Por que o mercado tem reagido de maneira tão firme às falas de Lula?

No mercado financeiro, o investidor é recompensado quando se antecipa aos fatos, devendo adaptar os seus investimentos à futura realidade material

Lorenzo Kill
Revista Brado
4 min readNov 12, 2022

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Imagem: Lorenzo Cafaro/Pixabay

A bolsa de valores é o local apropriado para o investidor comprar participações em empresas. Digamos que você adquiriu um conjunto de ações, montando uma carteira diversificada, se ao longo do tempo esses ativos apresentarem uma tendência consistente de elevação na lucratividade, provavelmente ocorrerá uma valorização no preço dessas ações. Caso a empresa apresente prejuízos sucessivos, o efeito será oposto. Dessa forma, podemos concluir que no longo prazo o preço da ação acompanhará o lucro da empresa que ela representa.

O fenômeno ocorre de forma semelhante no curto prazo, mas com distorções exageradas e variações súbitas na precificação. Quando digo que esse efeito será mais notório no longo prazo é porque no curto as perspectivas de lucro futuro ditam o preço dos papéis. Essa análise do futuro com base no presente conta com muita instabilidade e emoção, dificultando que ela de fato seja assertiva quanto à futura realidade material.

Para tornar essa ideia palpável, pensemos no cenário eleitoral. O mercado financeiro estava observando que de um lado tínhamos o candidato à reeleição, com o objetivo de privatizar estatais e executar reformas que reduzam o risco fiscal do país. Enquanto isso, o presidente eleito defendeu em sua campanha um aumento da carga tributária sobre os mais ricos, comprometido com o rompimento do teto de gastos, desinteressado pelas privatizações e reformas previdenciárias.

Possivelmente, a política econômica do Lula será a que mais divergirá ideologicamente, podendo conflitar com os interesses de investidores do mundo das finanças. Portanto, é provável que a maior parte dos agentes do mercado acreditem que o candidato eleito seja o com menor probabilidade de fazer com que as empresas aumentem seus lucros de forma recorrente no longo prazo. Isso significa que entre os dois o Lula é o pior dos candidato à Presidência? Se a única métrica para essa análise for o aumento na lucratividade das empresas listadas em bolsa, provavelmente.

Diante desse cenário, o investidor especulou como a política econômica do governo que fosse vitorioso afetaria o rendimento das empresas. Por exemplo, diante das políticas propostas por Lula, empresas estatais poderão ter seus lucros comprimidos, enquanto empresas do setor educacional poderá apresentar um lucro maior, influenciados por subsídios estudantis. Mas quando falo da reação do mercado financeiro, não trato de empresas e setores específicos, mas sim de uma reação média, que ocorre em toda a bolsa de valores, ou seja, da variação do índice.

O índice Bovespa, por exemplo, reflete o desempenho das principais ações listadas no mercado brasileiro. Quando ele está em alta, significa que os agentes do mercado estão mais confiantes quanto à economia e esperam que no futuro ocorra um aumento médio no lucro das empresas.

Nessa especulação que envolve prever movimentos econômicos futuros com base em informações disponíveis no curto prazo, o mercado financeiro têm reagido de forma constante e agressiva às aparições e falas do presidente Lula. Em discurso realizado nesta quinta-feira, 10, o presidente eleito provocou reação negativa do mercado financeiro, com declarações que ameaçam a responsabilidade fiscal, defendendo o aumento do gasto público e subsequente rompimento do teto de gastos. No dia, em movimento contrário à forte alta nas bolsas de valores ao redor do mundo, o Índice Bovespa apresentou queda de quase 4%, com queda de mesma magnitude no valor do real frente ao dólar.

A reação negativa dos agentes do mercado financeiro à fala do presidente demonstra que a precificação no preço das ações ocorre a todo momento e com significativa antecipação, sendo assim, o mercado não aguardará que de fato a promessa seja promulgada e que gere impactos reais à economia do dia-dia, para que altere a perspectiva de lucro futuro das empresas.

Os agentes que investem no Brasil estão em momento de inflexão. Apesar do ânimo com uma dívida pública controlada, somado à queda no desemprego e inflação, existe o temor de que a política pública adotada pelo Lula se assemelhe com a governança da Dilma, se afastando da adotada por ele mesmo em seu primeiro mandato.

Caso o presidente eleito vislumbre a governabilidade, a estabilidade do dólar, do fluxo de investimentos e da inflação, precisará manter um diálogo minimamente civilizado com o mercado financeiro. Em suma, no curto prazo é mais importante que o Lula pareça ser amigo do mercado, do que de fato seja.

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Lorenzo Kill
Revista Brado

Estudante de direito da Universidade Federal do Espírito Santo e de Ciências Econômicas na Universidade Vila Velha - https://www.youtube.com/@LorenzoKill