Artistas reclamam de baixa remuneração das plataformas de streaming

Samara Elisa
Revista Brado
Published in
5 min readAug 22, 2021
Foto: David Pupaza/Unsplash

Já faz algumas décadas que a nossa forma de consumir música vem mudando rapidamente. Passamos pelo vinil, CD, rádio, MP3 e YouTube, até chegar às populares plataformas de streaming atuais, como Spotify e Deezer. Embora todos os meios coexistam até hoje, essas plataformas garantiram seu lugar no mercado pela praticidade, variedade e valor acessível. Mesmo com todas essas vantagens para os consumidores, muitos artistas não recebem um valor adequado pelo seu trabalho, principalmente os independentes.

Apesar de serem uma ótima opção para popularizar e facilitar o consumo de música, isso não quer dizer que seja uma plataforma democrática, principalmente quando falamos dos algoritmos que sempre nos recomendam os artistas que estão em alta ou aqueles mesmos de sempre que ouvimos todos os dias.

Além da valorização de quem já é estabelecido no mercado musical, a remuneração dos artistas não é esclarecida para o grande público. O site Digital Music News fez um levantamento de quanto é pago para os artistas por play em algumas das maiores plataformas de streaming. Em primeiro lugar está a Napster, que apesar de perder em número de downloads e assinantes para outras mais populares, paga US$ 0,019 por cada play. A Apple Music não fica muito atrás: a marca anunciou este ano que pagaria US$ 0,01 por play. Outra popular no Brasil é a Deezer, que paga US$ 0,0064 por play. Já o Spotify, streaming mais consumido por brasileiros, é uma das plataformas que menos remunera os artistas: seus plays variam entre US$ 0,003 e US$ 0,005, números que foram caindo ao longo dos últimos anos. Esses valores podem variar, dependendo do usuário ser pagante ou não, do país e outros fatores.

Pegando o exemplo do Spotify, US$ 0,003 representa, em reais, R$ 0,016. Sendo assim, para garantir pelo menos um salário mínimo mensal seria necessário que um artista recebesse pelo menos 68.750 plays por mês. Levando em consideração que esse valor é repassado para quem detém os direitos da música, como gravadoras ou distribuidoras, além do compositor, músicos, entre outros, para muitos artistas não é viável depender dessa plataforma para conseguir seu sustento. Também vale ressaltar que esse valor não representa lucro, pois gravações e produções são gastos que fazem parte desse trabalho e não seriam cobertas por essas quantias.

Muitos artistas não concordam com essa forma de remuneração e vêm realizando protestos para que esse valor seja aumentado ou para que o modelo de pagamento seja alterado. No ano passado, o co-fundador do Spotify Daniel Ek rebateu a críticas a respeito da remuneração da plataforma: “Nesse cenário futuro, você não pode gravar música a cada três ou quatro anos e achar que isso será o suficiente. Os artistas atuais que estão percebendo que se trata de criar um envolvimento contínuo com seus fãs. É sobre colocar o trabalho, contar histórias ao redor do álbum e manter um diálogo contínuo com seus fãs”.

Daniel Ek, co-fundador do Spotify. Foto: Getty Images

Por conta de sua fala, Daniel foi bastante julgado por não levar em consideração que nem todos os artistas têm condições para lançar músicas a todo momento, além da questão de que a arte não é produzida na mesma velocidade que o mercado demanda. Os artistas não deviam ser pagos somente levando em consideração a frequência de seus lançamentos, já que isso se torna viável somente para os grandes artistas da indústria musical. Na verdade, até grandes artistas passam anos sem lançamentos, como a Rihanna — que não lança um novo álbum há 4 anos e vem sendo cobrada por um novo lançamento a todo o momento por seus fãs, mas devido ao grande alcance mundial suas músicas continuam tendo plays a todo momento. Essa lógica não se aplica a artistas que estão iniciando a carreira.

Cantores famosos também questionam essa forma de remuneração das plataformas. Em 2015, a cantora Taylor Swift tirou seu álbum ‘1989’ da Apple Music, alegando que eles não pagavam aos artistas durante o período gratuito de teste dos usuários — que são os 3 primeiros meses de assinatura. Após essa pressão da artista, a Apple mudou sua forma de remuneração e agora o valor será pago independente do plano dos clientes. Se até a Taylor Swift, que possui reconhecimento, prêmios e muito dinheiro, questionou esse problema dos streamings, podemos imaginar o quanto isso afeta os pequenos músicos.

Capa do álbum ‘1989’. Foto: Reprodução

Esse é um dos maiores problemas das grandes empresas de streaming que “comandam” esse setor, mas existem algumas opções para quem quer ser melhor remunerado pelo seu trabalho musical. Um exemplo disso é o Bandcamp, um site voltado para nichos musicais que tem como intuito fazer com que os fãs consumam as produções de seus artistas preferidos e paguem diretamente a eles. A plataforma fica com somente 15% de comissão das vendas digitais. No ano passado, devido à pandemia, eles tiveram a iniciativa de toda primeira sexta-feira do mês abrir mão de sua comissão, então todo o dinheiro recebido é destinado diretamente para os selos e seus artistas.

Logo do site Bandcamp. Foto: Reprodução

Outro ponto interessante é que a quantidade de vezes que a música foi executada fica disponível somente para o próprio artista, indo de encontro com a lógica de competição das redes sociais de uma forma geral. Assim o consumidor não se questiona se a obra é boa ou ruim baseada somente em números. O problema da plataforma é que o valor que os ouvintes pagam pelas músicas é todo em dólar. Levando em consideração a cotação da moeda no momento, nem sempre é viável para os brasileiros, e por isso a Bandcamp não é tão popular no país. Mas é interessante para quem já tem uma base de fãs disposta a pagar pelo seu trabalho.

Apesar desses problemas apontados, os serviços de streaming acabam funcionando melhor como uma vitrine para que suas músicas sejam facilmente encontradas do que uma forma de ganhar dinheiro e se sustentar. Por isso, é importante continuar cobrando dessas grandes empresas para que os artistas sejam devidamente remunerados, até porque a música também é um trabalho. Além disso, sempre valorizar a iniciativa pública, mesmo que cada vez mais desvalorizada, muitas vezes ainda é mais garantido do que depender de empresas privadas.

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