Exploração sexual infantil atinge ainda mais as meninas nordestinas

Pernambuco e Ceará são os estados com maiores índices de riscos da prática exploratória

Mylena Ferro
Revista Brado
4 min readMay 13, 2021

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Foto: Unsplash pictures

No Brasil, qualquer tipo de prática sexual com crianças menores de 14 anos é considerada crime e violação gravíssima dos direitos da criança e do adolescente. Segundo dados divulgados pela Cartilha da Violência Sexual Contra Crianças e Adolescentes, cerca de 30% da população brasileira foi abusada sexualmente antes dos 18 anos, ou seja, mais de 60 milhões de brasileiros já foram ou estão sendo violentados durante a infância e adolescência.

Os números são altos, mas é preciso ainda lembrar de um agravante: falar de violência sexual é falar de um crime absolutamente subnotificado. Estima-se que apenas um em cada 20 casos de abuso chega ao conhecimento dos órgãos de proteção à infância.

Quando tratamos de exploração sexual comercial de crianças e adolescentes (ESCCA), o estupro pago — porque a prostituição, sobretudo infantil, não é outra coisa senão isso — é ainda mais normalizado e menos discutido. Consideram que as crianças que foram postas nessa situação estão ali porque escolheram e que podem sair quando quiserem. Sabemos, no entanto, que não é bem assim.

As crianças são ameaçadas por seus aliciadores, não se sabem violadas — embora se sintam assim — e a sociedade ainda não compreendeu que não há consentimento quando se trata de crianças, menos ainda que as garotas que fazem parte desse sistema cruel de estupro pago não se percebem com direito à escolha, que não estão ali porque querem.

Não esqueçamos que quando do outro lado só há miséria e o desespero da falta de alimento e moradia ou da violência doméstica, não lhes é dada outra opção. É preciso lembrar que, falando de exploração sexual comercial de crianças e adolescentes, estamos falando, antes de tudo, de desigualdade social, falha nas políticas públicas e vulnerabilidade socioeconômica.

“A exploração sexual pode ser um termo empregado para nomear práticas sexuais pelas quais o indivíduo obtém lucros. Ocorre principalmente como consequência da pobreza e violência doméstica, que faz jovens, crianças e adolescentes fugirem de seus lares e se refugiarem em locais que os exploram em troca de moradia. Acontecem em redes de prostituição, pornografia, tráfico e turismo sexual”.

(Larissa Cabral, socióloga)

Um relatório da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) da Câmara dos Deputados identificou que a maior parte dos casos de exploração sexual comercial infantil se concentravam na Região Nordeste: o número alcançou 31,8%, com foco especial no interior dos estados.

Segundo levantamento feito pela Polícia Rodoviária Federal, em parceria com a Childhood Brasil, o Nordeste representa a região com mais fatores de risco às crianças e adolescentes: foram 173 pontos críticos identificados, seguido pelo norte com 87. Entre as capitais brasileiras, Fortaleza é a que possui maior número de menores envolvidos em esquemas de prostituição. Já o estado com maior número de casos de exploração é Pernambuco, com pouco mais de 70 municípios mapeados com prática de ESCCA.

As principais formas dessa exploração na Região Nordeste são o turismo sexual, a pornografia infantil e o aliciamento e prostituição de crianças em situação de vulnerabilidade. Todos esses atuam em conjunto com o tráfico humano: garotas são levadas de sua terra natal — especialmente cidades de interior — para as capitais com movimento turístico maior, onde são jogadas no mundo da prostituição e se tornam, na maioria das vezes, escravizadas sexuais.

Há também o fluxo inverso: garotas da periferia das capitais são levadas para casas de prostituição do interior, sobretudo à beira das estradas. Nas rodovias federais, existem cerca de 2 mil pontos de exploração sexual de meninos e meninas. Aponta-se que os maiores consumidores do estupro pago infantil no interior são caminhoneiros e taxistas. Já nas capitais que fazem parte do circuito do turismo sexual, o perfil dos abusadores muda: são, em sua maioria, empresários que viajam a negócios e turistas de classe média alta.

Apesar das poucas políticas públicas de combate à exploração sexual infantil, algumas organizações vêm fazendo trabalhos efetivos nesta luta. A ECPAT, uma rede global de organizações da sociedade civil que trabalha para acabar com a exploração sexual de crianças, está com ações direcionadas diretamente ao Brasil e, sobretudo, ao Nordeste. Eles produziram um código de conduta que foi assinado por diversas empresas de turismo do mundo se comprometendo a não promover práticas sexuais de turismo e lutar de forma incisiva contra a exploração. Há também ONGs locais que promovem conscientização sobre o assunto, além de estabelecerem parcerias com a Polícia Federal para mapeamentos mais eficazes do problema.

Caso você veja ou suspeite de uma situação de exploração sexual infantil, a orientação é ligar para o número 191, caso esteja à beira de uma rodovia, ou no disque direitos humanos, o Disque 100, caso esteja em área urbana. A lei brasileira diz que submeter crianças ou adolescentes à exploração sexual é passível de pena de 4 a 10 anos de prisão. Qualquer um pode fazer uma denuncia anônima, com base em suspeitas.

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Este texto é parte da campanha de combate ao abuso e exploração de crianças e adolescentes desenvolvida pela Revista Brado durante o Maio Laranja.

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