Adeus à bandeira vermelha: produza energia de casa

Por meio do biogás, comunidades inteiras podem se sustentar a partir de restos que iriam para o lixo

Pedro Fabriz
Revista Brado
4 min readSep 22, 2021

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Foto: Divulgação/Suderbyn Permaculture Ecovillage

Já publicamos alguns textos na Brado sobre a crise energética que o Brasil atravessa, causada sobretudo por uma intensa crise hídrica. Isso porque a matriz energética brasileira é majoritariamente composta pelas hidrelétricas, e quando essas não dão conta de suprir a demanda, é preciso ligar as termoelétricas — no Brasil, majoritariamente usinas de carvão –, o que nos leva à tão conhecida bandeira vermelha. Embora nossa matriz seja mais sustentável e limpa que a média global, ela é pouco diversificada e não aproveita a variedade de possibilidades que o território brasileiro nos oferece. Conhecemos algumas alternativas de cor — que já foram temas de textos nesta editoria, inclusive: energia solar, eólica, nuclear, e a lista não para. Mas você sabia que há uma forma de produzir energia para suprir a sua casa a partir da sua própria vizinhança?

Você certamente já foi lavar a louça depois do almoço e se deparou com o ralo da pia entupido por cascas e restos de vegetais e frutas que foram utilizados na refeição mais cedo. Imagine então transformar esses restos em energia para sua casa. Sim, isso pode acontecer, graças a um processo chamado fermentação anaeróbica.

Esse processo, desempenhado por bactérias e fungos, por exemplo, consiste na obtenção de energia sem a presença de oxigênio. Quando em um ambiente como digestores herméticos, esse processo libera o que podemos chamar de biogás, uma alternativa mais verde/sustentável e que pode produzir energia elétrica, térmica e até veicular.

Esquema exemplificando o processo de formação do biogás. Infográfico: Reprodução/Infoescola.

O biogás é formado majoritariamente por metano, mas também se constitui de dióxido de carbono, sulfeto de hidrogênio e vapor de água. Não se assuste com o dióxido de carbono citado como componente, uma vez que esse CO₂ foi absorvido anteriormente no processo pela biomassa.

Portanto, a partir da decomposição de matéria orgânica em ambiente sem oxigênio é possível alimentar dispositivos elétricos e ser usado em forma de energia térmica. Mas qual o tamanho do digestor necessário para isso? E como podemos usá-lo para garantir acesso à energia barata, confiável, sustentável e renovável para todos? Afinal, esse é o tema do Objetivo 7 na lista de 17 dos listados na Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável.

Texto publicado no site The Conversation traz alguns exemplos de aplicações desse processo para geração de energia, como o micro-digestor Methanogen em Londres, que foi instalado em um centro comunitário e é alimentado com os resíduos de alimentos e de jardins de casas das redondezas. Além disso, esse micro-digestor é administrado por moradores voluntários do local, incentivando-os a cultivar mais os próprios alimentos e promovendo a saúde física e mental no processo. Outro exemplo é o digestor construído a partir de materiais zero carbono (aliás, uma ecovila inteira foi construída com material zero carbono) na ilha sueca de Gotland.

O projeto Living Lab é um modelo de sustentabilidade urbana baseado na comunidade e demonstra um sistema inovador de energia a partir de resíduos de alimentos em ciclo fechado, oferecendo novas oportunidades para engajamento público, participação local, educação e treinamento. Cultivamos uma ampla variedade de alimentos; colhemos para criar refeições nutritivas em nosso café comunitário; digerimos resíduos alimentares para criar biogás renovável e fertilizante líquido; utilizamos o fertilizante para aumentar o crescimento da planta; e usamos biogás para cozinhar e aquecer espaços internos de cultivo no inverno. (Texto retirado e traduzido do site oficial do Calthorpe Community Garden).

Foto: Divulgação/Suderbyn Permaculture Ecovillage

As fontes para a produção de Biogás são incontáveis e também há o aproveitamento de subprodutos como o fertilizante, favorecendo um processo bastante sustentável. Mas então por que não temos mais desses exemplos espalhados por aí? O mesmo artigo comenta sobre um estudo feito anteriormente para entender o porquê da pouca aplicação do processo e os motivos encontrados estão relacionados ao baixo conhecimento da comunidade sobre o assunto, além da falta de incentivo financeiro e tecnológico, uma vez que é necessário certo conhecimento para construção e administração do digestor. Além da instalação do digestor, é ideal envolver uma comunidade de casas/moradias no processo, e para isso é necessário pensar na logística de transporte dos resíduos, armazenamento correto e incentivo ao engajamento dos moradores.

O desenvolvimento de um projeto como esse só sai do papel com incentivo do governo e conscientização da sociedade sobre os problemas que enfrentamos e iremos enfrentar no futuro por conta de uma matriz energética pouco sustentável. Projetos como os citados nesse texto nos fazem lembrar da importância do agir local. Muitas vezes esperamos soluções milagrosas em escala global, mas temos alternativas até mais interessantes que podem ser aplicadas em nossa comunidade em escala menor.

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Pedro Fabriz
Revista Brado

Estudante de Engenharia Elétrica. Cofundador e Programador da Atitude Ubuntu e apaixonado por Ciência e Tecnologia. Colunista e Editor da Revista Brado.