As cotas de gênero e a representatividade feminina nas eleições 2020
Uma análise dos resultados das eleições nas 4 maiores cidades do Espírito Santo
As eleições municipais de 2020 foram marcadas pelo grande aumento da participação feminina nas chapas de vereadores. Isso se dá, principalmente, pela regra que obriga os partidos a lançarem entre seus candidatos percentuais de no mínimo 30% e no máximo 70% de cada gênero.
No entanto, diferente das cotas de ações afirmativas, essa regra vale somente para a candidatura. Não é um percentual que se aplica ao número de cadeiras que serão efetivamente ocupadas, tal como é nosso sistema de cotas para ingresso nas Universidades Públicas.
Ou seja, essa regra incentiva mais mulheres a se candidatarem, mas não garante que mais mulheres serão eleitas.
Infelizmente, o ambiente da política ainda é muito inóspito para as mulheres, assim como o ambiente partidário. Enquanto esse cenário persistir, a regra que estabelece percentuais de gênero para as candidaturas não trará mudanças estruturais.
As eleições municipais de 2020 demonstraram isso: em Vitória, por exemplo, a cada 27 candidatos homens, um conseguiu ser eleito; no caso das mulheres foi uma em cada 74 candidatas. Isso significa que independente de termos mais mulheres se candidatando, é quase 3 vezes mais difícil para uma mulher conseguir ser eleita na capital do Espírito Santo.
Em Vitória tivemos um cenário de avanço — tímido — para a representatividade feminina. Em 2016, de 15 vagas, só uma mulher foi eleita na Câmara Municipal de Vitória, Neuzinha de Oliveira (PSDB) que, inclusive, foi a única candidata mulher dentre os 13 concorrentes à Prefeitura em 2020.
No entanto, tivemos um aumento significativo no número de mulheres candidatas a vice-prefeita em Vitória, passando de 2 em 2016 para 8 em 2020, dos 13 concorrentes. Isso reflete uma prática comum dos partidos, de apoiarem mulheres para cargos de vice, que raramente são apoiadas para encabeçarem as chapas como prefeitas.
Além disso, Vitória dobrou o número de mulheres na câmara, elegendo Camila Valadão (PSOL) e Karla Coser (PT), ambas feministas e comprometidas na luta pela igualdade de gênero.
Já na cidade vizinha, Vila Velha, o cenário foi bastante desanimador. Das 3 vereadoras eleitas em 2016, somente Patricia Crizanto (PSB) foi reeleita, sendo agora a única mulher na Câmara dentre os 16 homens eleitos.
Não só na disputa da Câmara o machismo se mostra presente em Vila Velha: na disputa pela prefeitura de 2016, somente uma entre os 6 candidatos era mulher, Professora Liu Katrini (PSOL).
Já em 2020, tivemos uma pequena melhora: dos 11 candidatos, 3 eram mulheres, e dos 11 candidatos a vice-prefeito, 2 são mulheres. No entanto, as chapas que disputaram o segundo turno são compostas unicamente por homens: Max Filho (PSDB) e seu vice Carreta contra Arnaldinho Borgo (PODE) e seu vice Victor Linhalis.
Na Serra, cidade com o maior número de eleitores do Espírito Santo, diminuiu de três para dois o número de vereadoras eleitas, entre 2016 e 2020, sendo que nenhuma foi reeleita. Na disputa da prefeitura, dos 9 candidatos ao cargo, apenas 2 são mulheres; e somente 3 mulheres foram candidatas para o cargo de vice.
Somente Cariacica possuiu uma candidata mulher disputando a vaga para prefeita neste segundo turno: Célia Tavares (PT), que perdeu a disputa no último domingo (29), para seu concorrente Euclério Sampaio (DEM). Na Câmara Municipal de Cariacica, no entanto, a situação é lamentável: nenhuma mulher foi eleita em 2020; diferente de 2016, quando Ilma Siqueira (PSDB) havia sido a única vereadora eleita.
Tudo isso demonstra que algumas conquistas foram alcançadas em relação à representatividade feminina na política municipal dessas quatro cidades, mas ainda temos um longo caminho para de fato atingirmos um patamar mínimo de igualdade de gênero na política.
A regra que impõe a popularmente chamada “cota de gênero” exerce um papel ao incentivar que mais mulheres se candidatem, mas sem uma mudança estrutural no sistema eleitoral, com conscientização dos partidos e das instituições políticas, continuaremos a ter essa sub-representação feminina. Afinal, até que ponto termos mulheres concorrendo a cargos políticos significa representatividade, quando poucas conseguem de fato ocupar as cadeiras?