, 10.639/2003 e n, 11.645/2008, que tornam o ensino da história e cultura Afro-Brasileira e indígena obrigatório nas escolas, a lei do trabalho doméstico, sistema de cotas, entre outros marcos do combate às marcantes desigualdades históricas da América Latina.

Negar a política de ensino da cultura afro-brasileira e indígena nas escolas é negligenciar as origens da brasilidade. O país foi, em grande parte, construído através do sacrifício da mulher negra, que foi ama de leite, babá, escrava, amante e prostituta para diversas gerações de brasileiros, bem como ocorria em outros países. A chegada das mulheres africanas é um dos marcos da formação social nacional. As escravas sofriam dupla exploração: além de serem escravizadas sofrendo violência racial, também foram exploradas sexualmente, reforçando a objetificação e fetichização do corpo da mulher negra, presentes ainda na contemporaneidade. Além disso, o avanço neoliberal sobre as terras indígenas, somado à política higienista nas cidades, designa a violência patriarcal característica de um sistema com princípios colonizadores. De acordo com relatório da ONU, mais de uma em cada três mulheres indígenas são estupradas ao longo da vida.

A luta também segue contra o encarceramento em massa da população negra, que é um reflexo do racismo institucional presente no judiciário brasileiro. No continente americano, esse fenômeno também está diretamente associado à adoção do modelo neoliberal. O endurecimento das leis penais e a resultante superlotação carcerária é um dos instrumentos de um sistema que aprofunda a injustiça e a desigualdade, um sistema cujo objetivo é proteger o interesse das classes economicamente dominantes. Embora o encarceramento seja uma realidade mais presente na vida dos homens negros, o Brasil é o quarto país que mais prende mulheres; e dessas, 62% são negras — vale destacar que dentro das prisões as mulheres continuam sendo alvo de um abuso sexual cruel.

Foto: Reprodução/Google

A data é importante para compreender que o histórico das lutas citadas é coletivo e que essas demandas atingem toda a estrutura social. As mulheres negras ocupam a posição mais baixa da pirâmide hierárquica do Brasil e são as que mais sofrem pela desumanização. As reivindicações que são discutidas nas organizações durante o dia 25 de julho são pautas fundamentais para a ampliação dos debates sobre os diversos tipos de opressões, pois interferem diretamente na vida de outros grupos subjugados.

As mulheres negras, juntamente com as indígenas e as mulheres de comunidades tradicionais, saem às ruas para denunciar o machismo, o feminicídio, a lesbofobia, a transfobia, a bifobia, o racismo, a sociedade de classes, a precarização do trabalho e tantas outras opressões, tornando, portanto, importante e urgente a união da agenda das lutas e a celebração desta data.

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Karina Lima
Revista Brado

Estudante de Jornalismo (UFES) | Pesquisadora | Colunista da Revista Brado