Um corpo coberto também é um corpo liberto
Responsabilizar a religião pela opressão das mulheres islâmicas só reforça a narrativa ocidental de dominação e não enfrenta o real problema que consiste no patriarcado.
Dentro do movimento feminista é bastante recorrente a visão das mulheres muçulmanas como submissas, passivas e oprimidas pela religião, no entanto, o Islamismo e o Corão não são contrários às mulheres, mas têm sido interpretados de forma patriarcal e misógina.
E é para reforçar essa ideia, libertando mulheres das amarras do patriarcado, sem necessariamente se opor à sua liberdade de expressão e religiosa, que o feminismo islâmico se sustenta.
Contra a uniformização cultural, imposta pela sociedade capitalista cristã, e o colonialismo, essas mulheres se unem para combater estereótipos e a estigmatização da mulher islâmica, que sofre dupla opressão: pelo patriarcado e pelo sistema colonial, buscando, assim, interpretações do Corão que desafiam as leituras patriarcais.
O orientalismo consiste na construção de como o oriente é visto pelo ocidente, reforçando a narrativa ocidental de dominação. A forma como nós, ocidentais, enxergamos o oriente, e principalmente a mulher oriental, é condicionada pelas narrativas construídas e reproduzidas pelas estruturas sociais que estamos inseridos. Vê-los como bárbaros, estereotipados, exóticos, homogêneos, só reforça a narrativa colonialista de dominação ocidental.
Para a autora Lila Abu-Lughod, a desigualdade entre homens e mulheres, nesse contexto, não é fruto da religião, e sim o autoritarismo e a pobreza. O feminismo ocidental rejeita o Islã por o considerar contra as mulheres, enxergam a mulher muçulmana como inferior, entendem sua cultura como bárbara e atrasada, impondo um ideal de libertação baseado no padrão ocidental, incentivando uma uniformização cultural.
Essas mulheres já sofrem diariamente com as opressões, principalmente se inseridas num contexto capitalista ocidental, são constantemente erotizadas e têm suas tradições questionadas e desafiadas. O feminismo precisa ser um local acolhedor para todas as mulheres. É urgente uma análise interseccional das opressões sistêmicas que acometem nossa sociedade e principalmente os grupos mais vulneráveis.
A resposta ocidental ao uso do hijab deixa muito claro o etnocentrismo existente no feminismo ocidental. Há uma tentativa de proibição do seu uso, sustentado pela narrativa de superar sua cultura considerada “primitiva” para atingir sua emancipação. Esse debate inicia-se no século XIX, durante a colonização britânica no Egito, em que acreditavam que o uso do hijab era um símbolo de atraso cultural.
A proibição do hijab representa a vitória do colonialismo ocidental sobre o domínio do Oriente. Por outro lado, as feministas islâmicas consideram o uso do hijab como símbolo de resistência anticolonial.