EDITORIAL: O estupro da menina de 10 anos, infelizmente, não é um caso isolado

Revista Brado
Revista Brado
Published in
3 min readAug 18, 2020
Foto: Elza Fiúza/Agência Brasil

O último final de semana foi marcado por calorosas discussões acerca de um aborto a ser realizado em uma menina de 10 anos. A criança era estuprada pelo tio dentro da própria casa desde os seus 6 anos e descobriu a gravidez de 22 semanas após procurar um hospital se queixando de dores abdominais. A gravidez foi interrompida na manhã desta segunda-feira em um hospital de referência, em Pernambuco. De acordo com a direção do hospital, a menina passa bem.

Em meio a argumentos contra e a favor do procedimento, o fato é que a notícia choca e indigna a população pelo seu caráter grotesco. Entretanto, infelizmente, não é possível dizer que se trata de um caso excepcional. Só no Espírito Santo, é registrado um estupro de vulnerável por dia. Em 2020, foram 259 vítimas de violência sexual registradas pela Secretaria de Segurança Pública do Estado. Além disso, dados nacionais apontam que a maioria das vítimas de estupro são meninas de até 13 anos e a maioria das violências são cometidas dentro de casa.

Vale ressaltar que esses são dados subnotificados. Esse caso em questão, por exemplo, só veio à tona com a descoberta da gravidez. Até o momento, por cerca de 4 anos, o violentador ameaçava a vítima, a coagindo de realizar a denúncia. Essa, infelizmente, é a realidade de muitas crianças brasileiras.

Diante dessas informações, evidencia-se uma contradição. Como é possível que o abuso de vulnerável seja tão desprezado pelas massas, mas gere tanta comoção no debate público e continue sendo uma realidade sistêmica? A infeliz verdade é que a sociedade brasileira ainda é cercada não só pela cultura do estupro, mas também por uma cultura da pedofilia.

Esses crimes não estão sendo cometidos por monstros encapuzados em becos escuros, mas dentro de casa, por tios, avôs, pais e irmãos, todos os dias, graças a uma estrutura que sexualiza crianças e culpabiliza as vítimas pelas violências sexuais sofridas.

Não podemos esquecer que este é apenas um dos tantos casos que ocorrem todos dias. Devemos, obviamente, punir os estupradores, mas ir além e pensar na raiz do problema é essencial, para que possamos, assim, evitar perpetuá-la.

Portanto, reavaliar as nossas posturas diante de mecanismos que naturalizam a violência sexual com crianças e mulheres é mais que urgente. Devemos refletir sobre o que está levando tantas crianças a serem vítimas de um crime tão repulsivo. Se posicionar contra a cultura do estupro e a cultura da pedofilia é se posicionar contra possíveis condicionamentos culturais que possam gerar tais violências.

A Revista Brado repudia qualquer tipo de violência sexual e presta solidariedade a todas as vítimas. Além disso, reforçamos a necessidade de nos atentar aos sinais e nos responsabilizar pelas crianças em nossa volta.

Também repudiamos todos os ataques promovidos contra a vítima — neste caso e em todos os demais. É dever de toda a sociedade e sobretudo dos veículos midiáticos combater de forma incisiva e sistêmica todo tipo de violência sexual. Reafirmamos, portanto, o nosso compromisso com esse combate, realizado sobretudo por meio de nossa editoria de Mulheres, composta por colunistas dedicadas e incansáveis nessa luta.

Precisamos proteger nossas crianças.

Denuncie sempre!

Disque 100 para denunciar anonimamente casos de pedofilia e disque 180 para denunciar casos de estupro e quaisquer outros tipos de violência contra a mulher, também de forma anônima.

--

--

Revista Brado
Revista Brado

Perfil oficial da Revista Brado, onde você encontrará informações, opiniões e ideias, para que todos possam ouvir.