A arte de ler mentes

Pedro Fabriz
Revista Brado
Published in
4 min readMay 26, 2021
Imagem: Pixabay

A busca do ser humano por entender o próprio cérebro talvez seja a maior e mais incessante jornada na ciência atual. Muitos campos de estudo e diversos tipos de especialistas dedicam grande parte da carreira para entender o funcionamento complexo desse órgão e tentam, de alguma forma, usar isso para nos ajudar a evoluir no aspecto tecnológico.

Muitos algoritmos de Inteligência Artificial são baseados no que se acredita ser o funcionamento do cérebro, como por exemplo o algoritmo da Siri. Também temos as próteses robóticas que são controladas pelos sinais cerebrais e musculares, um exemplo de como o cérebro está de certa forma ajudando a recuperar membros perdidos em acidentes ou doenças. Isso sem falar nos implantes cerebrais, principalmente os recentemente anunciados pela empresa Neuralink, que promete chips cerebrais para ajudar no tratamento de transtornos.

Implante cerebral feito no topo da cabeça. Imagem: Reprodução/Neuralink

Essa última atingiu o público de formas variadas. A ideia de um chip implantado no cérebro já foi objeto de conspirações de “controle mental”, o que causa medo em muitas pessoas, afinal, é um objeto estranho e invasivo. Mesmo com a promessa de ajudar nos tratamentos de transtornos e acelerar as pesquisas na área cerebral, uma vez que impulsionamos o entendimento de como esse órgão funciona, ainda é uma ideia que incomoda. Mas e se pudermos avançar nesse campo utilizando tecnologias não invasivas?

Foi nessa linha de pensamento que pesquisadores da Caltech lançaram mão em um novo modo de “ler mentes” sem ter contato físico com o cérebro. Utilizando ondas sonoras (Ultrassom), amplamente utilizadas no período de gestação de mulheres grávidas para ver imagens do feto, o estudo mostrou ser possível capturar mudanças no volume do sangue em certas áreas do cérebro com 100μm (micrometros) de resolução utilizando ultrassom funcional — fUS (functional Ultra Sound). Para se ter ideia, um fio de cabelo tem em média de 60 a 120μm.

Utilizando esses dados de mudança de volume para alimentar um algoritmo de machine learning é possível prever/decodificar qual será o movimento antes mesmo que ele realmente ocorra, sendo possível, assim, ler mentes.

O estudo em questão fez experimentos em macacos — e conseguiu decodificar as intenções de movimento dos olhos e também gestos das mãos, com até 90% de eficiência (a cada 10 gestos feitos pelo macaco, 9 foram previstos pelo computador), o que é realmente muito bom comparado com a decodificação de sinais originados por outros tipos de sensores e tecnologias.

Em entrevista para a SingularityHub, Dr. Mikhail Shapiro, um dos pesquisadores presentes no estudo, comentou que a questão fundamental que o experimento buscou responder foi se existe a possibilidade de criar uma tecnologia que permita decodificar nossas intenções a partir de práticas não muito invasivas e que gerem resultados com boa resolução.

Essa tecnologia resolve alguns problemas encontrados até então em métodos já difundidos e utilizados na comunidade científica. Muitas interfaces neurais dependem de acesso direto ao tecido cerebral, fazendo com que o sujeito passe por cirurgias com risco significante. Além do fato da possibilidade de infecções e a difícil escalabilidade do produto. Outras tecnologias como a eletroencefalografia (EEG) e ressonância magnética funcional (fMRI) apresentam alguns problemas de resolução e os sinais captados demandam um processamento fino e adequado para decodificar o que está acontecendo no cérebro.

Capacete com eletrodos —eletroencefalografia não invasiva. Foto: Pixabay

Pesquisas como essa fortalecem o campo da Interface Cérebro-Computador e fornecem novos caminhos para estudar e ajudar seres humanos com menos riscos. A utilização dessa tecnologia de previsão de movimento pode ser usada para controlar próteses e órteses, sendo que a pessoa só precisa literalmente pensar para executar um movimento. Além disso, qualquer outra limitação física encontrada por nós humanos devido a doenças ou acidentes pode ser resolvida se o cérebro estiver funcionando. Colocando dessa forma, talvez a ideia de ler as nossas próprias mentes não seja tão assustadora assim.

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Pedro Fabriz
Revista Brado

Estudante de Engenharia Elétrica. Cofundador e Programador da Atitude Ubuntu e apaixonado por Ciência e Tecnologia. Colunista e Editor da Revista Brado.