Animações retratam o dia a dia de afegãos sob domínio do Talibã

“Os Olhos de Cabul” e “A Ganha-Pão” expõem regras rígidas e punições violentas a que a população afegã foi submetida

Camila Borges
Revista Brado
3 min readAug 27, 2021

--

Imagem: Reprodução de cena da animação “Os Olhos de Cabul”

“Histórias ficam no coração mesmo quando tudo se foi”. (A Ganha-Pão, 2017).

Dias atrás o mundo recebeu a notícia de que militantes do Talibã haviam retomado Cabul, capital do Afeganistão. A retomada ocorreu após a decisão do governo dos Estados Unidos de retirar suas tropas, que completavam quase vinte anos no país. A preocupação da comunidade internacional é que ocorram retrocessos em relação aos direitos da população.

O Talibã é um grupo de ex-combatentes da resistência afegã, formado em 1994. Os membros defendem a imposição da sua interpretação da Sharia, a lei islâmica, e são contra qualquer ocupação estrangeira no Afeganistão.

Durante os cinco anos (1996–2001) em que o grupo governou o Afeganistão, diversas atrocidades foram cometidas em nome da interpretação da Sharia. Fuzilamentos, apedrejamentos, amputações, chicotadas eram algumas das punições executadas em quem agisse contra as determinações. As mulheres não podiam sair de casa sem parentes do sexo masculino, nem podiam estudar ou trabalhar. Na época era obrigatório o uso da burca de cor azul que cobre o corpo todo, e no rosto possui apenas uma redinha frente aos olhos.

“A Ganha-Pão”, de Nora Twomey, e “Os Olhos de Cabul”, de Zabou Breitman e Eléa Gobbé-Mévellec, se destacam por serem duas animações que retratam esse período duro da história dos afegãos. A leveza das cores e do formato entra em contraste com o tema sério e reflexivo abordado por ambos.

Personagem Parvana com o pai na animação “A Ganha-Pão” (2017) (Reprodução)

A primeira animação conta a história de Parvana, garota afegã que finge ser um menino para poder trabalhar e sustentar sua família após o pai ter sido preso pelo regime. Desde cedo o pai ensina Parvana e seus irmãos a importância das histórias contadas de forma oral como uma tradição daquele povo. Em uma conversa com a filha, ele conta como foi sua infância no país:

“Quando eu era novo, Parvana, eu conheci a paz aqui na cidade. As crianças iam para a escola, as mulheres iam para a universidade. Não havia conflito entre os impérios por um tempo, mas isso não durou muito. O chão estremeceu sob nossos pés, sempre oscilante. Primeiro, um golpe de estado, depois a Invasão e a guerra civil. No caos, procuravam quem pudesse restabelecer a ordem, mas o preço foi alto”.

Em “Os Olhos de Cabul” acompanha-se a história de um casal, Mohsen e Zunaira, que são contra as novas regras duras dos militantes fundamentalistas. No entanto, logo no início Mohsen comete um erro que abala de forma irreversível a relação dos dois. Cada cena parece uma pintura, o traço é belo, mas o seu conteúdo é triste e trágico. É possível compreender um pouco do sufoco de ser uma mulher debaixo da política extremista daqueles anos.

Zunaira, jovem afegã de “Os Olhos de Cabul” (Reprodução)

“É preciso viver!” é o que exclama um dos personagens do longa em dado momento. Principalmente no cenário atual, as animações são um excelente meio de acessar uma realidade distante do povo ocidental, a fim de entendê-la e enxergá-la de forma crítica. As histórias desse povo devem continuar sendo contadas. É preciso viver.

Gostou deste texto? Deixe seus aplausos (eles vão de 1 a 50) e compartilhe.

Siga a Brado nas redes sociais: Instagram; Facebook; Twitter; e LinkedIn.

--

--

Camila Borges
Revista Brado

Graduada em Jornalismo pela Universidade Federal do Espírito Santo | Colunista de Cultura da Revista Brado